Journal Information
Vol. 97. Issue 1.
Pages 105-107 (1 January 2022)
Visits
7384
Vol. 97. Issue 1.
Pages 105-107 (1 January 2022)
Carta ‐ Investigação
Open Access
Dermatite de contato ocupacional: análise dos casos observados em serviço não especializado em dermatoses ocupacionais entre 2004 e 2017
Visits
7384
Rosana Lazzarinia,
Corresponding author
rosana.fototerapia@gmail.com

Autor para correspondência.
, Mariana de Figueiredo Silva Hafnera, Nathalie Mie Suzukiaa,b, Isabela Marangon Pasottib, Maria Regina de Paula Leite Kraftb
a Clínica de Dermatologia, Hospital Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
b Escola de Medicina, Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
This item has received

Under a Creative Commons license
Article information
Full Text
Bibliography
Download PDF
Statistics
Tables (2)
Tabela 1. Principais atividades profissionais entre os pacientes portadores de DCO
Tabela 2. Principais alérgenos entre os portadores de DCO comparados aos portadores de DCNO
Show moreShow less
Full Text
Prezado Editor,

Dermatoses ocupacionais (DOs) são alterações da pele, mucosas e anexos causadas, mantidas ou agravadas por agentes presentes no trabalho. As DOs de maior repercussão são as dermatites de contato ocupacionais (DCOs), com impacto no sistema de saúde, na remuneração e na produtividade dos trabalhadores. São as principais doenças ocupacionais no Brasil, embora subdiagnosticadas.1

A dermatite de contato irritativa (DCI) é a forma mais comum, restrita a áreas de contato com irritantes e relacionada à frequência e duração dessa exposição. A dermatite alérgica de contato (DAC), com menor incidência, apresenta lesões nas áreas de contato, que podem se disseminar.1

O diagnóstico envolve história ocupacional, sincronia entre o início do quadro e o período de exposição, correlação entre localização das lesões e contato, melhoria com o afastamento e piora com retorno ao trabalho e teste de contato.1–3

Neste estudo, foram analisados: a frequência de DCO em pacientes submetidos aos testes de contato em ambulatório não especializado em DOs, entre 2004 e 2017; a distribuição por idade, gênero, atividade profissional e localização da dermatose; os diagnósticos; e os sensibilizantes mais comuns. Os dados foram comparados com os dos não portadores de DCO (DCNO) e o estudo foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisas, 08077219.1.0000.5479.

Foram coletados, retrospectivamente, os dados de 1.405 pacientes testados com a bateria padrão brasileira (FDA‐Allergenic/Brasil), e fixados com contensores adequados.

Os dados foram analisados pelo programa SPSS versão 13.0, e os resultados dos dois grupos foram comparados utilizando‐se o Qui Quadrado (p < 0,005).

Entre os 1.405 testados, 349 (25,3%) foram DCO e 1.031 (74,4%), DCNO. A maior frequência de DCO quando comparada com publicação anterior (10,9%) pode refletir o aumento do número de substâncias testadas e o envolvimento da Medicina Ocupacional na conclusão diagnóstica. Entretanto, o número está abaixo da frequência nacional (34,2%) dos casos de DO, provavelmente por se tratar de serviço não especializado nesse tipo de dermatoses.4,5

Entre as DCOs, 152 (43,6%) eram DAC, 55 (15,8%) DCI, 8 (2,3%) dermatite atópica (DA) e 215 (61,6%) outras dermatoses. Entre as DCNO, 455 (44,1%) eram DAC, 70 (6,8%) DCI, 54 (5,2%) DA e 452 (43,8%) outras dermatoses. Dentre os diagnósticos, a DAC foi o mais comum em ambos os grupos. No entanto, a DCI é o subtipo mais comum em todo o mundo, especialmente em casos ocupacionais, com frequência estatisticamente maior neste grupo (p < 0,001). A proporção desses diagnósticos varia de acordo com a região, por diferenças em tipos de indústria, normas de regulamentação, sistemas de notificação e disponibilidade de centros capacitados para testes de contato. Já a DA pode ser considerada DO, uma vez que muitos trabalhadores pioram após contato com os alérgenos e irritantes do ambiente de trabalho.

