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Vol. 97. Núm. 5.
Páginas 676-681 (1 setembro 2022)
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Carta ‐ Investigação
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Síndrome de Melkersson‐Rosenthal em crianças e adolescentes: série de sete casos
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Camila Fátima Biancardi Gaviolia, Yasmin da Silva Amorim Cidadeb, Giovanna Piacenza Florezib, Silvia Vanessa Lourençob, Marcello Menta Simonsen Nicoa,
Autor para correspondência
mentanico@hotmail.com

Autor para correspondência.
a Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
b Departamento de Patologia, Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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A síndrome de Melkersson‐Rosenthal (SMR)/granulomatose orofacial é caracterizada pela tríade de edema orofacial recorrente, paralisia facial periférica recidivante e língua fissurada.1 A tríade é encontrada em 8 a 45% dos casos; a maioria dos pacientes se apresenta com formas oligossintomáticas ou monossintomáticas.1 A manifestação clínica mais comum é o edema labial (queilite granulomatosa).1 A doença afeta principalmente adultos jovens; casos pediátricos são raramente descritos. Uma série recente descreveu três casos e revisou 116 casos previamente publicados.2

A causa da SMR é desconhecida. Nosso grupo demonstrou um aumento na expressão de HLA A*02, HLA DRB1*11 a HLA DQB1*03 e diminuição nos níveis de HLA A*01, HLA DRB1*04, HLA DRB1*07 e HLADQB1*02 em pacientes com a SMR quando comparado ao grupo controle, indicando genes que podem predispor ou proteger contra a doença.3 Associação entre SMR e doença de Crohn (DC) é relatada por alguns autores.4

Os achados histopatológicos da SMR incluem granulomas não caseosos similares ao da DC, o que pode sugerir que a SMR e a DC possam fazer parte de um mesmo espectro clínicopatológico.1,4

Aqui apresentamos sete casos de SMR em crianças e adolescentes, chamado atenção para uma possível associação com DC.

Os dados analisados dos casos com diagnóstico de queilite granulomatosa/SMR/ granulomatose orofacial foram: sexo, idade, localização das lesões, comprometimento neurológico e exames de colonoscopia (figs. 1‐7 e tabela 1). A diagnose foi confirmada pelo estudo histopatológico.5

Tabela 1.

Características dos sete pacientes com SMR pediátrica

Caso/ sexo/ raça  Idade de início dos sintomas  Idade ao diagnóstico  Local de envolvimento  Envolvimento intraoral  Envolvimento da língua  Paralisia facial  Comprometimento sistêmico  Tratamento  Seguimento 
1/M/C  30 m  43 m  Lábio superior  Não  Não  Não  Colonoscopia normal  Talidomida, 50 mg/dia, boa resposta  2 a 
2/M/C  14 a  15 a  Lábio superior  Não  Não  Não  Colonoscopia normal  Dapsona, 100 mg/dia  Perdeu o seguimento 
3/M/C  11 a  12 a  Lábio superior e inferior  Não  Não  Não  Colonoscopia normal  Dapsona, 100 mg/dia, boa resposta  9 m 
4/M/C  10 a  11 a  Lábios, face  Gengivite granulomatosa  Língua geográfica  Não  Colonoscopia‐doença de Crohn aos 21 anos  Dapsona, 100 mg/dia (fracasso)  14 a 
                Talidomida, 100 mg/dia (fracasso)   
                Azatioprina, 150 mg/dia (boa resposta) gengivoplastia   
5/M/AB  8 a  9 a  Lábio superior e inferior  Não  Língua fissurada  Não  Convulsões não epilépticas  Talidomida, 100‐200 mg/dia (resultado pobre)   
              Colonoscopia normal  Triacinolona intralesional (fracasso) Três queiloplastias   
6/M/C  11 a  12 a    Gengivite granulomatosa  Língua geográfica e fissurada  Sim  Colonoscopia‐doença de Crohn aos 17 anos  Talidomida, 100 mg/dia, boa resposta  6 a 
7/F/Mu  15 a  16 a  Lábios e face  Gengivite e palatite granulomatosa  Língua fissurada  Não  Colonoscopia não realizada  Dapsona, 100 mg/dia  4 a 
                Prednisona, 40 mg/dia   
                Triacinolona intralesional (todas fracassaram)   

M, masculino; F, feminino; m, meses; a, anos; C, caucasiano; AB, afro‐brasileiro; Mu, mulato.

Esta série representa a maior casuística infantil de SMR da América Latina.6 Nosso grupo de doenças da mucosa oral realiza 900 consultas por ano e, durante um período de 20 anos, apenas cinco casos pediátricos de SMR foram vistos (casos 1 e 4 a 7); os casos 2 e 3 provinham da clínica privada de um dos autores.

Houve predomínio de doentes do sexo masculinos; a única doente do sexo feminino notou os sintomas aos 15 anos. Nos casos revisados por Savasta et al., houve prevalência do sexo feminino.2 O doente 1 é um dos indivíduos mais jovens já relatados (fig. 1A).

Figura 1.

Características clínicas dos casos 1 e 2. (A) Caso 1 ‐ macroqueilia. (B) Caso 2 ‐ macroqueilia.

(0.23MB).

