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Vol. 99. Núm. 1.
Páginas 19-26 (1 janeiro 2024)
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Caracterização clínica, fragilidade física e depressão em idosos com psoríase oriundos de centro de referência no Brasil: estudo transversal
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Giovana Viotto Cagnon Brandão, Elizandra Gomes Pereira, Gabriela Roncada Haddad, Luciane Donida Bartoli Miot, Silvio Alencar Marques, Hélio Amante Miot
Autor para correspondência
heliomiot@gmail.com

Autor para correspondência.
Departamento de Infectologia, Dermatologia, Diagnóstico por Imagem e Radioterapia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil
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Estatísticas
Tabelas (3)
Tabela 1. Principais dados demográficos dos participantes do estudo
Tabela 2. Principais características clínicas e terapêuticas ligadas à psoríase entre idosos e adultos
Tabela 3. Comparação das prevalências das principais comorbidades, escalas de depressão e índices de fragilidade entre os grupos
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Resumo
Fundamentos

Há poucos estudos dedicados à caracterização da população geriátrica com psoríase, que apresenta particularidades quanto às manifestações clínicas e limitações terapêuticas. Como a psoríase tem comportamento de doença crônica, aumentando sua prevalência com a idade, o incremento da expectativa de vida no Brasil demanda conhecimento sobre o comportamento da doença entre idosos.

Objetivos

Caracterizar idosos com psoríase, oriundos de serviço terciário, do ponto de vista clínico‐epidemiológico, presença de comorbidades, fragilidade física e o impacto afetivo. Comparar esses aspectos com adultos com psoríase e idosos sem a doença.

Métodos

Estudo transversal com 64 pacientes idosos com psoríase, 64 adultos com psoríase, e 64 idosos sem a doença. Foram avaliados aspectos clínico‐demográficos, escala de depressão de Beck e Skindex‐16. Nos pacientes idosos, foram avaliados indicadores de fragilidade física: handgrip, teste da cadeira, fadiga e perda ponderal >5%.

Resultados

Nos idosos, a idade média (DP) do início da psoríase foi 44 (10) anos; homens representaram 47% da amostra; a prevalência de artrite foi 22%, e de acometimento ungueal, 72%. Corticoide tópico foi mais empregado entre idosos com psoríase (100%) que nos adultos (86%), sem diferença entre os demais tratamentos sistêmicos. Diabetes mellitus ocorreu em 30% dos idosos. Hipertensão arterial (59%), dislipidemia (52%), depressão (34%) e fadiga (59%) foram mais prevalentes entre idosos com psoríase que entre idosos saudáveis.

Limitações do estudo

Estudo realizado em serviço público de referência para psoríase; todos estavam sob tratamento.

Conclusões

Idosos com psoríase, oriundos de serviço terciário, apresentaram maior comprometimento afetivo, comorbidades metabólicas e fragilidade física do que os controles idosos.

Palavras‐chave:
Doença crônica
Idoso
Imunossenescência
Psoríase
Síndrome metabólica
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Introdução

Psoríase é doença inflamatória crônica sistêmica, imunomediada por linfócitos‐T (resposta Th1 e Th17), que apresenta caráter multifatorial envolvendo suscetibilidade genética (poligênica), associada a fatores ambientais, como trauma, medicamentos, infecções e fatores emocionais.1,2

A pele é o principal órgão afetado pela psoríase, apesar de poder acometer articulações, mucosas e unhas e estar associada a outras condições sistêmicas, como doença de Crohn, uveíte, alterações psiquiátricas e esteatose hepática não alcoólica.3,4 Os pacientes com psoríase, de todas as faixas etárias, apresentam maior prevalência de síndrome metabólica, caracterizada por obesidade, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus tipo II, dislipidemia e aumento do risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares.5–7 Em virtude do impacto na qualidade de vida e da indução de inflamação sistêmica (via TNFα, IL‐6 e IL‐1), a psoríase é associada a distúrbios afetivos, e cerca de 30% dos pacientes apresentam alguma comorbidade psiquiátrica (p. ex., depressão e transtorno de ansiedade) que compromete a produtividade laboral e o relacionamento interpessoal e eleva o risco de suicídio.8–11 No Brasil, a prevalência de psoríase é estimada entre 1,10% e 1,51%; entretanto, em idosos, essa estimativa se eleva para 1,71% a 2,84%.12 O aumento da expectativa de vida da população alude ao crescimento na prevalência de doenças crônicas na população, e entre elas, a psoríase.

