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Vol. 95. Issue 1.
Pages 91-94 (1 January 2020)
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Vol. 95. Issue 1.
Pages 91-94 (1 January 2020)
Dermatologia Tropical/Infectoparasitária
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Hanseníase na população idosa em estado endêmico do nordeste brasileiro (2001–2017): cenário epidemiológico
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Carlos Dornels Freire de Souzaa,b,
Corresponding author
carlos.freire@arapiraca.ufal.br

Autor para correspondência.
, Tânia Rita Moreno de Oliveira Fernandesc,d, Thais Silva Matose,f, Clódis Maria Tavaresg,h
a Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
b Curso de Medicina da Universidade Federal de Alagoas, Arapiraca, AL, Brasil
c Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
d Curso de Medicina da Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, PE, Brasil
e Programa de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, PE, Brasil
f Centro de Referência em Hanseníase Dr Altino Lemos Santiago, Juazeiro, BA, Brasil
g Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
h Escola de Enfermagem e Farmácia, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil
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Tabela 1. Caracterização sociodemográfica e clínica dos casos de hanseníase diagnosticados na população idosa – Bahia, Brasil, 2001–2017
Resumo

Objetivou‐se analisar a tendência e as características da hanseníase em idosos na Bahia, de 2001 a 2017. Estudo ecológico. A tendência foi analisada com o modelo joinpoint regression. Variáveis epidemiológicas também foram incluídas no estudo. A taxa de detecção média foi de 38,73/100.000, com prevalência nos homens (45,19/100.000). Tendência de redução ocorreu em ambos os gêneros a partir de 2004, foi maior nas mulheres (APC = ‐3,4%). Os homens apresentaram maiores proporções das formas multibacilares e de incapacidades físicas. O cenário epidemiológico sinaliza a necessidade de implantação de ações que favoreçam o diagnóstico precoce e o tratamento oportuno da doença na população idosa.

Palavras‐chave:
Envelhecimento
Hanseníase
Mycobacterium leprae
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O Brasil contribui com 92,3% de todos os casos novos de hanseníase registrados nas Américas. Apenas três países (Brasil, Índia e Indonésia) somaram 80,2% de todos os casos do mundo em 2017.1 Nesse mesmo ano, o Brasil registrou 26.875 novos casos da doença, dos quais 2.225 (8,28%) em residentes na Bahia.2

O envelhecimento caracteriza‐se por importantes transformações físicas, funcionais, biológicas e psicossociais que ampliam o risco de desenvolvimento de determinadas doenças.3 Desse modo, o processo de envelhecimento da população brasileira, produto da transição demográfica, justifica a necessidade de entender como a hanseníase tem afetado essa faixa etária. Além disso, as análises estratificadas segundo gênero, conforme recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS), têm especial relevância, uma vez que permitem captar nuances do processo de adoecimento em cada subgrupo populacional.1

Nesse sentido, objetivou‐se analisar a tendência e as características epidemiológicas da hanseníase na população idosa da Bahia de 2001 a 2017.

Foi conduzido um estudo ecológico. Os dados referentes aos novos casos foram obtidos do Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan) e os dados populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com acesso em março de 2018.

A primeira etapa consistiu na análise da tendência da taxa de detecção de novos casos, estratificada segundo gênero. Foi usado o modelo de regressão segmentada (joinpoint regression).4 A tendência foi classificada em crescente, decrescente ou estacionária. Além disso, calculou‐se o percentual de variação anual (annual percent change ‐ APC) e a média de variação do período (average annual percent change ‐ AAPC), com intervalo de confiança de 95% (95% IC). Por usar dados secundários de domínio público, dispensou‐se a autorização do Comitê de Ética em Pesquisa.

A segunda etapa caracterizou‐se pela análise epidemiológica das seguintes variáveis: gênero, faixa etária, etnia/cor, escolaridade, forma clínica, classificação operacional, modo de detecção e grau de incapacidade física no momento do diagnóstico.

