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Vol. 99. Núm. 5.
Páginas 696-705 (1 setembro 2024)
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Vol. 99. Núm. 5.
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Importância da biopsia tangencial no diagnóstico da psoríase ungueal
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Laura Bertanhaa,b,
Autor para correspondência
labertanha@yahoo.com.br

Autor para correspondência.
, Ingrid Iara Damasa, Rafael Fantelli Stelinia, Maria Letícia Cintraa, Nilton Di Chiacchiob
a Departamento de Anatomia Patológica, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil
b Departamento de Dermatologia, Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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Resumo
Fundamentos

A histopatologia pode ser crucial para o diagnóstico de doenças inflamatórias ungueais. A excisão longitudinal e a biopsia por punch são as técnicas mais utilizadas para obtenção do material a ser analisado. Entretanto, há baixa correlação clínico‐histopatológica, além do risco de distrofia ungueal. A biopsia por excisão tangencial (ET) é técnica bem estabelecida para investigação de melanoníquia longitudinal. A ET também pode ser utilizada para avaliar doenças cujas alterações histopatológicas são superficiais, como a psoríase.

Objetivo

Estudar o valor da ET no diagnóstico histopatológico da psoríase ungueal.

Métodos

Trata‐se de estudo prospectivo e descritivo dos achados clínico‐histopatológicos de amostras do leito ou matriz ungueal e da lâmina ungueal de 13 pacientes com suspeita clínica de psoríase ungueal. As biopsias foram obtidas por meio de avulsão parcial da unha e ET.

Resultados

Em nove pacientes, a hipótese de psoríase foi confirmada pela histopatologia; em um deles, os critérios para diagnóstico de líquen plano ungueal foram preenchidos. A amostra de tecido de apenas um paciente não atingiu as papilas dérmicas, e em quatro dos 13 pacientes, a derme adventícia não foi alcançada. Nenhum paciente desenvolveu onicodistrofia após o procedimento.

Limitações do estudo

Em três pacientes, as alterações clínicas e, consequentemente, histopatológicas ungueais foram sutis. Além disso, na amostra da ET de um paciente, a papila dérmica não foi amostrada.

Conclusões

A ET é boa opção para auxiliar no diagnóstico da psoríase ungueal, principalmente quando combinados elementos clínicos adequados. Com essa técnica, são obtidas amostras maiores e mais finas, com menor tempo de recuperação pós‐operatória e baixo risco de onicodistrofia.

Palavras chave:
Biopsia
Doenças da unha
Histopatologia
Psoríase
Texto Completo
Introdução

As alterações clínicas nas doenças ungueais não são apenas limitadas, mas também compartilhadas por diferentes tipos de processos patológicos. A onicólise, por exemplo, pode ser manifestação de diferentes doenças, como líquen plano, onicomicose ou psoríase ungueal.1 No caso de suspeita de doenças inflamatórias ungueais sem envolvimento cutâneo associado, é necessária biopsia ungueal para auxiliar no diagnóstico histopatológico preciso e no tratamento específico.1

O envolvimento da matriz ungueal na psoríase manifesta‐se como corrosão da lâmina ungueal, adelgaçamento, onicorrexe, pontos vermelhos na lúnula e leuconiquia verdadeira. No leito ungueal, podem ser identificadas alterações em “mancha de óleo” ou “mancha salmão”, hiperceratose subungueal, onicólise e hemorragias em estilhaços.1Pittings ungueais, hiperceratose subungueal e onicólise são os achados mais comuns.2

O diagnóstico clínico pode ser corroborado com a dermatoscopia, possibilitando identificação mais clara do halo eritematoso próximo à onicólise. Esse exame também destaca capilares dilatados, alongados e tortuosos no hiponíquio e no leito ungueal, além de hiperceratose subungueal compacta na borda livre.3