Considerações especiais devem ser feitas acerca da assistência à população geriátrica, que tende a apresentar múltiplas comorbidades e utilizar diversos medicamentos concomitantemente, maximizando efeitos adversos e interações medicamentosas. Com o avanço da idade, há modificações metabólicas e dos sistemas antioxidantes, o que altera processos farmacodinâmicos e farmacocinéticos. Além disso, a imunossenescência favorece quadro inflamatório crônico que compromete funcionalmente a imunidade.13

Há poucos estudos sistemáticos da psoríase no idoso, assim como de suas particularidades clínicas, terapêuticas e seu impacto na fragilidade física.14,15 No Brasil, de acordo com a Lei 10.471/033 que delibera sobre o Estatuto da Pessoa Idosa, são considerados idosos os indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos. Frequentemente, idosos são excluídos dos ensaios clínicos, por serem considerados grupo de risco para eventos adversos aos tratamentos.13,16–18 Também são escassos os dados quanto à eficácia e segurança de medicamentos sistêmicos e imunobiológicos nessa faixa etária.19

Este estudo objetivou caracterizar variáveis clínico‐demográficas, presença de comorbidades, fragilidade física e o impacto afetivo em idosos portadores de psoríase atendidos em serviço de dermatologia de referência, assim como comparar esses aspectos com adultos com psoríase e idosos sem a doença.

Casuística e métodos

Conduziu‐se estudo transversal (utilizando duas populações de controle) envolvendo 64 pacientes com psoríase maiores que 60 anos de idade, 64 pacientes com psoríase com menos de 50 anos de idade e 64 idosos sem psoríase. O estudo foi conduzido no ambulatório de dermatologia da Universidade Estadual Paulista, entre março de 2019 e março de 2021.

A amostragem aconteceu por conveniência, e foram incluídos casos e controles elegíveis, consecutivamente, durante os atendimentos médicos. Pacientes com psoríase (idosos e adultos) eram oriundos do ambulatório de psoríase do serviço. Os controles idosos eram portadores de outras doenças dermatológicas localizadas que frequentavam o ambulatório de Dermatologia ou eram acompanhantes dos pacientes. Não foram incluídos no estudo indivíduos com dificuldade de compreensão ou interpretação, pacientes sem lesões clínicas de psoríase ao exame e portadores de outras dermatoses extensas.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição (FMB‐Unesp n° 3.318.242), e todos os participantes assinaram o termo de consentimento esclarecido.

Idosos com psoríase (IPso), idosos sem psoríase (ISem) e adultos com psoríase (APso) foram caracterizados quanto aspectos demográficos, antropométricos, tratamento atual, tabagismo, consumo de álcool, escala de depressão de Beck e as principais comorbidades.20 Idosos (IPso e ISem) foram avaliados quanto à fragilidade física pelo teste da cadeira, força de preensão manual (handgrip), perda ponderal e fadiga.21

A escala de Beck para autoavaliação da depressão é composta por 21 itens que abrangem os componentes cognitivos, afetivos, comportamentais e somáticos da depressão. Cada item contém quatro afirmações que variam quanto à intensidade (0 a 3), cabendo ao questionado indicar qual das quatro afirmações mais bem descreve seus sintomas. O escore final é obtido mediante o somatório dos 21 itens que compõem a escala, resultando na seguinte normatização: a) nenhuma depressão ou depressão mínima: escores finais <11 pontos; b) depressão leve a moderada: escores finais entre 12 a 19 pontos; c) depressão moderada a grave: escores finais entre 20 a 35 pontos; e d) depressão grave: escores finais entre 36 a 63 pontos.22,23 A escala de Beck é um dos instrumentos mais utilizados para a avaliação do transtorno depressivo e suas variáveis, aplicada em pacientes psiquiátricos e não psiquiátricos, validada em outros países e confirmada quanto aos critérios de confiabilidade e validade.