Foram diagnosticados 8.843 novos casos de hanseníase na população baiana com 60 anos ou mais. A taxa de detecção média foi de 38,73/100.000, com prevalência nos homens (45,19/100.000) em relação às mulheres (33,54/100.000). Considerando que o número de casos de hanseníase no Brasil tem sido questionado por pesquisadores,5 o cenário epidemiológico real da hanseníase em idosos pode ser ainda mais preocupante.

O modelo joinpoint mostrou dois comportamentos temporais distintos, de crescimento (2001–2004) e de redução (2004–2017), com maior destaque para as mulheres, cuja redução foi maior do que aquela observada na população masculina (APC = ‐3,4% e ‐2,2%, respectivamente), o que corroborou outros estudos.3,6,7 Ao considerar a tendência do período total (2001‐2017), o comportamento observado foi estacionário (fig. 1).

Figura 1.

Tendência da taxa de detecção de casos novos de hanseníase na população idosa, segundo gênero. Bahia, Brasil, 2001–2017. AAPC, average annual percent change (média da variação percentual anual); APC, annual percent change (percentual de variação anual); IC, intervalo de confiança.

(0.45MB).

No que diz respeito às características epidemiológicas, verificou‐se discreto predomínio de casos na população masculina (52,13%; n = 4.610), faixa entre 60 e 69 anos (57,86%; n = 5.117), etnia parda (50,42%; n = 4.459) e baixa escolaridade, com 27,77% (n = 2.456) analfabetos. Dos novos casos, 52,26% (4.621) foram detectados por meio de encaminhamento (tabela 1). Resultados semelhantes foram evidenciados em outras investigações.3,8,9

Tabela 1.

Caracterização sociodemográfica e clínica dos casos de hanseníase diagnosticados na população idosa – Bahia, Brasil, 2001–2017

Variável  Homensn (%)4.610 (52,13%)  Mulheresn (%)4.233 (47,87%)  Totaln (%)8.843 (100%) 
Faixa etária
60–69  2.691 (58,37%)  2.426 (57,31%)  5.117 (57,86%) 
70–79  1.423 (30,87%)  1.263 (29,84%)  2.686 (30,38%) 
80 ou +  496 (10,76%)  544 (12,85%)  1.040 (11,76%) 
Etnia
Branca  965 (20,93%)  897 (21,19%)  1.862 (21,06%) 
Preta  754 (16,36%)  646 (15,26%)  1.400 (15,83%) 
Amarela  25 (0,54%)  29 (0,68%)  54 (0,61%) 
Parda  2.356 (51,11%)  2.103 (49,68%)  4.459 (50,42%) 
Indígena  20 (0,43%)  13 (0,31%)  33 (0,37%) 
Ignorado/em branco  490 (10,63%)  545 (12,88%)  1.035 (11,70%) 
Escolaridade
Analfabeto  1.220 (26,46%)  1.236 (29,20%)  2.456 (27,77%) 
Ensino fundamental  2.073 (44,97%)  1.777 (41,98%)  3.850 (43,54%) 
Ensino médio  258 (5,60%)  236 (5,57%)  494 (5,59%) 
Ensino superior  81 (1,76%)  63 (1,49%)  144 (1,63%) 
Ignorado/em branco  978 (21,21%)  921 (21,76%)  1.899 (21,43%) 
Forma clínica
Indeterminada  404 (8,76%)  545 / 12,88%  949 (10,73%) 
Tuberculoide  676 (14,67%)  1.085 / 25,63%  1.761 (19,91%) 
Dimorfa  1.536 (33,32%)  1.290 / 30,47%  2.826 (31,96%) 
Virchowiana  1.047 (22,71%)  502 / 11,86%  1.549 (17,52%) 
Ignorado/em branco  947 (20,54%)  811/ 19,16%  1.758 (19,88%) 
Classificação operacional
Paucibacilar  1.087 (23,58%)  1.859 (43,92%)  2.946 (33,31%) 
Multibacilar  3.509 (76,12%)  2.352 (55,56%)  5.861(66,28%) 
Ignorado/em branco  14 (0,30%)  22 (0,52%)  36 (0,41%) 
Modo de detecção
Encaminhamento  2.431 (52,73%)  2.190 (51,74%)  4.621 (52,26%) 
Demanda espontânea  1.652 (35,84%)  1.466 (34,63%)  3.118 (35,26%) 
Exame de coletividade  127 (2,75%)  121 (2,86%)  248 (2,80%) 
Exame de contato  235 (5,10%)  321 (7,58%)  556 (6,29%) 
Outros  117 (2,54%)  102 (2,41%)  219 (2,48%) 
Ignorado/em branco  48 (1,04%)  33 (0,78%)  81 (0,92%) 
Grau de incapacidade física
Grau 0  2.299 (49,87%)  2.491 (58,85%)  4.790 (54,17%) 
Grau I  1.050 (22,78%)  881 (20,81%)  1.931 (21,84%) 
Grau II  507 (11,00%)  228 (5,39%)  735 (8,31%) 
Ignorado/em branco  754 (16,35%)  633 (14,95%)  1.387 (15,68%) 

