Compartilhar
Informação da revista
Vol. 95. Núm. 2.
Páginas 265-266 (Março - Abril 2020)
Visitas
13871
Vol. 95. Núm. 2.
Páginas 265-266 (Março - Abril 2020)
Carta – Caso clínico
Open Access
Dermatite alérgica de contato ao slime
Visitas
13871
Nabila Scabine Pessottia, Mariana de Figueiredo Silva Hafnera, Mellanie Starck Possab, Rosana Lazzarinia,
a Setor de Alergias Cutâneas, Clínica de Dermatologia, Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
b Curso de Aperfeiçoamento em Alergias Cutâneas, Clínica de Dermatologia, Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (3)
Mostrar maisMostrar menos
Texto Completo
Prezado Editor,

Slime é o nome coloquial de um produto visco‐elástico usado como brinquedo, que ganhou popularidade nos últimos anos entre crianças e adolescentes do mundo todo. Pode ser de fabricação caseira ou industrializada. O primeiro é obtido pela mistura de artigos de uso cosmético e doméstico, inclusive espumas de barbear, soluções de lentes de contato com ácido bórico, colas, detergentes líquidos e sabão em pó, entre outros.1

Relatamos o caso de uma menina de 9 anos, com antecedente pessoal de atopia, que apresentava dermatite eczematosa nas mãos havia 5 anos, com períodos de exacerbação relacionados à manipulação do slime. A mãe referia que a paciente teve contato com o produto comercial e, em algumas ocasiões, criou o próprio brinquedo com hidratante corporal, água boricada, cola, bicarbonato de sódio, corante de alimento azul e espuma de barbear.

Ao exame dermatológico apresentava intenso eritema nas regiões palmares, sobre o qual se notavam múltiplas vesículas de conteúdo claro associadas à descamação, fissuras e algumas áreas exulceradas (fig. 1). O tratamento foi feito com corticoterapia sistêmica 0,5 mg/kg/dia e, após 2 meses, realizou‐se teste de contato com a bateria‐padrão brasileira, somada à solução aquosa de metilisotiazolinona (0,02%) e uma parte do produto industrializado (mesmo sabendo‐se da existência de potenciais irritantes em sua composição, que poderiam levar a possíveis reações falso‐positivas) (fig. 2). A leitura após 96 horas demonstrou positividade 2+ para Kathon CG, que é uma mistura de metilisotiazolinona (MI) e metilclorotiazolinona (MCI), e também para a metilisotiazolinona (MI) isolada 2+ (fig. 3), componente presente no hidratante, na cola e na espuma de barbear usados na confecção do produto caseiro. A empresa produtora do slime industrializado informou que os conservantes usados na sua composição foram os parabenos, negativos no teste de contato.

Figura 1.

Regiões palmares mostram eritema, descamação e algumas vesículas.

Figura 2.

Aspecto do produto industrializado.

Figura 3.

Teste de contato positivo para Kathon CG (++).

O slime pode causar tanto dermatite de contato irritativa (DCIP) quanto alérgica (DAC), principalmente quando é confeccionado em casa, com a adição de diferentes produtos comerciais. Quando irritativa, componentes do tipo ácido bórico, álcoois e glicóis são os responsáveis pela agressão da barreira cutânea.2 Por outro lado, alérgenos como a metilisotiazolinona e a metilclorotiazolinona são bem reconhecidos como causadores de DAC e são usados como conservantes em produtos industrializados e cosméticos, como lenços umedecidos, hidratantes, maquiagem, laquês, produtos de limpeza, colas, entre outros.3 No caso exposto, revelou‐se a importância da detecção das substâncias nos inúmeros produtos que podem ser usados.

Pacientes atópicos são propensos ao desenvolvimento de DAC pela deficiência da barreira cutânea e pelo contato constante com possíveis alérgenos. No caso relatado, a paciente tinha eczema das mãos relacionado à atopia, cuja exacerbação ocorreu após iniciar manipulação do gel e resultou na DAC.

Neste último ano foram publicados vários relatos de DCI e DAC provocadas pelo slime, o que deve alertar pais e profissionais de saúde sobre os riscos dessa brincadeira, principalmente quando fabricado em casa.2

Anderson et al. reuniu os ingredientes de 48 receitas de géis disponíveis na internet e evidenciou os principais alérgenos. Os mais comuns foram as fragrâncias mix I e II e conservantes, como propilenoglicol e MI, esse último o alérgeno positivo no caso da nossa paciente.4

Clinicamente, as causas dos eczemas das mãos são indistinguíveis. Como o slime pode causar ambas as formas de dermatite de contato, o teste de contato é essencial, não só para diagnóstico diferencial como para detectar o alérgeno causador. Identificá‐lo é importante, uma vez que as substâncias presentes no slime fazem parte da composição dos produtos de uso cotidiano dos pacientes, como shampoos, sabonetes e cremes. Desse modo, caso não haja um diagnóstico preciso, a dermatite pode evoluir com recidivas pela manutenção do contato com o alérgeno, aumentar a morbidade e dificultar o controle da doença.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Nabila Scabine Pessotti: Elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura.

Mariana de Figueiredo Silva Hafner: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Mellanie Starck Possa: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Rosana Lazzarini: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Conflitos de interesse

Nenhum.

Referências
[1]
C. Asher, R. Dalan, M.I. Aly.
Home‐made Slime”: a novel cause for pediatric burns’ referrals; do we need to raise awareness?.
[2]
E. Heller, A.S. Murthy, M.V. Jen.
A slime of the times: Two cases of acute irritant contact dermatitis from homemade Slime.
Pediatr Dermatol., 36 (2019), pp. 139-141
[3]
C.D. Piazza, S.C.P. Cestari.
Contact dermatitis from Do‐It‐Yourself Slime.
An Bras Dermatol., 93 (2018), pp. 944
[4]
L.E. Anderson, J.R. Treat, B.A. Brod, J. Yu.
Slime” contact dermatitis: Case report and review of relevant allergens.
Pediatr Dermatol., 36 (2019), pp. 335-337

Como citar este artigo: Pessotti NS, Hafner MFS, Possa MS, Lazzarini R. Allergic contact dermatitis to slime. An Bras Dermatol. 2020;95:265–266.

Trabalho realizado no Setor de Alergias Cutâneas, Clínica de Dermatologia, Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

Copyright © 2020. Sociedade Brasileira de Dermatologia
Baixar PDF
Idiomas
Anais Brasileiros de Dermatologia (Portuguese)
Opções de artigo
Ferramentas