O teste da cadeira fornece avaliação indireta do desempenho físico dos pacientes, que foram orientados a levantar‐se e sentar‐se de uma cadeira de altura normal (aproximadamente 48cm) cinco vezes consecutivas, sem apoio das mãos.24 A força de preensão manual, critério indireto de força muscular, foi mensurada por handgrip, por meio de um dinamômetro manual (hand dynamometer DRP‐120), na mão dominante de cada paciente, e foi considerada a maior medida (em kg) dentre três tentativas realizadas. Perda ponderal foi caracterizada pela redução de mais que 5% do seu peso nos últimos três anos. A avalição da fadiga, segundo o Consenso Brasileiro de Fragilidade em Idosos, foi realizada por meio do questionamento direto para o paciente se o mesmo se sentia “cheio de energia” naquele exato momento.25,26

Os pacientes com psoríase foram submetidos à avaliação clínica pelo escore PASI (Psoriasis Area Severity Index), escore BSA (Body Surface Area), escore PGA (Physician Global Assessment) para o couro cabeludo e corpo, avaliados por dermatologista titulado, além do questionário de qualidade de vida Skindex‐16, validado para o português do Brasil.27–29 A consistência interna das escalas de Beck e das dimensões do Skindex‐16 foram avaliadas pelo coeficiente McDonald's ω, e seu intervalo de confiança de 95% (95% IC). Variáveis quantitativas e ordinais foram descritas como percentuais, e comparadas pelo teste do Qui‐quadrado de tendência e análise dos resíduos da tabela de contingência (post hoc).30 Variáveis quantitativas foram descritas como média e desvio‐padrão ou mediana e quartis (p25–p75), se a normalidade não fosse verificada pelo teste de Shapiro‐Wilk.31 As correlações entre variáveis quantitativas foram avaliadas pelo coeficiente rho de Spearman.32 Os grupos foram comparados entre si por modelos de regressão (log‐linear) de Poisson, e a dimensão do efeito foi expressa pela razão de prevalência (RP) e seu 95% IC.33 Dados foram tabulados em MS Excel 2010 e analisados pelo software IBM SPSS 25. Considerou‐se significante p‐valor <0,05.34

A amostra foi dimensionada a partir de um pré‐teste com 64 participantes em cada grupo de idosos (n=128), com base na estimativa para a regressão (log‐linear) de Poisson para a comparação entre as variáveis de fragilidade física.35

Resultados

Os principais dados demográficos dos participantes do estudo estão dispostos na tabela 1. Destacam‐se o grupo ISem com maior renda familiar; já o grupo APso apresentou maior escolaridade.

Tabela 1.

Principais dados demográficos dos participantes do estudo

Variáveis  IPso(n=64)  APso(n=64)  ISem(n=64)  p‐valor 
Idade em anos, média (desvio‐padrão)  65 (5)  42 (9)  67 (5)  – 
Sexo, n (%)         
Feminino  34 (53%)  29 (45%)  34 (53%)  0,630 
Masculino  30 (47%)  35 (55%)  30 (47%)   
Fototipo, n (%)         
I–II  5 (8%)  4 (6%)  17 (27%)  0,176 
III–IV  56 (88%)  57 (89%)  47 (73%)   
V–VI  3 (5%)  3 (5%)  – (–)   
Escolaridade, n (%)         
Fundamental  49 (77%)a  27 (42%)  39 (67%)  0,001 
Médio  6 (14%)  25 (39%)a  11 (17%)   
Superior  6 (9%)  12 (19%)  14 (16%)   
Renda familiar, n (%)b         
<R$ 1.000,00  9 (14%)  7 (11%)  3 (5%)  0,004 
1–3.000,00  42 (66%)  32 (50%)  37 (58%)   
3–5.000,00  13 (20%)  22 (34%)  15 (23%)   
>5.000,00  – (–)  3 (5%)  9 (14%)a   
Tabagismo atual, n (%)  13 (20%)  11 (17%)  10 (16%)  0,840 
Consumo álcool, n (%)  10 (16%)  22 (34%)  15 (23%)  0,050 