Na análise estratificada segundo gênero, as proporções das formas multibacilares em homens foram superiores às observadas na população feminina (3.509/76,12% e 2.352/55,56%, respectivamente). A forma clínica Virchowiana correspondeu a 22,71% (n = 1.047) dos casos registrados na população masculina e apenas 11,86% (n = 502) dos casos registrados no gênero feminino (tabela 1). Esses achados sugerem que o diagnóstico é mais tardio nos homens,10 possivelmente em razão de dois fatores: o menor acesso aos serviços de saúde e o próprio processo de negligenciamento dos sinais/sintomas da doença.3,8,9

A presença de incapacidades físicas foi outro elemento que se destacou nas análises. Do total dos novos casos, 30,15% (n = 2.666) já apresentavam alguma incapacidade no momento do diagnóstico e em 8,31% (n = 735) essas incapacidades eram permanentes (Grau II). A proporção de homens com Grau II de incapacidade física permanente foi 2,04 vezes maior do que a de mulheres (11,00%; n = 507 e 5,39%; n = 228, respectivamente) (tabela 1). Esse cenário reforça o que já foi exposto, sinaliza para as graves consequências da doença na população idosa,3,9 sobretudo a masculina, e para a manutenção da cadeia de transmissão na comunidade.5

Embora os resultados apresentados já sejam capazes de justificar nossa preocupação com a hanseníase na terceira idade, as elevadas proporções de campos não preenchidos e/ou ignorados na avaliação do grau de incapacidade física no momento do diagnóstico, ao mesmo tempo em que refletem problemas operacionais na vigilância da doença no estado,3,6,9 indicam que o número de incapacitados pode ser ainda maior do que o apresentado.

A hanseníase em idosos deve ser vista com preocupação, uma vez que essa população é mais atingida pelas formas multibacilares da doença e têm maior risco de desenvolver incapacidades físicas. Além disso, o frágil acesso aos serviços de saúde, que coloca esses sujeitos na invisibilidade, é capaz de manter ativa a cadeia de transmissão da doença e torna‐la persistente na comunidade.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Carlos Dornels Freire de Souza: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Tânia Rita Moreno de Oliveira Fernandes: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Thais Silva Matos: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Clódis Maria Tavares: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Conflitos de interesse

Nenhum.

Referências
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Trabalho realizado na Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil.

Como citar este artigo: Souza CDF, Fernandes TRMO, Matos TS, Tavares CM. Leprosy in the elderly population in an endemic state in the Brazilian northeast (2001-2017): epidemiological scenario. An Bras Dermatol. 2020;95:91–4.

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