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Vol. 98. Núm. 4.
Páginas 526-528 (1 julho 2023)
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Cartas ‐ Investigação
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Uso da ciclosporina em crianças e adolescentes com dermatite atópica moderada a grave: experiência clínica em hospital terciário
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Carolina Contin Proença
Autor para correspondência
carolcontin@hotmail.com

Autor para correspondência.
, Silvia Assumpção Soutto Mayor, Thais Storni Ragazzo, Sandy Daniele Germano Munhoz, Carolina Gadelha Pires
Clínica de Dermatologia da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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Tabelas (1)
Tabela 1. Valores descritivos do SCORAD pré‐ e pós‐tratamento
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Prezado Editor,

Dermatite atópica (DA) é uma das dermatoses mais comuns na faixa etária pediátrica e sua prevalência tem aumentado nos últimos anos em todo o mundo.1 Numa revisão sistemática, a prevalência chegou a 22,6% nas crianças e até 17% em adolescentes e adultos.2

Barreira cutânea disfuncional, resposta inflamatória com predomínio do padrão Th2 e microbioma alterado fazem parte da etiopatogenia. Infecções bacterianas e virais são frequentes. Nos casos moderados e graves, o uso de imunossupressores sistêmicos é necessário.3

A gravidade da DA pode ser medida por meio de escalas, como SCORAD (Severity Scoring of Atopic Dermatitis Index). Pontuação de 0 a 28 corresponde à DA leve, de 29 a 48 à DA moderada e de 49 a 103, DA grave.4 Associação positiva entre DA e depressão grave em adolescentes tem sido descrita. A melhora clínica pós‐tratamento parece reduzir esse risco.5

No tratamento dos casos graves, corticosteroides sistêmicos, ciclosporina A, metotrexato, fototerapia e medidas para restauração da barreira cutânea, como hidratantes e emolientes, são utilizados.1,3 A ciclosporina é aprovada em muitos países da Europa e no Brasil para DA grave em adultos; pode ser usada em crianças e adolescentes com DA grave e refratária (off label).5 A dose utilizada é de 3 a 5 mg/kg/dia. Na literatura, há relatos de doses iniciais até 7 mg/kg/dia, reduzidas gradualmente até 3 mg/kg/dia (dose de manutenção) por períodos de até dois anos.1,6

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), aprovou o uso da ciclosporina para tratamento da DA grave em adultos, mas ela não é disponibilizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o que dificulta o acesso ao medicamento.

Realizamos um estudo retrospectivo observacional, por meio da revisão dos prontuários e registros fotográficos de 16 pacientes entre 5 e 19 anos (média de 11,94 anos com desvio‐padrão de 4,37 e mediana de 12 anos), diagnosticados com DA moderada a grave, acompanhados no Ambulatório de Dermatologia Pediátrica, de hospital terciário de referência na cidade de São Paulo, entre 2011 e 2021.

Os pacientes incluídos usaram a ciclosporina A, em média 3 mg/kg/dia, por período mínimo de seis meses. Resposta terapêutica, efeitos colaterais da medicação e comorbidades preexistentes não atópicas, como depressão, foram avaliados.

Dezesseis pacientes foram incluídos: nove (56,3%) do sexo feminino e sete (43,8%) do sexo masculino. Quatorze (87,5%) apresentaram ao menos uma internação hospitalar, e 6,3% foram internados seis vezes em decorrência de infecções cutâneas secundárias dos tipos bacteriana e viral, o que poderia estar relacionado ao tratamento com a ciclosporina.

Na tabela 1, a pontuação do SCORAD pré e pós‐tratamento com ciclosporina demonstra decréscimo significante do SCORAD após o tratamento (p=0,001).

Tabela 1.

Valores descritivos do SCORAD pré‐ e pós‐tratamento

Momento  Média  DP  Mínimo  Máximo 
Pré  16  69,54  12,10  50,00  95,00 
Pós  16  38,25  13,28  22,10  79,55 

p*=0,001 (*) Nível descritivo de probabilidade do teste não paramétrico de Wilcoxon.