IPso, idosos com psoríase (> 60 anos); APso, adultos com psoríase (< 50 anos); ISem, idosos sem psoríase.

a

p‐valor <0,05 (análise post hoc).

b

R$ 1,00=Us$ 0,19 (28/11/2022).

Quanto ao aspecto clínico e terapêutico da psoríase (tabela 2), os grupos IPso e APso apresentaram parâmetros clínicos comparáveis, porém, diferiram quanto à idade de início da doença e quanto ao uso de corticoterapia tópica. As classes de imunobiológicos utilizadas pelos IPso foram anti‐TNF alfa (etanercepte, infliximabe e adalimumabe) e anti IL‐17A (secuquinumabe).

Tabela 2.

Principais características clínicas e terapêuticas ligadas à psoríase entre idosos e adultos

Variáveis  IPso(n=64)  APso(n=64)  p‐valor 
Início da psoríase (idade)a  44 (13)  28 (11)  <0,001 
História familiar, n (%)  21 (33%)  26 (41%)  0,463 
PASIb  4 (2–9)  5 (2–11)  0,332 
PASI ≥ 10  13 (20%)  18 (28%)  0,410 
BSAb  6 (4–15)  9 (4–18)  0,402 
BSA ≥ 10  19 (30%)  26 (41%)  0,267 
PGA corpob  2 (2–3)  3 (2–3)  0,734 
PGA couro cabeludob  1 (0–2)  1 (0–2)  0,727 
Skindex‐16b       
Sintomas  17 (0–46)  25 (0–50)  0,429 
Emocional  23 (2–63)  27 (11–73)  0,219 
Funcional  0 (0–35)  7 (0–40)  0,056 
Palmoplantar, n (%)  16 (25%)  21 (33%)  0,436 
Ungueal, n (%)  46 (72%)  41 (64%)  0,449 
Onicólise  36 (56%)  28 (44%)   
Pittings  17 (27%)  23 (36%)   
Traquioníquia  7 (11%)  3 (5%)   
Artrite, n (%)  14 (22%)  10 (16%)  0,498 
Mãos/punhos  11 (17%)  7 (11%)   
Joelhos  4 (6%)  4 (6%)   
Tratamento, n (%)       
CTC tópico  64 (100%)  55 (86%)  0,003 
Calcipotriol  16 (25%)  18 (28%)  0,842 
Metotrexato  30 (47%)  37 (58%)  0,288 
Acitretina  24 (34%)  34 (53%)  0,110 
Fototerapia  11 (17%)  8 (13%)  0,620 
Imunobiológicos  11 (17%)  12 (19%)  0,999 
Ciclosporina  1 (2%)  0% (–)  0,999 

IPso, idosos com psoríase (> 60 anos); APso, adultos com psoríase (< 50 anos); ISem, idosos sem psoríase; CTC, corticoide; PASI, índice de gravidade e área da psoríase; BSA, área da superfície corporal; PGA, avaliação global do médico – avaliados no dia da inclusão no estudo.

a

Média (desvio‐padrão).

b

Mediana (P25–P75).