As alterações histopatológicas na psoríase ungueal limitam‐se à lâmina ungueal ou à camada córnea, à epiderme e à derme papilar, poupando a derme reticular.1 Assim como na pele, há influxo de neutrófilos (considerado critério importante para o diagnóstico de psoríase ungueal), hiperplasia psoriasiforme da epiderme, vênulas dilatadas e tortuosas preenchendo as papilas dérmicas e infiltrado linfoide perivascular na derme adventícia subjacente.1 A paraceratose focal pode se formar nas porções dorsal, intermediária ou ventral da lâmina ungueal, produzindo pitting ungueal, leuconiquia verdadeira ou onicólise, respectivamente. Quando toda a matriz é afetada, pode haver distrofia acentuada.4

Entretanto, certas características são distintas na unidade ungueal: enquanto no hiponíquio há perda da camada granulosa normalmente presente, na matriz e no leito ungueal há hipergranulose. Pode ocorrer espongiose, formando crostas séricas proeminentes no topo das papilas, em virtude da hipervascularização, aumento da permeabilidade vascular nas papilas dérmicas e bloqueio da eliminação do exsudato causado pela justaposição da unha. Além disso, podem ser observados pontos hemorrágicos na camada granulosa e na camada córnea.4,5

Como a onicomicose e a psoríase compartilham algumas características histopatológicas, Grover et al. recomendaram que a coloração histoquímica negativa pelo ácido periódico de Schiff (PAS, do inglês periodic acid‐Schiff) para fungos fosse incluída como critério diagnóstico adicional.5,6

A biopsia longitudinal e por punch de 3 mm são atualmente as técnicas mais utilizadas para investigação de alterações ungueais. Na técnica longitudinal, é feita incisão no leito ungueal, em toda a matriz e na prega ungueal proximal. A segunda incisão paralela à inicial, a não mais que 3 mm da primeira, é feita na prega ungueal lateral. O tecido entre as duas incisões é excisado do osso subjacente, e o defeito é então suturado.1,5 As complicações esperadas incluem redução na largura da unha, desalinhamento do eixo da unha em crescimento, cicatrizes no leito ungueal, onicólise ou crescimento de espículas ungueais.7

A biopsia por punch pode ser realizada em qualquer área do aparelho ungueal. A avulsão parcial da lâmina ungueal pode ou não ser necessária. Utiliza‐se o punch de 3 mm, girando‐o até o osso, e a base do fragmento é cortada com tesoura íris afiada. O defeito resultante não requer sutura. Na região do leito ungueal, a coleta da biopsia raramente gera distrofia, mas pode resultar em onicólise. Na matriz proximal, existe risco de onicodistrofia.1,7

Em ambas as técnicas podem aparecer onicólise e distrofia ungueal.1,7 Incidentalmente, podem ocorrer baixas correlações clinicopatológicas.5,6 A técnica de biopsia por excisão tangencial (ET) é bem conhecida para o diagnóstico de melanoníquia longitudinal. Estudos anteriores demonstraram que a espessura obtida é suficiente para o diagnóstico diferencial dos diversos processos que se manifestam com melanoníquia, e a morbidade é menor, em comparação com técnicas mais invasivas.8–10 Existem duas vantagens em usar a ET. Primeiramente, com a ET é possível obter amostra com largura superior a 3 mm, propiciando maior número de cortes histológicos. Isso poderia auxiliar na avaliação histopatológica de doenças inflamatórias caracterizadas por alterações histopatológicas superficiais, como a psoríase. Em segundo lugar, ao utilizar a técnica da ET, os tecidos profundos são poupados, reduzindo o risco de onicodistrofias cicatriciais. O objetivo do presente estudo foi avaliar os resultados da técnica de ET ungueal para o diagnóstico histopatológico da psoríase.

Métodos

Este é um trabalho descritivo prospectivo. O estudo prosseguiu após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição (CAEE número: 55474521.1.0000.5404). Entre 2021 e 2022, foram selecionados 13 pacientes com hipótese diagnóstica de psoríase ungueal durante o atendimento ambulatorial de doenças ungueais. Foram consideradas as seguintes alterações ungueais: onicólise, hemorragias em estilhaços, hiperceratose subungueal, manchas salmão/manchas de óleo e pitting. Os formulários de consentimento informado assinados incluíram o risco de onicodistrofia.

