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Vol. 96. Núm. 4.
Páginas 510-513 (1 julho 2021)
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Carta ‐ Investigação
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Casos de hanseníase diagnosticados por exame de contatos numa capital hiperendêmica do nordeste brasileiro
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Aruse Maria Marques Soaresa, Rita da Graça Carvalhal Frazão Corrêaa, Kezia Cristina Batista dos Santosb,
Autor para correspondência
kezia_cristinabs@hotmail.com

Autor para correspondência.
, Ivan Abreu Figueiredoc, Maria de Fátima Lires Paivab, Dorlene Maria Cardoso de Aquinoa
a Departamento de Enfermagem, Universidade Federal do Maranhão, São Luís, Maranhão, MA, Brasil
b Departamento de Saúde Coletiva, Universidade Federal do Maranhão, São Luís, Maranhão, MA, Brasil
c Departamento de Medicina, Universidade Federal do Maranhão, São Luís, Maranhão, MA, Brasil
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Tabela 1. Características sociodemográficas dos contatos domiciliares diagnosticados com hanseníase. São Luís (MA), 2010‐2017
Tabela 2. Características clínicas dos contatos domiciliares diagnosticados com hanseníase – São Luís (MA), 2010‐2017
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Prezado Editor,

A hanseníase, doença infecciosa de período de incubação prolongado, tem, em seus contatos domiciliares, um importante meio para a manutenção da endemia. Caracteriza‐se por uma síndrome clínica dermatoneurológica que apresenta elevado potencial de provocar incapacidades físicas e deformidades, além de seus impactos sociais e psicológicos.1,2

Ainda é considerada como relevante problema de saúde pública na maioria dos estados brasileiros, apesar dos esforços do Ministério da Saúde na tentativa de controlar a infecção.1 No ano de 2018, foram notificados 208.619 casos novos no mundo; o Brasil é o 2° país com maior prevalência da doença, registrando um total de 28.660 casos novos, representando 13,3% do total global de novas ocorrências.3

Os contatos domiciliares apresentam alta vulnerabilidade para o desenvolvimento da doença em virtude da exposição prolongada ao bacilo no ambiente domiciliar. Esse risco é cerca de 5‐10 vezes maior em famílias com um caso da doença, e aumenta em até 10 vezes em situação de mais de um caso no mesmo domicílio.2

Em regiões de alta endemicidade, a vigilância de contatos torna‐se uma medida imprescindível para o controle da hanseníase. Assim, recomenda‐se a avaliação dermatoneurológica pelo menos uma vez ao ano, por pelo menos cinco anos, em todos os contatos domiciliares; após esse período, esses contatos deverão ser esclarecidos quanto à possibilidade de surgimento, no futuro, de sinais e sintomas sugestivos de hanseníase.4,5

Em 2017, o município de São Luís (MA) foi classificado como regular em relação à proporção de contatos examinados, pois examinou 51,58% dos contatos registrados, fato considerado preocupante.6 Nesse sentido, conhecer a ocorrência de casos de hanseníase diagnosticados por exame entre os contatos domiciliares no referido município poderá trazer contribuições valiosas tanto para a prática laboral dos profissionais de saúde quanto aos usuários assistidos pela Estratégia Saúde da Família (ESF).

Este trabalho é um estudo epidemiológico, descritivo, retrospectivo de delineamento transversal, cujo objetivo foi estudar a ocorrência de casos de hanseníase entre contatos domiciliares dos casos notificados no município de São Luís (MA), no período de 2010 a 2017, por meio de informações colhidas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), fichas de notificação e prontuários dos pacientes (n=182).

Os dados foram analisados no programa EPI‐INFO, versão 7 (CDC‐Atlanta). Calculou‐se a prevalência de hanseníase entre os contatos examinados e, em seguida, as frequências absoluta e relativa para a análise descritiva. Este estudo faz parte do macroprojeto intitulado Abordagem Integrada de Aspectos Clínicos, Epidemiológicos (espaço‐temporais), Operacionais e Psicossociais da Hanseníase em Município Hiperendêmico do Maranhão (INTEGRAHANS MARANHÃO), aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com parecer 2.508.780.

A figura 1 mostra que, no período do estudo, foram registrados 17.309 contatos domiciliares; 9.387 foram examinados e 182 foram diagnosticados com hanseníase, com uma prevalência de 193,9/10.000 contatos. No início da série histórica, foram observados 3,52% de casos notificados de hanseníase entre contatos, correspondendo ao percentual mais alto. No ano de 2011, houve declínio do percentual para 2,20%. Observou‐se que os anos de 2012, 2014, 2015 e 2016 foram os períodos que apresentaram os maiores declínios, e nos anos de 2013 e 2017 verificaram‐se percentuais semelhantes.

Figura 1.