Entre os IPso, cinco pacientes (7,8%; 95% IC 1,6–15,0) apresentaram o início da doença após os 60 anos de idade. Quando ajustado pela idade atual e sexo, os pacientes IPso com início da doença na terceira idade não apresentaram gravidade clínica, fragilidade física, frequência de comorbidades ou comprometimento afetivo que diferissem dos IPso com início da doença antes dos 60 anos de idade (p <0,1).

O inventário Skindex‐16 apresentou adequada consistência interna (McDonald's ω) >0,82, para as três dimensões, não havendo diferença dos escores entre os grupos. A dimensão funcional foi a mais correlata com o escore de Beck (rho=0,471; p<0,001); porém, não se associou à presença de artrite (p=0,131).

A tabela 3 apresenta a comparação dos principais elementos clínico‐demográficos, aspectos afetivos e índices de fragilidade entre os grupos. Houve aumento na prevalência de comorbidades entre IPso e APso, como hipertensão, dislipidemia e diabetes. Já quando comparado IPso com ISem, além de mais comorbidades ligadas à síndrome metabólica, como hipertensão arterial sistêmica e dislipidemia, houve maior prevalência de fadiga e depressão.

Tabela 3.

Comparação das prevalências das principais comorbidades, escalas de depressão e índices de fragilidade entre os grupos

Variáveis  IPso(n=64)  APso(n=64)  ISem(n=64)  RP1 (IPso×APso)  p‐valor1  RP2 (IPso×ISem)  p‐valor2 
IMC em kg/m2, média (DP)  28,3 (4,5)  28,5 (5,6)  28,5 (6,3)  –  0,394  –  0,136 
IMC ≥ 30  22 (34%)  26 (41%)  25 (39%)  0,9 (0,7–1,1)  0,393  1,0 (0,8–1,1)  0,548 
Circunferência abdominal em cm, média (DP)  98,7 (14,4)  100,7 (11,9)  101,6 (14,2)  –  0,129    0,357 
Diabetes mellitus, n (%)  19 (30%)  9 (14%)  14 (22%)  2,0 (1,0–4,0)  0,038  1,1 (0,8–2,6)  0,087 
Hipertensão, n (%)  38 (59%)  13 (20%)  30 (47%)  2,9 (1,7–5,0)  <0,001  1,3 (1,0–1,7)  0,039 
Dislipidemia, n (%)  33 (52%)  26 (41%)  25 (39%)  1,3 (0,9–1,8)  0,231  1,4 (1,1–2,1)  0,045 
LDL  22 (34%)  9 (14%)  14 (22%)  1,4 (1,1–1,9)  0,020  1,1 (1,0–1,3)  0,103 
Triglicérides  8 (13%)  7 (11%)  4 (5%)  1,1 (0,9–1,3)  0,564  1,2 (1,0–1,5)  0,107 
Ambos  3 (5%)  10 (16%)  6 (9%)  0,7 (0,5–0,9)  0,006  0,9 (0,7–1,2)  0,552 
Evento cardiovascular, n (%)  7 (11%)  4 (6%)  7 (11%)  1,0 (1,0–1,1)  0,313  1,0 (0,9–1,1)  0,733 
Escala de Beck, mediana (P25–P75)  6,0 (3,0–11,5)  6,5 (2,0–12,0)  5,0 (2,0–8,0)  –  0,779  –  <0,001 
Beck ≥ 10  22 (34%)  20 (31%)  13 (20%)  1,0 (0,6–1,7)  0,890  1,7 (0,9–3,1)  0,068 
Índices de fragilidade física em idosos               
Handgrip em kg, mediana (P25–P75)  3,5 (0,0–10,0)  –  5,0 (0,0–10,0)  –  –  –  0,094 
Fadiga, n (%)a  38 (59%)  –  23 (36%)  –  –  1,7 (1,2–2,4)  0,003 
Teste da cadeira, n (%)b  60 (93%)  –  59 (92%)  –  –  1,0 (0,9–1,1)  0,895 
Perda ponderal >5% (%)  17 (27%)  –  12 (19%)  –  –  1,5 (0,8–2,8)  0,239 

IPso, idosos com psoríase (> 60 anos); APso, adultos com psoríase (<50 anos); ISem, idosos sem psoríase; DP, desvio‐padrão; RP, razão de prevalência.