As biopsias foram obtidas da unha com envolvimento mais proeminente, preferencialmente no leito ungueal. O mesmo dermatologista especialista em unhas realizou os procedimentos. Foi utilizada técnica cirúrgica asséptica com anestesia de bloqueio distal sem vasoconstritor e com torniquete. A lâmina ungueal foi descolada com lâmina de bisturi número 15 para manter a integridade do epitélio no momento da avulsão da unha. Em seguida, a unha foi parcialmente cortada com alicate e realizada a excisão tangencial no leito ungueal ou matriz (fig. 1). Por fim, o torniquete foi removido e foi aplicado o curativo oclusivo. Um diagrama representativo do complexo ungueal foi desenhado em papel filtro, sobre o qual foi colocada a peça retirada, no local correspondente à sua retirada, com o epitélio voltado para cima. Esse procedimento evita que a amostra laminar se enrole durante a fixação e auxilia a análise histopatológica.11

Figura 1.

Técnica de biopsia tangencial longitudinal. (A) Onicoscopia: onicólise regular com mancha salmão e vasos lineares dilatados. (B) Descolamento parcial da lâmina ungueal com lâmina de bisturi número 15, na região demarcada. (C) Corte parcial da lâmina com alicate. (D) Biopsia tangencial ligeiramente mais espessa do leito ungueal (amostra medindo 0,7×0,2×0,1 cm).

(0.38MB).

Em seguida, o papel foi dobrado para embrulhar o material, grampeado e imerso em formaldeído tamponado a 10%. A lâmina ungueal removida foi colocada em tubo seco de polipropileno (Eppendorf). Ambas as amostras foram enviadas para processamento histológico no Departamento de Patologia. No laboratório, a amostra foi retirada do papel filtro e colocada dentro de um sulco produzido em uma fina fatia de Solanum tuberosum (batata inglesa), para garantir a adequada inclusão histológica. Ambos (batata e material cirúrgico) foram desidratados, diafanizados e embebidos em parafina, como um único material, e posteriormente embebidos em parafina, cortados em vários níveis e corados.12 A lâmina ungueal foi amolecida com potássio, lavada, cortada, fixada e processada para análise histológica. Os pacientes foram orientados sobre como realizar a limpeza local 48 horas após o procedimento e usar analgésicos e antibióticos sistêmicos por sete dias. Houve seguimento clínico por período mínimo de seis a 12 meses, até o completo crescimento ungueal.

As amostras foram analisadas cegamente por um dermatopatologista e um dermatologista. Foram avaliadas as seguintes variáveis: hiperparaceratose subungueal, exsudato seroso e/ou neutrofílico e hemorragia no estrato córneo, hipo/hipergranulose, papilomatose, espongiose, hiperplasia da epiderme, vasos papilares dérmicos dilatados, tipo e localização do infiltrado inflamatório no derme papilar ou adventícia. A avaliação para fungos foi realizada em todas as amostras utilizando a coloração pelo PAS.

Resultados

As biopsias foram obtidas de 12 dedos das mãos e de um dedo do pé de 13 pacientes diferentes (cinco homens e oito mulheres). Uma das amostras apresentou achados inequívocos de líquen plano ungueal (infiltrado linfoide liquenoide, com fenda dermoepidérmica e ausência de vasos papilares dérmicos dilatados). Clinicamente, havia distrofia de todas as unhas das mãos, com onicólise, hiperceratose subungueal, hemorragias em estilhaços, manchas vermelhas no leito ungueal e lúnula e estrias longitudinais (fig. 2).

Figura 2.