Entre as DCOs, a média das idades foi de 42,1 anos, enquanto nas DCNOs foi de 47,5 anos (p < 0,005), gerando perdas aos sistemas produtivos e seguridade social.1

Entre as DCOs havia 182 (52,1%) mulheres e 167 (47,9%) homens, enquanto na DCNO eram 797 (77,3%) mulheres e 234 (22,7%) homens. A frequência de mulheres foi maior entre as DCNOs (p < 0,005), pois provavelmente representam a parcela da população que mais procura atendimento médico, mas significantemente menor no grupo ocupacional, talvez pelo fato de haver mais trabalhadores homens nas atividades com exposição a sensibilizantes e irritantes. Além disso, as mulheres tendem a ser mais adeptas ao uso de equipamentos de proteção individual e cuidados preventivos.6

As profissões mais prevalentes na DCO estão na tabela 1, e envolvem os profissionais com atividades úmidas (contato com água > 2 horas diárias, ou lavagens das mãos > 20 vezes no dia) ou exposição a conhecidos sensibilizantes e irritantes.7

Tabela 1.

Principais atividades profissionais entre os pacientes portadores de DCO

Atividade profissional  Número 
Profissionais do lar/limpeza  95  27,3 
Construção civil/pedreiro  72  20,6 
Trabalhadores da saúde  26  7,4 
Pintor  12  3,4 
Cabeleireiros  11  3,2 
Outros  133  38,1 
Total  349  100,0 

O tempo de evolução da doença na DCO foi de 29,2 meses, enquanto na DCNO foi de 39,5 meses (p < 0,005). A dificuldade em manter as atividades laborais talvez tenha favorecido a busca por auxílio de maneira mais precoce nos casos de DCO.

Quanto à localização da dermatose, houve diferença estatística em relação a DCO para mãos (regiões palmar e dorso) e antebraços (p < 0,001), enquanto em portadores de DCNO a face foi a mais acometida (582/66,7%). Essa diferença é esperada, já que as DCOs acometem principalmente as mãos, que manipulam diretamente produtos irritantes ou sensibilizantes.

Os principais sensibilizantes relevantes observados nos dois grupos estão no tabela 2; o níquel é o mais importante, presente em atividades ocupacionais ou não. As mãos são acometidas em razão do contato com ferramentas de trabalho, como agulhas de costura, pinças, alicates de cutículas, chaves e tesouras.

Tabela 2.

Principais alérgenos entre os portadores de DCO comparados aos portadores de DCNO

Alérgenos  152 com DCO455 com DCNO 
   
Sulfato de níquel  98  28,1  360  35  p = 0,018 
Bicromato de potássio  89  25,6  87  8,4  p < 0,001 
Carba mix  54  15,5  51  5,0  p < 0,001 
Tiuram mix  49  14,1  41  4,0  p < 0,001 
Resina epóxi  17  4,9  13  1,3  p < 0,001 
Quaternium 15a  17  4,9  25  2,4  p = 0,021 
MBT mixb  14  20  1,9  p = 0,031 

a Hexamethylenetetramine chloroallyl chloridecloreto.

b Mercaptobenzotiazol.

O bicromato de potássio está relacionado aos pedreiros, por sua presença no cimento (como contaminante, resultante do processo de fabricação), e é um importante alérgeno ocupacional em estudos semelhantes.8

Os grupos tiuram, carba e MBT são agentes vulcanizadores da borracha, comuns nas luvas, utilizadas em diversos setores produtivos.

A resina epóxi é um material utilizado em diversos produtos como tintas, acabamento para pisos, fibras de vidro, adesivos para metais, madeiras e concreto. Desse modo, as lesões surgem em várias localizações, e medidas de proteção são difíceis.9

Quaternium 15 (conservante liberador de formaldeído), presente em produtos infantis, cosméticos, shampoos de uso veterinário, materiais para polimento e ceras, é um alérgeno onipresente.10

Alguns alérgenos apresentaram altas frequências nos dois grupos (sem diferença estatística), entre eles o Kathon CG: DCO (24/6,9%) e DCNO (84/8,2%), mistura de conservantes de produtos aquosos como cosméticos, artigos de limpeza (detergentes, sabões, óleos lubrificantes) e tintas, tendo os casos ocupacionais ocorrido em trabalhadores de limpeza, cabeleireiros e pintores; e parafenilenodiamina, corante das tinturas de cabelo: DCO (27/7,8%) e DCNO (110/10,7%), cujos casos ocupacionais ocorreram em cabeleireiros, acometendo as mãos pela não utilização adequada de EPIs.