1

Comparação entre IPso e APso (dados ajustados por sexo).

2

Comparação entre IPso e ISem (dados ajustados por sexo e idade).

a

Fadiga: definido pelos que respondiam negativamente à questão “Sente‐se cheio de energia”.

b

Teste da cadeira completo: consegue sentar‐se e levantar da cadeira cinco vezes consecutivas.

A escala de Beck apresentou alta consistência interna; o coeficiente McDonald's ω resultou 0,86 (95% IC 0,83–0,89). Os itens B1 (sentimento de tristeza) e B15 (capacidade de trabalhar) foram proeminentes (p<0,05) na diferença entre IPso e ISem.

Em pacientes com psoríase, os portadores de artrite apresentaram menor força média de preensão (5,1 vs. 10,0kg; p=0,030), porém artrite não foi determinante do desempenho no teste da cadeira ou de fadiga (p >0,760). Quanto aos escores de Beck, eles foram mais elevados para os idosos que referiam fadiga e perda ponderal (p<0,005).

Discussão

Nesta amostra brasileira de pacientes atendidos em centro de referência, idosos com psoríase apresentaram idade média de início da psoríase após a quarta década, não houve preferência por sexo e as características clínicas, além do impacto na qualidade de vida, não diferiram dos adultos com psoríase atendidos no mesmo ambulatório. Apesar disso, apresentaram maior prevalência de sintomas depressivos, elementos de fragilidade física e parâmetros de síndrome metabólica que idosos sem psoríase.

Cerca de 10% dos casos de psoríase atendidos na prática dermatológica são pacientes idosos; no entanto, essa prevalência vem crescendo e espera‐se que aumente com o envelhecimento da população.13,36 Além da longevidade, o acesso da população à informação sobre a doença e ao sistema de saúde para confirmação do diagnóstico são fatores que podem implicar no aumento da incidência de psoríase como um todo nas últimas décadas.

Entre os pacientes idosos com psoríase, podemos dividi‐los entre os que tiveram o início da doença durante a senescência (após 60 anos de idade), que corresponde a 3% a 13% dos casos, e os que a iniciaram mais precocemente (antes dos 60 anos). Espera‐se que a psoríase de início após os 60 anos tenha quadro clínico mais brando, com menores índices de BSA, acometimento ungueal e articular, em comparação aos pacientes com início mais precoce. No entanto, são raros os estudos dedicados a sua caracterização, já que a representação da população geriátrica nos ensaios clínicos ainda é escassa.37,38 Apenas 15% dessa população desenvolve psoríase moderada a grave e necessita de tratamentos sistêmicos. Em nossa amostra, não observamos diferença entre a distribuição de PASI, BSA, PGA corpo/couro cabeludo, acometimento palmoplantar ou ungueal e atrite entre os dois grupos de pacientes portadores de psoríase (IPso e APso).

Em amostra de 156 iranianos idosos com psoríase, foram avaliadas características demográficas, comorbidades, idade de início da doença, forma clínica predominante, gravidade e abordagens terapêuticas.36 A característica clínica mais comum da doença foi o tipo placa (73,1%), seguida pelo tipo pustulosa (10,9%), e o local mais frequentemente envolvido foram as extremidades (84,6%). Couro cabeludo, unhas e articulações foram envolvidos em 26,9%, 40,3% e 19,2% dos pacientes avaliados, respectivamente. A pontuação média do PASI encontrada foi de 5,0±5,5. Hipertensão (25%) e diabetes mellitus (16%) foram as doenças mais prevalentes. Em relação à abordagem terapêutica dos pacientes, a maioria foi tratada topicamente (81,7%), e dentre os tratamentos sistêmicos, o metotrexato e a acitretina foram os mais frequentes, responsáveis por 74,4% e 60,3% dos pacientes. Os homens apresentaram menor média de idade de início da doença (51,8 anos) em comparação com as mulheres (59,2 anos). Pacientes com envolvimento articular apresentaram menor média de idade (65,2±6,3 anos) quando comparados àqueles sem esse envolvimento (69,2±7,4 anos).39