Na figura 1 estão os valores de média e desvio‐padrão do SCORAD antes e após o uso da ciclosporina. A duração do tratamento variou de 1 a 30 meses (média de 11,73 meses, com desvio‐padrão de 7,06 meses e mediana de 11 meses). Três pacientes (18,8%) interromperam o tratamento: um por infecção cutânea bacteriana, um por transplante hepático decorrente de hepatopatia autoimune não relacionada à ciclosporina e outro por motivo desconhecido. Sete pacientes (43,8%) apresentaram efeitos colaterais: quatro (25%) hipertricose e três (18,7%) infecção cutânea dos tipos bacteriana e viral. Efeitos adversos potencialmente graves, como aumento da creatinina sérica e hipertensão arterial isolada, mais comuns em adultos,7,8 não foram evidenciados neste estudo.

Figura 1.

Valores de média e desvio‐padrão do SCORAD nos momentos pré e pós.

(0.07MB).

Harper et al. descreveram alterações transitórias nos níveis séricos de creatinina em quatro crianças, com normalização espontânea ou logo após a redução da dose da ciclosporina. Apesar de serem efeitos colaterais mais comuns no adulto, o monitoramento da pressão arterial e da função renal deve ser realizado quando se utiliza a ciclosporina na população pediátrica.6,7

O delta de variação percentual do SCORAD (valor pós – valor pré/valor pré*100) encontra‐se entre76,11% a 11,18% (média de ‐43,71% com desvio‐padrão de 19,95% e mediana de49,28%).

Houve redução acima de 30% do SCORAD em 75% dos pacientes tratados com ciclosporina A, o que demonstra eficácia terapêutica. Dados semelhantes foram relatados na literatura.7,9,10

Não houve correlação significante entre o tempo de duração do tratamento e o delta de variação do SCORAD (coeficiente de correlação de Spearman: r=0,035; p=0,896).

Os grupos com e sem efeito colateral não apresentaram diferença relevante em relação ao delta de variação do SCORAD.

Ocorrência de malignidade (linfomas e carcinoma espinocelular) pode estar associada ao emprego de altas doses de ciclosporina em pacientes transplantados, e também ao uso da ciclosporina em psoriásicos já tratados com metotrexato e/ou com fototerapia.8 Nenhum caso de malignidade associado ao uso da ciclosporina foi observado neste estudo e nem outro semelhante na literatura.8

Entre as comorbidades presentes pré‐tratamento com ciclosporina, a depressão, diagnosticada por psiquiatra, foi constatada em 43,8% dos pacientes.

Apesar de mais frequente nos pacientes adultos com DA moderada e grave, crianças e adolescentes com DA têm apresentado quadros graves de depressão e outros distúrbios psiquiátricos.5 Mais estudos com a população pediátrica são necessários para elucidar a correlação de doenças psiquiátricas e dermatite atópica.

O uso da ciclosporina A no tratamento das formas moderadas e graves de DA em adultos é eficaz e bem documentado na literatura. Faltam estudos na população pediátrica no Brasil.

O presente estudo nos permitiu concluir que a ciclosporina foi eficaz e bem tolerada no tratamento de crianças e adolescentes com DA moderada/grave, na dose de 3 a 5 mg/Kg/dia.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Carolina Contin Proença: Aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Silvia Assumpção Mayor: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Thaiz Storni Ragazzo: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Sandy Daniele Germano Munhoz: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Carolina Gadelha Pires: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
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Como citar este artigo: Proença CC, Mayor SA, Ragazzo TS, Munhoz SD, Pires CG. Use of cyclosporine in children and adolescents with moderate to severe atopic dermatitis: clinical experience in a tertiary Hospital. An Bras Dermatol. 2023;98:526–8.

Trabalho realizado na Clínica de Dermatologia da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

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