No período estudado, a DCO representou 25,3% dos casos submetidos aos testes de contato; o grupo de jovens do sexo masculino é o mais afetado, com impacto para a saúde do trabalhador e a economia do país. O estudo das DCOs em nosso meio é fundamental para o planejamento de ações de prevenção e capacitação diagnóstica dos centros dermatológicos.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Rosana Lazzarini: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Mariana de Figueiredo Silva Hafner: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Nathalie Mie Suzuki: Participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Isabela Marangon Pasotti: Elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; aprovação da versão final do manuscrito.

Maria Regina de Paula Leite Kraft: Elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; aprovação da versão final do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
O. Alchorne Ade, M.M. Alchorne, M.M. Silva.
Occupational dermatosis.
An Bras Dermatol., 85 (2010), pp. 137-147
[2]
I. Duarte, R. Lazzarini, M. Hafner, N.A. Monteiro.
Dermatite de contato.
Tratado de Dermatologia., 3 ed.,
[3]
A. Ingber, S. Merims.
The validity of the Mathias criteria for establishing occupational causation and aggravation of contact dermatitis.
Contact Dermatitis., 51 (2004), pp. 9-12
[5]
M.L.Z. Lise, F.R. Feijó, M.L.Z. Lise, C.R.Z. Lise, L.C.E. Campos.
Occupational dermatoses reported in Brazil from 2007 to 2014.
An Bras Dermatol., 93 (2018), pp. 27-32
[6]
F.M.D. Miranda, K.S.M. Purim, L.M.M. Sarquis, A.N.C. Shwetz, L.S. Delatorre, R.M. Saalfeld.
Dermatoses ocupacionais registradas em sistema de notificação na região Sul do Brasil (2007 a 2016).
Rev Bras Med Trab., 16 (2018), pp. 442-450
[7]
L. Holguín-Gómez, J. Sastre Domínguez.
Occupational Contact Dermatitis in Spain.
J Investig Allergol Clin Immunol., 27 (2017), pp. 134-136
[8]
C.S. Brutti, R.R. Bonamigo, T. Cappelletti, G.M. Martins-Costa, A.P. Menegat.
Dermatite de contato alérgica ocupacional e não‐ocupacional e qualidade de vida: um estudo prospectivo.
An Bras Dermatol., 88 (2013), pp. 670-671
[9]
C. Higgins, J. Cahill, R. Jolanki, R. Nixon. Epoxy resins. In: SM John et al.;(eds) Kanerva's Occupational Dermatology.
[10]
de Groot AC, Flyvholm M‐A. Formaldehyde and formaldehyde‐releasers In: SM John et al. Kanerva's Occupational Dermatology.

Como citar este artigo: Lazzarini R, Hafner MFS, Suzuki NM, Pasotti IM, Kraft MRPL. Occupational contact dermatitis: analysis of cases observed in a service not specialized in occupational dermatosis between 2004 and 2017. An Bras Dermatol. 2022;97:105–7.

Trabalho realizado na Clínica de Dermatologia da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

Copyright © 2021. Sociedade Brasileira de Dermatologia
Download PDF
Idiomas
Anais Brasileiros de Dermatologia
Article options
Tools
en pt
Cookies policy Política de cookies
To improve our services and products, we use "cookies" (own or third parties authorized) to show advertising related to client preferences through the analyses of navigation customer behavior. Continuing navigation will be considered as acceptance of this use. You can change the settings or obtain more information by clicking here. Utilizamos cookies próprios e de terceiros para melhorar nossos serviços e mostrar publicidade relacionada às suas preferências, analisando seus hábitos de navegação. Se continuar a navegar, consideramos que aceita o seu uso. Você pode alterar a configuração ou obter mais informações aqui.