Idade é fator de risco adicional para hipertensão, dislipidemia, depressão e diabetes tipo 2. Em nossa amostra de idosos com psoríase, esses parâmetros foram mais prevalentes que nos controles idosos. De fato, quando comparados a controles saudáveis, os portadores de psoríase apresentam aumento da prevalência de dislipidemia, hipertensão, doença arterial coronariana, diabetes tipo 2 e aumento do índice de massa corporal (IMC).35,40–42 Esses elementos podem corroborar para maior mortalidade cardiovascular entre portadores de psoríase.43,44

Em estudos controlados, a razão de chances para dislipidemia em pacientes com psoríase foi de 2,5 (95% IC 1,7–3,3), diabetes mellitus foi de 1,8 (95% IC 1,6–2,0) e hipertensão arterial sistêmica de 1,6 (95% IC 1,4–1,8) quando comparados com pacientes saudáveis.40,45–49 Vale ressaltar que esses elementos também podem decorrer de terapias sistêmicas para psoríase, como no caso dos retinoides, que podem elevar os níveis de triglicerídeos, assim como aumento de peso é verificado em usuários de imunobiológicos anti‐TNF, e hipertensão entre os usuários de ciclosporina.50,51 Em nosso estudo, foi relevante o aumento na prevalência de dislipidemia e hipertensão nos IPso, quando comparados a ISem, porém tal resultado não foi confirmado em relação a diabetes.

O tratamento da psoríase em pacientes idosos pode ser desafiador. Na maioria das vezes, essa população sofre de múltiplas comorbidades e utiliza vários medicamentos, além do progressivo comprometimento funcional do sistema imunológico, o que aumenta a suscetibilidade a infecções, bem como à autoreatividade e efeitos adversos às terapêuticas existentes. Além disso, questões logísticas, como a dependência de cuidadores para atividades do dia a dia, podem influenciar na escolha terapêutica. Desse modo, as terapêuticas sistêmicas e imunobiológicas podem ser postergadas e os tópicos são usados como primeira opção, principalmente os corticoides tópicos, não pela facilidade em serem administrados ao paciente, mas pelo risco de possíveis eventos adversos e interações medicamentosas que as outras terapêuticas teriam.13,20 Nossos resultados corroboram essa indicação, uma vez que houve maior frequência de tratamento com corticoides tópicos no grupo IPso (100%) que no grupo APso (86%).

Ainda, os corticosteroides tópicos devem ser usados com cautela nessa população, levando em consideração as alterações que ocorrem na pele envelhecida, bem como o maior risco de efeitos colaterais cutâneos, como púrpura, atrofia, hematomas, infecções de pele, e taquifilaxia.37,47 Importante lembrar que, nos idosos, as expectativas terapêuticas devem ser as mesmas quando comparadas com os pacientes mais jovens. Tratamentos sistêmicos convencionais, como metotrexato e acitretina, são muitas vezes contraindicados na população geriátrica em decorrência do perfil de efeitos colaterais e maiores índices de interações medicamentosas, levando em consideração as múltiplas comorbidades e o maior número de medicamentos utilizados por esses pacientes. A fototerapia pode não ser conveniente em virtude de a pele do idoso já sofrer as modificações inerentes ao envelhecimento e, desse modo, ficar mais sucetível aos possíveis efeitos colaterais, como câncer de pele ou hipersensibilidade. Em relação aos imunobiológicos, os dados preliminares quanto à segurança e efetividade são otimistas para o uso nesse subgrupo de pacientes.