Líquen plano. (A) Todas as unhas afetadas: onicólise regular, hiperceratose subungueal e onicodistrofia. (B) Onicoscopia: manchas vermelhas na lúnula, hiperceratose subungueal e leuconiquia estriada irregular. (C) Leito ungueal com infiltrado linfoide significante nas papilas dérmicas. (D) Infiltrado linfoide liquenoide preenchendo a papila, com fenda subepidérmica. Hematoxilina & eosina, ampliação original 100×(C) e 400×(D).

(0.82MB).

As principais características clínicas das 12 amostras restantes foram onicólise (9/12), hemorragias em estilhaços (9/12), mancha de óleo (8/12), mancha salmão (7/12), pitting (7/12) e hiperceratose subungueal (5/12). Apenas um dos 12 pacientes apresentou pitting como alteração isolada, de modo que a ET foi obtida da matriz ungueal. Os demais apresentaram alterações ungueais predominantemente relacionadas ao leito ungueal (figs. 3 e 4).

Figura 3.

Psoríase ungueal. (A) Onicólise regular com mancha salmão em vários dedos. (B) Onicoscopia: onicólise regular com mancha salmão. (C) Pittings ungueais grosseiros.

(0.49MB).
Figura 4.

Psoríase ungueal. (A) Onicólise regular com mancha salmão em vários dedos. (B) Hiperceratose subungueal compacta, observada na borda ungueal livre. (C) Onicoscopia: onicólise regular com mancha salmão e leuconiquia puntiforme.

(0.17MB).

A ET da matriz ungueal permitiu identificar ectasia vascular na derme papilar, embora outras características histopatológicas da psoríase não estivessem presentes.

Cinco pacientes apresentavam lesões cutâneas de psoríase concomitantemente. Desses, três apresentavam discretas alterações ungueais; apenas um apresentava mancha salmão com onicólise, um apresentava hiperceratose subungueal com hemorragias em estilhaços e um apresentava pitting isolado. Nesses três, as alterações histopatológicas presentes na ET e na lâmina ungueal foram insuficientes para preencher os critérios para o diagnóstico de psoríase. A largura das amostras obtidas por ET variou de 1,1 cm a 0,3 cm, e foram iguais ou maiores do que aquelas obtidas com punch de 3 mm ou biopsias longitudinais. Ainda assim, sua espessura variou de 0,1 a 0,15 cm.

Em quatro dos 13 pacientes, a derme adventícia não foi amostrada, e em um paciente a papila também não. Os achados histopatológicos nas 12 amostras foram (fig. 5): ausência de espongiose (12/12), presença de vasos papilares dilatados (11/11), paraceratose (11/12), hiperplasia epitelial regular (9/ 12), hipogranulose focal (5/12), adelgaçamento da epiderme na região suprapapilar (5/12), microabscessos de Munro (4/12) e hipergranulose focal (3/12). O envio da lâmina ungueal foi importante para a pesquisa de fungos. Em um caso foi possível identificar, em um foco, pequeno número de fungos filamentosos septados. A presença de fungos filamentosos na lâmina ungueal pode ser atribuída a uma infecção fúngica primária ou infecção fúngica secundária à psoríase. A psoríase e a dermatofitose apresentam muitos achados histopatológicos comuns. Entretanto, a presença de paraceratose nas papilas, hipogranulose, adelgaçamento da epiderme suprapapilar e aumento da densidade dos vasos dérmicos permitiram a confirmação diagnóstica de psoríase concomitante.

Figura 5.

Psoríase (leito ungueal). (A) Hiperplasia psoriasiforme da epiderme, derme papilar hipervascularizada e adelgaçamento do estrato espinhoso suprapapilar. (B‐C) Adelgaçamento do estrato espinhoso suprapapilar, papilas altamente vascularizadas e ausência de espongiose. (D) Paraceratose e exsudato de neutrófilos intracorneanos. Hematoxilina & eosina, 40×(A) e 400×(B‐D).

(0.93MB).