Série histórica de hanseníase diagnosticada pelo modo de detecção de casos novos por exame de contato por ano de notificação (São Luís, MA, 2010‐2017).

Fonte: SINAN, 2019.

(0.09MB).

A tabela 1 apresenta as características sociodemográficas dos contatos domiciliares diagnosticados com hanseníase. Observou‐se maior frequência na faixa etária de 15‐59 anos (63,74%), sexo feminino (56,59%), cor parda (58,79%) e Ensino Fundamental incompleto (26,37%).

Tabela 1.

Características sociodemográficas dos contatos domiciliares diagnosticados com hanseníase. São Luís (MA), 2010‐2017

Variáveis 
Idade
0 a 6 anos  11  6,04 
7 a 14 anos  44  24,18 
15 a 59 anos  116  63,74 
60 a 100 anos  11  6,04 
Raça/cor
Branca  40  22,00 
Preta  30  16,49 
Amarela  01  0,54 
Parda  107  58,79 
Não registrado  04  2,18 
Sexo
Masculino  79  43,41 
Feminino  103  56,59 
Escolaridade
Analfabeto  07  3,85 
1 a 4 série incompleta do Ensino Fundamental  30  16,50 
4 série completa do Ensino Fundamental  09  4,95 
5 a 8 série incompleta do Ensino Fundamental  48  26,37 
Ensino Fundamental completo  09  4,95 
Ensino Médio incompleto  23  12,63 
Ensino Médio completo  34  18,68 
Ensino Superior incompleto  05  2,75 
Ensino Superior completo  03  1,64 
Não se aplicaa/Não registrado  14  7,68 
Total  182  100 

Fonte: SINAN, 2019.

a

Criança na faixa‐etária de 0 a 6 anos.

Na tabela 2 estão listadas as características clínicas; 48,90% eram da forma dimorfa; houve predomínio do grau de incapacidade no início do tratamento igual a grau zero (64,06%) e baciloscopia não realizada (53,28%). Quanto ao número de lesões e nervos afetados, a maioria apresentava até cinco lesões (87,16%) e nenhum nervo afetado (59,34%).

Tabela 2.

Características clínicas dos contatos domiciliares diagnosticados com hanseníase – São Luís (MA), 2010‐2017

Variáveis 
Forma clínica
Indeterminada  27  14,87 
Tuberculóide  52  28,57 
Dimorfa  89  48,90 
Virchowiana  10  5,49 
Não classificado  2,20 
Grau de incapacidade
117  64,06 
47  26,00 
08  4,45 
Não registrado  10  5,49 
Baciloscopia
Positiva  11  6,07 
Negativa  74  40,65 
Não realizada  97  53,28 
Número de lesões
Até 5 lesões  155  87,16 
6 a 10 lesões  15  8,26 
> 10 lesões  07  3,84 
Não registrada  05  2,74 
Número de nervos afetados
Nenhum  108  59,34 
1 a 4  53  29,14 
> 04  19  10,43 
Não registrado  02  1,09 
Total  182  100 

Fonte: SINAN, 2019.

Na figura 2 é possível visualizar que a forma clínica dimorfa foi predominante em todos os anos, com exceção do ano de 2012, em que 50% dos casos eram da forma tuberculoide. Observou‐se, também, que nas formas indeterminada, tuberculoide e virchowiana houve uma variação dos percentuais no decorrer dos anos de 2010 a 2017.

Figura 2.

Forma clínica dos contatos domiciliares diagnosticados com hanseníase por ano de notificação (São Luís, MA, 2010‐2017).

Fonte: SINAN, 2019.

(0.12MB).

A prevalência de contatos com hanseníase foi superior aos resultados de pesquisa similar realizada em São Luís (MA).2 A alta prevalência encontrada está diretamente relacionada à baixa cobertura da ESF em São Luís, que é de apenas 34,67%. Municípios com baixa cobertura do programa podem limitar as ações das equipes da ESF, especialmente, no que se refere às ações de vigilância e controle dos contatos.7

A faixa etária predominante (15‐59 anos) é uma questão preocupante, pois abrange pessoas em idade jovem e produtiva com repercussões negativas para o mercado de trabalho e a economia do país, familiar e individual.8 Destaca‐se, ainda, que 30,2% dos casos novos de hanseníase diagnosticados entre os contatos examinados eram crianças e adolescentes com menos de 15 anos, o que configura grande preocupação epidemiológica em relação ao controle da doença no município.