O impacto de dermatoses crônicas como a psoríase, na saúde psicológica e mental, é uma consideração importante, em virtude das implicações da doença no bem‐estar do indivíduo e no tratamento. Tanto o estresse psicológico é comumente considerado um gatilho e causa de piora do quadro da psoríase quanto o contingenciamento crônico que a dermatose inflige leva ao desenvolvimento de sintomas afetivos.52 Pacientes com psoríase têm prevalência aumentada de depressão e ansiedade, além de ideação suicida,53–55 dado corroborado por nosso estudo, que mostrou maior porcentagem de sintomas depressivos em idosos portadores da doença quando comparados a idosos sem psoríase. Ressalta‐se também a alta prevalência de sintomas depressivos identificada em adultos portadores de psoríase. Deve‐se, pois, atentar para a identificação e o tratamento das comorbidades psiquiátricas nesses pacientes, além de que transtornos mentais podem ser um fator para a não adesão ao tratamento.

Fragilidade é definida como síndrome de declínio de energia em idosos, fundamentada em alterações intrínsecas ao envelhecimento, como sarcopenia e disfunção imunológica, e extrínsecas, como doenças, imobilidade e diminuição da energia.22 O idoso frágil tem comprometida sua capacidade diária em lidar com estresses agudos, tornando‐se mais dependente e suscetível a agressores. A fragilidade é manifestada por fadiga, diminuição da velocidade na marcha e força de preensão, perda ponderal e baixo nível de atividade física.22 Avaliamos esses indicadores e identificamos maiores índices de fadiga no grupo de IPso em comparação aos ISem, corroborando que a psoríase seria fator adicional de fragilidade aos idosos portadores da doença, assim como a presença de artrite também adiciona fragilidade aos idosos portadores dessa condição, limitando sua funcionalidade, já que nossos pacientes geriátricos com artrite apresentaram menor força de preensão durante as avaliações. Da mesma maneira, os escores de depressão se associaram à fragilidade e diminuição do comprometimento funcional dos pacientes.

Este estudo apresenta naturais limitações ligadas à população de instituição pública, de um único centro, e pacientes sob tratamento em serviço secundário, o que, por outro lado, garantiu certa homogeneidade da amostra, e não impediu a exploração de fatores entre os grupos. Os índices de gravidade são de difícil caracterização, já que todos os pacientes estavam sob tratamento. Fazem‐se necessários estudos de caracterização dessa faixa etária, já que o aumento da prevalência das doenças crônicas, dentre elas a psoríase, vem acompanhando o aumento da expectativa de vida da população geral.

Conclusão

Não houve diferença entre apresentação clínica, acometimento ungueal, de couro cabeludo ou presença de artrite entre o grupo de idosos e adultos portadores de psoríase avaliados. Os idosos, atendidos em centro de referência apresentaram maiores índices de sintomas depressivos, comorbidades metabólicas e fragilidade física em comparação aos controles idosos saudáveis.

Suporte financeiro

FAPESP (projeto n° 19/06684‐5).

Contribuição dos autores

Giovana Viotto Cagnon Brandão: Concepção do estudo; coleta dos dados; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.

Elizandra Gomes Pereira: Coleta dos dados; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.

Gabriela Roncada Haddad: Coleta dos dados; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.

Luciane Donida Bartoli Miot: Concepção do estudo; revisão e aprovação do texto final.

Silvio Alencar Marques: Revisão e aprovação do texto final.

Hélio Amante Miot: Concepção do estudo; análise dos resultados; escrita do texto; revisão e aprovação do texto final.

Conflito de interesses

Nenhum.

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Como citar este artigo: Brandão GV, Pereira EG, Haddad GR, Miot LD, Marques SA, Miot HA. Clinical characterization, physical frailty, and depression in elderly patients with psoriasis from a reference center in Brazil: a cross‐sectional study. An Bras Dermatol. 2024;99:19–26.

Estudo realizado no Departamento de Infectologia, Dermatologia, Diagnóstico por Imagem e Radioterapia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil.

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