Por meio da avaliação histopatológica da lâmina ungueal, foram registrados achados adicionais sugestivos de psoríase, como topo das papilas superficializado, exsudato seroso intracorneano suprapapilar, paraceratose e neutrófilos intracorneanos. A avaliação da lâmina ungueal contribuiu para o diagnóstico final em três dos 12 casos (fig. 6).

Figura 6.

Psoríase (lâmina ungueal). (A) Papilomatose (parte superior das papilas do leito superficializadas – setas vermelhas). (B) Exsudato seroso intracorneano no topo das papilas (setas azuis), com paraceratose (setas pretas). (C) Núcleos de queratinócitos (paraceratose – setas pretas) e raros neutrófilos (setas amarelas). Hematoxilina & eosina, ampliação original 100×(A, B) e 400×(C).

(0.83MB).

Em resumo, as amostras obtidas com ET nos 13 casos permitiram definir o diagnóstico de líquen plano em um caso e de psoríase em nove. Nos três casos restantes, não foram preenchidos critérios suficientes para atingir o diagnóstico.

O tempo para a retomada das atividades diárias foi de até sete dias. Não foi observada distrofia ungueal em nenhum paciente no período de seis meses a um ano de seguimento (figs. 7 e 8).

Figura 7.

Psoríase ungueal – antes e depois da biopsia tangencial. (A) Onicoscopia da área a ser biopsiada – onicólise regular com manchas salmão e hemorragias em estilhaços. (B) Pós‐operatório de sete dias – excelente cicatrização do leito. (C) Pós‐operatório de 30 dias – recuperação completa da unha.

(0.18MB).
Figura 8.

Psoríase ungueal – antes e depois da biopsia tangencial. (A‐B) Onicoscopia da área a ser biopsiada – onicólise regular com mancha de óleo, hemorragias em estilhaços e hiperceratose subungueal compacta. (C) Período pós‐operatório imediato. (D) Pós‐operatório de 30 dias – recuperação completa da unha.

(0.36MB).
Discussão

Na abordagem das doenças inflamatórias ungueais, a histopatologia é de extrema importância para definição do diagnóstico, planejamento do tratamento e estimativa do prognóstico. Entretanto, os dermatologistas relutam em fazer biopsia da unha, em virtude do risco de distrofias, da falta de treinamento prévio em cirurgia ungueal e, não raramente, de achados histopatológicos inconclusivos.5,6,13–15 Em 1999, Haneke demonstrou a eficácia e segurança da ET para obtenção de material para análise histopatológica e tratamento da melanoníquia ungueal, evitando onicodistrofias permanentes.8 Di Chiacchio et al. relataram que, com essa técnica, é possível obter amostras com espessura suficiente para o diagnóstico diferencial entre hipermelanose, lentigo, nevo juncional ou composto e melanoma in situ, pois as alterações histopatológicas dessas lesões estão presentes na epiderme ou parte superior da derme. Eles também descobriram que o procedimento induziu danos mínimos à matriz, com excelentes resultados estéticos.10 Desde então, o uso dessa técnica permaneceu restrito à elucidação do diagnóstico de melanoníquia. Na psoríase e no líquen plano, principais doenças inflamatórias ungueais, são observadas alterações histopatológicas nas camadas superficiais do leito/matriz ungueal. Portanto, a possibilidade de também utilizar a ET no diagnóstico dessas doenças pode estimular os dermatologistas a coletar mais biopsias e, consequentemente, definir o diagnóstico em maior número de pacientes.