O baixo nível de escolaridade encontrado pode relacionar‐se ao déficit de entendimento sobre a doença e suas particularidades e, consequentemente, na demora em buscar assistência adequada nos serviços de saúde, dificultando o diagnóstico, a adesão e o tratamento da doença.9

A forma clínica dimorfa indica diagnóstico tardio e falhas nas ações desenvolvidas na Atenção Básica para tal fim. Outros estudos nacionais encontraram resultados semelhantes, em que as formas multibacilares prevaleceram sobre as paucibacilares.1,2,4,10

Observou‐se predominância do grau zero de incapacidade física; entretanto, registraram‐se casos com grau 1 e 2. Verificou‐se que há uma contradição entre o predomínio da forma clínica dimorfa e o grau zero de incapacidade física – esse fato pode ser atribuído à ausência de preparo e/ou experiência para a realização da avaliação do grau de incapacidade ou alguns problemas técnicos ou operacionais durante o envio dos dados para o SINAN.

O estudo apresentou limitações referentes ao uso de dados secundários, em decorrência de possíveis erros ou incompletude de informações nos prontuários, fichas de notificação e SINAN. As características sociodemográficas e clínicas encontradas neste estudo refletem o caráter negligenciado da hanseníase e a precariedade das ações voltadas para a detecção precoce entre os contatos, evidenciado pela elevada taxa de prevalência de hanseníase entre contatos domiciliares e pela forma clínica dimorfa predominante.

Suporte financeiro

Este trabalho foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) (processo n° 01347/17).

Não houve envolvimento da(s) fonte(s) de financiamento nos processos de seleção do desenho do estudo, na coleta, análise e interpretação dos dados, na redação do relatório e na decisão de enviar o artigo para publicação.

Contribuição dos autores

Aruse Maria Marques Soares: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do conteúdo; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Rita da Graça Carvalhal Frazão Corrêa: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; revisão crítica do manuscrito.

Kezia Cristina Batista dos Santos: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.

Ivan Abreu Figueiredo: Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.

Maria de Fátima Lires Paiva: Aprovação da versão final do manuscrito; revisão crítica do manuscrito.

Dorlene Maria Cardoso de Aquino: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
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H.S.B. Romanholo, E.A. Souza, A.N. Ramos Júnior, Kaiser ACGCB, I.O. Silva, A.L. Brito, et al.
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Rev Bras Enferm., 71 (2018), pp. 163-169
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M.A. Mendonça, Y.N.L. Andrade, I.L.T.P. Rolim, D.M.C. Aquino, V.M.S. Soeiro, L.H. Santos.
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Rev Fun Care., 11 (2019), pp. 873-879
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Brasil. Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico Hanseníase [Internet]. 2020;1(esp):1‐52. [Acesso em 14 fev. 2020]. Disponível em:<http://www.aids.gov.br/pt‐br/pub/2020/boletim‐epidemiologico‐de‐hanseniase‐2020>.
[4]
D.C. Lobato, M.B. Xavier, D.C.O. Neves.
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[5]
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Diretrizes para vigilância, atenção e eliminação da Hanseníase como problema de saúde pública: manual técnico‐operacional. [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde, 2016. [Acesso em 19 jul. 2020]. Disponível em: <http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2016/fevereiro/04/diretrizes‐eliminacao‐hanseniase‐4fev16‐web.pdf>.
[6]
Brasil. Ministério da Saúde. Percentual de contatos examinados entre registrados dos casos novos de hanseníase nos anos das coortes, estados, capitais. Brasil: 2017. [Internet] [Acesso em 14 fev. 2020]. Disponível em: <http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2018/julho/13/Percentual‐de‐contatos‐de‐casos‐novos‐de‐hanseniase‐examinados‐entre‐os‐registrados‐nos‐anos‐das‐coortes‐2000‐a‐2017.pdf>.
[7]
T.M. Pereira, L.M.S. Silva, M.S.A. Dias, L.D. Monteiro, M.R.F. Silva, O.M. Alencar.
Tendência temporal da hanseníase em região de alta endemicidade do Nordeste brasileiro.
Rev Bras Enferm., 72 (2019), pp. 1356-1362
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M.A.B. Pacheco, M.L.L. Aires, E.S. Seixas.
Prevalence and control of Hansen's disease: a research in an urban occupation area of São Luis, Maranhão state.
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Factors associated with the worsening of the disability grade during leprosy treatment in Brazil.
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M.A.S. Santos, J.L.B. Aquino, E. Pegas, E.C.F. Abrahao Machado.
Analysis of clinical aspects of leprosy patients between 2010‐2017 at a reference center in Campinas.
An Bras Dermatol., 95 (2020), pp. 252-254

Como citar este artigo: Soares AMM, Corrêa RGCF, Santos KCB, Figueiredo IA, Paiva MFL, Aquino DMC. Leprosy cases diagnosed by contacts examination in a hyperendemic capital city of northeastern Brazil. An Bras Dermatol. 2021;96:510–3.

Trabalho realizado na Universidade Federal do Maranhão, São Luís, Maranhão, MA, Brasil.

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