Apenas o doente 6 relatava paralisia facial prévia, tendo apresentado também um episódio observado por nós. A paralisia facial afetou 61/116 (52,6%) de casos pediátricos previamente relatados.2 O doente 5 apresentou convulsões sem causa determinada; a equipe de neurologia as relacionou à SMR.1

Os casos 4, 5, 6 e 7 apresentavam língua fissurada; os casos 4 e 6 apresentavam língua geográfica – o caso 6 tinha língua fissurada concomitante (fig. 5A). Língua geográfica é caracterizada pela presença de áreas cambiantes de despapilação circundadas por uma borda serpinginosa. A histopatologia é idêntica à da psoríase, modernamente considerada manifestação mucosa dessa. Existe associação significativa entre psoríase e doença de Crohn.7 Em geral, língua fissurada ocorre em casos de língua geográfica persistente; os dois achados geralmente coexistem e representam o mesmo processo em diferentes fases.8

Figura 5.

(A) Caso 6 ‐ macroqueilia, língua geográfica e fissurada. (B) Mesmo paciente, aos 19 anos, durante um surto de paralisia facial; a macroqueilia já havia desaparecido.

(0.32MB).

Os casos 3 e 6 foram diagnosticados com DC, detectada muitos anos depois do diagnóstico de SMR, após o controle dos sintomas orofaciais. Nossa rotina de investigação na SMR atualmente inclui estudos colonoscópicos periódicos.

A associação entre a SMR e a DC é relatada.1 Nosso grupo publicou os resultados de um estudo com HLA em 36 casos adultos e pediátricos.3 Confirmamos a associação da SMR e a DC em cinco casos (todos apresentavam alelos de HLA da SMR e três apresentavam alelos da DC). Nossos resultados genéticos sugerem que SMR e DC sejam doenças distintas, mas que podem estar associadas.

Nenhum tratamento é eficaz em todos os casos de SMR; não há estudos controlados. Não há elementos clínicos que indiquem a eleição de uma determinada medicação. Acreditamos que o fármaco selecionado deve ser utilizado por pelo menos três meses antes de ser considerado falho, visto que a resposta é lenta. Temos preferido a talidomida, com base na experiência com adultos.9 Cinco pacientes receberam talidomida e dois receberam dapsona. Apenas um (caso 6) apresentou melhora importante com talidomida. O doente 1 está melhorando lentamente após um ano de seguimento. Os casos 4 e 5 melhoraram apenas quando se tornaram adultos, apesar de tratamentos com múltiplas substâncias. Não sabemos se a melhora ocorreu pela última substância utilizada ou espontaneamente. No caso 3 houve boa resposta à dapsona; algumas recidivas posteriores foram controladas com pequenos ciclos de corticoterapia oral (fig. 2). O caso 4, após várias tentativas, melhorou apenas com azatioprina e gengivoplastia (fig. 3 ). O caso 5 só melhorou com tratamento cirúrgico (fig. 4). A doente 7 foi refratária a todas as terapias e, após vários anos e crises, perdeu o seguimento (fig. 6). Não utilizamos imunobiológicos, apesar de haver fundamento para seu uso.9–11

Figura 2.

(A) Caso 3 ‐ macroqueilia. (B) Mesmo paciente durante o tratamento com dapsona: boa resposta.

(0.19MB).
Figura 3.

(A) Caso 4 ‐edema facial difuso. (B) Mesmo paciente, já adulto ‐ resolução completa do edema.

(0.3MB).
Figura 4.

(A) Caso 5 ‐ macroqueilia. (B) Mesmo paciente já adulto, após vários procedimentos cirúrgicos.

(0.33MB).
Figura 6.

(A) Paciente 7 ‐ macroqueilia associada a leve edema facial. (B) Mesma paciente durante uma crise grave que se mostrou resistente às terapias.

(0.24MB).

Tratamento cirúrgico é opção para doença localizada e refratária. No caso 5, três queiloplastias foram realizadas.

Os casos 4, 6 e 7 apresentavam infiltração granulomatosa gengival, raramente relatada.12 Essa manifestação deve ser ativamente pesquisada e tratada, pois pode levar a comprometimento periodontal. São lesões resistentes ao tratamento farmacológico; a gengivoplastia é uma excelente opção terapêutica (fig. 7).

Figura 7.

(A) Caso 4 ‐ gingivite granulomatosa.10 (B) Mesmo paciente após a gingivoplastia.

(0.33MB).

Em conclusão, à exceção do caso 2, todos os outros aqui apresentados foram seguidos por vários anos, salientando‐se a variabilidade da evolução e a dificuldade do manejo dessa doença.

Suporte financeiro

FAPESP – (2017/26990‐8) and FUNADERSP – (29/2016).

Contribuição dos autores

Camila Fátima Biancardi Gavioli: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Yasmin da Silva Amorim City: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura.

Giovanna Piacenza Florezi: Concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Silvia Vanessa Lourenço: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Marcello Menta Simonsen Nico: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
O.P. Hornstein.
Melkersson‐Rosenthal syndrome – A challenge for dermatologists to participate in the field of oral medicine.
[2]
S. Savasta, A. Rossi, T. Foiadelli, A. Licari, A.M.E. Perini, G. Farello, et al.
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C.F.B. Gavioli, M.M.S. Nico, N. Panajotopoulos, H. Rodrigues, C.B. Rosales, N.Y.S. Valente, et al.
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M. Lazzerini, M. Bramuzzo, A. Ventura.
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Como citar este artigo: Gavioli CFB, Cidade YSA, Florezi GP, Lourenço SV, Nico MMS. Melkersson‐Rosenthal syndrome in children and adolescents: a series of seven cases. An Bras Dermatol. 2022;97:676–81.

Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

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