A biopsia por punch, sem avulsão prévia da lâmina, seria a técnica ideal indicada para investigação de doenças inflamatórias ungueais, em virtude de melhor preservação da morfologia tecidual superficial. Porém, é tarefa difícil introduzir o punch através da lâmina ungueal, mantendo a adesão da lâmina ao leito/matriz durante a rotação do instrumento. Frequentemente ocorre o cisalhamento. Além disso, o ideal é amolecer a lâmina ungueal com uso de álcali antes da fixação, para otimizar as preparações histológicas. Esse procedimento e a demora na fixação da amostra podem danificar elementos do leito/matriz ungueal que ajudariam a definir o diagnóstico.13–15 O descolamento cuidadoso da lâmina ungueal com lâmina de bisturi, na ET, mostrou‐se eficaz na manutenção da integridade do epitélio. No presente estudo, o envio da lâmina sobrejacente separadamente tornou possível avaliação microscópica adicional, facilitando o processamento histopatológico. Os achados histomorfológicos mais frequentes na presente amostra foram: ausência de espongiose (12/12), papilas dilatadas (11/11) e paraceratose (11/12) (figs. 5, 9 e 10). Grover et al. destacaram os achados de hiperceratose com áreas paraceratóticas (91%) e vasos dilatados em todos os pacientes com diagnóstico clínico confirmado de psoríase.6

Figura 9.

Psoríase ungueal. (A) Todas as unhas com onicólise regular, mancha salmão, algumas manchas de óleo, hiperceratose subungueal e hemorragias em estilhaços. (B) Onicoscopia: leuconiquia distal e hemorragias em estilhaços. (C) Alta densidade vascular das papilas. (D) Área de hipogranulose, à esquerda, e área de hipergranulose, à direita. Hematoxilina & eosina 100×(C) e 400×(D).

(0.85MB).
Figura 10.

Psoríase ungueal. (A) Onicólise regular em todas as unhas, algumas com manchas de óleo, hiperceratose subungueal e distrofia total. (B) Exsudato de neutrófilos entre queratinócitos superficiais (seta vermelha); neutrófilos dentro da área paraceratótica (setas amarelas). Hematoxilina & eosina, aumento original de 400×.

(0.54MB).

Correlação clínico‐histopatológica completa foi encontrada em 75% (9/12) dos pacientes, taxa superior às já relatadas, seja em amostras obtidas por biopsia longitudinal ou por punch.5,6 Hanno et al. detectaram achados histomorfológicos que preenchiam os critérios para diagnóstico nosológico específico em apenas 40% dos casos estudados; dos seis pacientes com suspeita clínica de psoríase e dos sete sugestivos de líquen plano, os diagnósticos foram confirmados em apenas quatro e três pacientes, respectivamente,5 Grover et al. estudaram 22 pacientes com diagnóstico clínico de psoríase ungueal, coletaram amostras por meio de técnicas longitudinais e por punch e obtiveram correlação clínicopatológica de 54%.6 Talvez o maior índice de correlação clínico‐histopatológica nos pacientes do presente estudo tenha sido decorrente da maior amostragem na largura do tecido excisado, possibilitada pela ET, associada aos cuidados utilizados na técnica, desde a coleta da amostra até a análise histopatológica, além da inclusão de critérios histopatológicos adicionais.

Hanno et al. propuseram os critérios histopatológicos a serem considerados para o diagnóstico de psoríase ungueal.5 Hiperceratose, com paraceratose, exsudato seroso intracorneano, camada granulosa de espessura irregular e hiperplasia psoriasiforme da epiderme do leito ungueal, com dilatação dos vasos papilares foram descritos como critérios menores. O achado de neutrófilos na superfície do epitélio do leito, com escamas paraceratóticas aderidas à lâmina ungueal, foi considerado o critério maior. Para confirmar o diagnóstico de psoríase ungueal, seria necessário o critério maior, com ou sem um critério menor associado.5 Em 2005, Grover et al. propuseram um critério adicional: coloração PAS negativa para fungos.6 No entanto, a concomitância de psoríase ungueal e onicomicose é possível e já foi descrita.16 De fato, os agregados de neutrófilos parecem ser mais comuns na onicomicose e a paraceratose mais frequente na psoríase.17 Foi postulado que valorizar o exsudato de neutrófilos, como critério principal e obrigatório para o diagnóstico, pode ser o principal obstáculo para a melhor correlação clinicopatológica de estudos anteriores. Nas amostras analisadas, obteve‐se boa correlação clínico‐histopatológica ao utilizar os seguintes critérios:

  • Critério obrigatório: vasos papilares dérmicos dilatados (fig. 5);

  • Critérios secundários (pelo menos três): ausência de espongiose, presença de paraceratose, hiperplasia epidérmica psoriasiforme, adelgaçamento focal da camada granulosa e da epiderme suprapapilar e exsudato de neutrófilos intra ou subcorneano (figs. 5, 9 e 10).

