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Vol. 95. Núm. 2.
Páginas 257-258 (Março - Abril 2020)
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Vol. 95. Núm. 2.
Páginas 257-258 (Março - Abril 2020)
Carta – Caso clínico
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Suspensão de células epidérmicas não cultivadas para o tratamento de vitiligo segmentar recalcitrante em paciente transplantado de órgão sólido
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Gerson Dellatorrea,
, Caio César Silva de Castroa,b
a Departamento de Dermatologia, Hospital Santa Casa de Misericórdia de Curitiba, Curitiba, PR, Brasil
b Escola de Medicina, Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR, Brasil
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Prezado Editor,

O vitiligo é doença adquirida da pigmentação caracterizada pela perda de melanócitos epidérmicos e que afeta 0,5% da população no Brasil.1

O vitiligo segmentar (VS) apresenta‐se como máculas e manchas acrômicas mais comumente distribuídas de forma unissegmentar, respeitam a linha média corporal.1 Caracteriza‐se pelo rápido início do quadro, pode apresentar resposta limitada aos tratamentos clínicos, principalmente se iniciados de forma tardia.2 Além disso, preocupações a respeito de carcinogênese induzida por ultravioleta em pacientes transplantados de órgãos sólidos (TOS) limitam o uso da fototerapia nessa população.3

É apresentado caso de VS em paciente TOS tratado cirurgicamente por meio de suspensão de células epidérmicas não cultivadas (SCENC), sem fototerapia adjuvante e com bom resultado terapêutico.

Paciente do sexo masculino, de 31 anos, com histórico de máculas e manchas acrômicas no braço esquerdo de distribuição segmentar. As lesões iniciaram havia cinco anos, quando o paciente estava em uso de interferon alfa‐2a peguilado devido à nefropatia por IgA associada à hepatite B. Após o diagnóstico de vitiligo segmentar, recebeu à época tratamentos tópicos com creme de dipropionato de betametasona 0,05% e pomada de tacrolimus 0,1% por quatro meses, sem melhora. O paciente também foi submetido a 85 sessões de fototerapia UVBnb, com apenas 25% de melhoria das lesões. Sua nefropatia apresentou piora e o paciente iniciou hemodiálise, seguida de transplante renal.

No momento da consulta, o paciente apresentava lesões acrômicas em distribuição blashckoide, clinicamente compatíveis com VS, estáveis havia 4 anos.

Devido ao risco de carcinogênese, tratamentos fototerápicos adicionais foram contraindicados e o procedimento de SCENC foi planejado. Inicialmente, um fino enxerto de pele parcial com 8 cm2 foi obtido sob anestesia local da porção medial da coxa esquerda do paciente, com o auxílio de uma lâmina da shaving. Após, o enxerto foi incubado a 37°C em solução de tripsina 0,25% com ácido etilenodiamino tetra‐acético (EDTA) por 50 minutos. Após separação da epiderme da derme com auxílio de pinça anatômica delicada, as células epidérmicas ficaram dispersas em solução salina. A solução foi então transferida a tubo de ensaio e, após centrifugação a 1.500 rpm, o concentrado celular (pellet) foi obtido.

A área receptora foi demarcada (fig. 1) e preparada por meio de dermoabrasão superficial sob anestesia local (lidocaína 1% sem vasoconstritor). O concentrado celular foi ressuspendido em 1,5 mL de solução salina e transferido à área receptora. Os curativos compostos por membrana de colágeno, gaze vaselinada, gaze comum e filme adesivo transparente foram posicionados sobre a área e mantidos intactos por sete dias.

Figura 1.

Manchas acrômicas com distribuição blaschkoide demarcadas no braço esquerdo (24 cm2).

No momento do procedimento, o paciente estava em uso de everolimus 1 mg/dia, tacrolimus 3 mg/dia e prednisona 10 mg/dia havia um ano. Devido à história de imunossupressão, antibiótico oral (cefadroxila 500 mg 2×/dia) foi mantido por sete dias após o procedimento. Fototerapia adjuvante pós‐operatória não foi feita.

Após três meses do procedimento, repigmentação difusa de 95% da área receptora começou a se tornar visível, ficou mais evidente após seis meses de pós‐operatório (figs. 2 e 3).

Figura 2.

Repigmentação em 95% da área receptora após seis meses com discreta hipocromia.

Figura 3.

Exame à lâmpada de Wood demonstra o padrão de repigmentação difusa.

As principais abordagens terapêuticas para VS incluem os corticoesteróides tópicos, imunomoduladores tópicos e a fototerapia. Embora a fototerapia seja considerada como primeira linha de tratamento no vitiligo,1 a resposta do VS a modalidades terapêuticas como a UVBnb é limitada. Um estudo coreano demonstrou que a taxas de repigmentação em pacientes com VS tratados com UVBnb variavam de 26,3% a 50%.2

Além disso, embora estudos com UVBnb não tenham demonstrado associação entre o tratamento e o surgimento de carcinomas queratinocíticos ou melanoma em pacientes imunocompetentes,4 atenção especial deve ser dada à população de TOS. Comparativamente com a população em geral, pacientes TOS apresentam susceptibilidade 65 a 250 vezes maior de desenvolver carcinomas espinocelulares.5

O paciente do presente relato apresentava lesões de vitiligo estáveis havia cinco anos. A estabilidade lesional é o principal critério na indicação do tratamento cirúrgico do vitiligo, uma vez que sua presença está diretamente relacionada com bons resultados terapêuticos.1 Em teoria, devido ao uso crônico de imunossupressores, a população de TOS tende a apresentar um quadro de vitiligo mais estável, o que os tornando bons candidatos ao procedimento cirúrgico.

Embora haja evidência que embase o uso de fototerapia pré e pós‐operatória para aprimorar resultados no tratamento cirúrgico do vitiligo, a técnica de SCENC em monoterapia pode ser considerada em situações nas quais a exposição ultravioleta esteja contraindicada.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Gerson Dellatorre: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Caio César Silva de Castro: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Conflitos de interesse

Nenhum.

Referências
[1]
R.G. Tarlé, L.M. Nascimento, M.T. Mira, C.C. Castro.
Vitiligo?part 1.
An Bras Dermatol., 89 (2014), pp. 461-470
[2]
J.H. Park, S.W. Park, D.Y. Lee, J.H. Lee, J.M. Yang.
The effectiveness of early treatment in segmental vitiligo: retrospective study according to disease duration.
Photodermatol Photoimmunol Photomed., 29 (2013), pp. 103-105
[3]
A. Mittal, O.R. Colegio.
Skin Cancers in Organ Transplant Recipients.
Am J Transplant., 70 (2017), pp. 2509-2530
[4]
M. Rodrigues.
Skin Cancer Risk (Nonmelanoma Skin Cancers/Melanoma) in Vitiligo Patients.
Dermatol Clin., 35 (2017), pp. 129-134
[5]
F.J. Moloney, H. Comber, P. O’Lorcain, P. O’Kelly, P.J. Conlon, G.M. Murphy.
A population‐based study of skin cancer incidence and prevalence in renal transplant recipients.
Br J Dermatol., 154 (2006), pp. 498-504

Como citar este artigo: Dellatorre G, Silva de Castro CC. Noncultured epidermal cell suspension for the treatment of recalcitrant segmental vitiligo in a solid‐organ transplant recipient. An Bras Dermatol. 2020;95:257–8.

Trabalho realizado na Clínica Tarlé, Curitiba, PR, Brasil.

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