A análise adicional da lâmina ungueal apoiou o diagnóstico de psoríase em três dos 12 casos e, em seis casos, a análise do tecido subungueal foi essencial para o diagnóstico. Desse modo, apenas a análise de um clipping ungueal seria insuficiente para o diagnóstico na maioria dos pacientes. Mesmo assim, enfatiza‐se que a lâmina ungueal deva ser analisada, pois pode fornecer informações adicionais, além de permitir a pesquisa fúngica (fig. 6).

Se os achados clínicos forem sutis, com pitting discreto, mancha salmão ou hiperceratose subungueal isolada, a análise histopatológica pode ser inconclusiva. Nesses casos, sugere‐se seguimento clínico e indicação de biopsia caso haja outros sinais clínicos associados.

Em pacientes com hiperceratose subungueal, a ET do leito ungueal deve ser um pouco mais profunda, pelo risco de não atingir a derme. Na matriz, a ET superficial é suficiente para obter amostragem adequada da derme papilar. Como muitos pacientes com psoríase ungueal apresentam achados clínicos mistos de envolvimento do leito e da matriz ungueal, é preferível e suficiente obter biopsia do leito ungueal.

Limitações

Em três dos 12 pacientes incluídos, as alterações clínicas e, consequentemente, histopatológicas das unhas foram sutis (um deles apenas mancha salmão com onicólise, outro hiperceratose subungueal com hemorragias em estilhaços e o último, pitting isolado). Além disso, em uma amostra de paciente obtida com ET, a papila dérmica não foi amostrada, embora tenham sido encontradas alterações histopatológicas suficientes na epiderme e na lâmina ungueal para chegar ao diagnóstico de psoríase.

Conclusão

A técnica da BT mostrou ser boa opção para o diagnóstico das principais doenças inflamatórias ungueais, pois com ela foram obtidas amostras maiores e mais finas, menor tempo de recuperação pós‐operatória e baixo risco de onicodistrofia. A ET possibilitou definir o diagnóstico, especialmente quando elementos clínicos suficientes estavam associados aos achados histomorfológicos.

Suporte financeiro

O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

Contribuição dos autores

Laura Bertanha: Participou da geração e análise dos dados; escreveu a maior parte do rascunho original do manuscrito, revisou os dados brutos pertinentes nos quais os resultados e conclusões desse estudo se baseiam e aprovou a versão final desse manuscrito.

Ingrid Iara Damas: Participou da geração dos dados, redação do manuscrito e aprovou a versão final desse manuscrito.

Rafael Fantelli Stelini: Participou da geração dos dados, redação do manuscrito, revisou os dados brutos pertinentes nos quais se baseiam os resultados e conclusões desse estudo e aprovou a versão final desse manuscrito.

Maria Letícia Cintra: Participou da concepção do estudo, geração e análise dos dados; redigiu o manuscrito e revisou os dados brutos pertinentes nos quais se baseiam os resultados e conclusões desse estudo e aprovou a versão final desse manuscrito.

Nilton Di Chiacchio: Participou da geração dos dados, redação do manuscrito, revisou os dados brutos pertinentes nos quais se baseiam os resultados e conclusões desse estudo e aprovou a versão final desse manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

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Como citar este artigo: Bertanha L, Damas II, Stelini RF, Cintra ML, Di Chiacchio N. Role of tangential biopsy in the diagnosis of nail psoriasis. An Bras Dermatol. 2024;99:696–705.

Trabalho realizado no Departamento de Anatomia Patológica, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil; Departamento de Dermatologia, Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

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