Dermatite atópica (DA) é condição dermatológica crônica, inflamatória e pruriginosa que afeta milhões de pessoas em todo o mundo.1 O cenário de tratamento para DA moderada a grave evoluiu significantemente nos últimos anos com o advento de novas terapias biológicas, incluindo traloquinumabe. Traloquinumabe é anticorpo monoclonal IgG4 aprovado para o tratamento de DA moderada a grave em adultos e adolescentes. Ele se liga especificamente à interleucina 13 (IL‐13), inibindo sua interação com seus receptores.2–4 Apesar de sua eficácia, a natureza emergente dessas terapias imunomoduladoras levanta questões sobre sua segurança e eficácia em populações com infecções crônicas, como o vírus da hepatite B (VHB), visto que esses pacientes são frequentemente excluídos de ensaios clínicos em virtude do risco de reativação. Embora relatos de casos isolados sugiram que o dupilumabe pode ser seguro em pacientes com VHB crônico, não há dados específicos sobre o traloquinumabe.5 Apresenta‐se aqui o primeiro caso documentado de uma paciente com DA moderada a grave e infecção crônica por VHB tratada com traloquinumabe.
Paciente do sexo feminino, de 77 anos, com 30 anos de história de infecção crônica por VHB não tratada, apresentou‐se ao Departamento de Dermatologia com lesões eritematosas intensamente pruriginosas nos últimos três anos. A paciente, originária das Filipinas, apresentava histórico de rinite alérgica e eczema flexural na infância. Desde então, seu eczema permaneceu razoavelmente bem controlado, com exacerbações ocasionais de lesões pruriginosas, que ela controlava com corticosteroides tópicos prescritos por seu clínico geral. Com base nos critérios diagnósticos de Hanifin e Rajka,6 ela foi diagnosticada com DA. A paciente havia recebido até 48 sessões de fototerapia UVB de banda estreita (dose cumulativa: 43,567mJ/cm2) e tratamentos de curta duração com corticosteroides em altas doses durante as exacerbações da doença, com resposta parcial.
Ao exame físico, placas eritemato‐acastanhadas com superfície escamosa foram observadas predominantemente nos flancos e aspectos laterais das extremidades superiores e inferiores (fig. 1A). O Eczema Area and Severity Index (EASI) foi de 31, e a área de superfície corporal afetada foi de 21%. Foi realizada biopsia de pele, revelando acantose irregular com espongiose e eosinófilos ocasionais. A imunofluorescência direta (IFD) da pele sadia foi negativa.
(A) Apresentação clínica basal antes do início do traloquinumabe. Placas eritemato‐acastanhadas em paciente fototipo IV, distribuídas simetricamente principalmente nos flancos, tórax e parte anterior das coxas. (B) Apresentação clínica após seis meses de traloquinumabe. Atenuação das lesões com diminuição das bordas bem definidas.
A avaliação laboratorial inicial revelou evidências de infecção crônica por HBV minimamente replicativa, com anticorpos HBsAg, anti‐HBc e anti‐HBe positivos, mas HBeAg e anti‐HBs negativos. A carga viral era de 1112 UI/mL. A lactato desidrogenase (LDH) sérica estava elevada em 377 UI/L (faixa de referência [RR] 135‐214 UI/L), e a IgE total era> 5.000 KU/L (RR 0‐100), enquanto outros parâmetros laboratoriais, incluindo enzimas hepáticas e anticorpos anti‐BP180, anti‐BP230, anti‐DG1 e anti‐DG3, foram negativos ou estavam dentro dos limites normais. A imunofenotipagem do sangue periférico não mostrou populações celulares anormais. Os testes para outros vírus hepatotrópicos foram negativos, e a ultrassonografia abdominal descartou lesões hepáticas.
Dada a falta de resposta às abordagens terapêuticas iniciais e a progressão clínica da doença, a intensificação do tratamento foi considerada necessária. Após consulta com a equipe de hepatologia, foi iniciado entecavir 0,5mg/dia para controlar a replicação viral, e o uso de tratamentos imunossupressores, como a ciclosporina, foi desencorajado. Posteriormente, foi iniciada terapia com traloquinumabe na dose de 300mg a cada duas semanas.
Nos meses seguintes, a paciente apresentou melhora clínica significante, com redução acentuada do prurido e das lesões, levando a um escore EASI de 3 no sexto mês de tratamento (fig. 1B). A terapia foi bem tolerada, sem relatos de efeitos adversos. A função hepática permaneceu estável, e a carga viral do VHB diminuiu para <10 UI/mL durante esse período.
Este é o primeiro caso documentado da segurança do traloquinumabe em paciente com infecção crônica ativa pelo VHB e DA moderada a grave. Relatos anteriores se concentraram no dupilumabe em contextos semelhantes. Karen Ly e Mary Patricia Smith descreveram dois pacientes com DA e infecção crônica pelo VHB tratados com dupilumabe e entecavir concomitantes.7 Em um caso, a carga viral do VHB já era indetectável no início do tratamento com dupilumabe, enquanto no outro, a carga viral diminuiu de 19.120 UI/mL para indetectável antes do início da terapia. Matsutani e Imai conduziram um estudo observacional envolvendo cinco pacientes com anticorpos anti‐HBc positivos e sem vacinação prévia contra o VHB que receberam dupilumabe. Entre estes, apenas um paciente apresentou DNA do VHB transitoriamente detectável na semana 76 (< 1,30 log UI/mL), que se resolveu espontaneamente.8 No entanto, todos os pacientes eram HBsAg‐negativos no início do tratamento e nenhum apresentava infecções ativas ou agudas por VHB.
O presente caso oferece informações únicas, pois envolve uma paciente com infecção crônica ativa por VHB, não tratada. A combinação de entecavir e traloquinumabe demonstrou segurança, sem evidência de exacerbação do VHB durante o tratamento.
Este caso destaca a segurança potencial do traloquinumabe em pacientes com infecção crônica ativa por VHB e DA. Embora mais estudos sejam necessários para validar esses achados, este relato ressalta a importância de abordagens individualizadas no manejo de pacientes com infecções crônicas e doenças inflamatórias de pele concomitantes.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresMaría Olivares‐Guerrero: Concepção; redação e edição.
Ana Jiménez‐Sánchez: Revisão; validação.
Mario Aparicio‐Domínguez: Revisão; validação.
Pablo Chicharro: Supervisão; análise; validação; revisão final e aprovação do manuscrito.
Disponibilidade de dados de pesquisaNão se aplica.
Conflito de interessesPablo Chicharro participou de conselhos consultivos, simpósios e ensaios clínicos organizados pelas seguintes empresas: Janssen Pharmaceuticals, Almirall, La Roche‐Posay, Sanofi Genzyme, Lilly, AbbVie, Novartis, Leo Pharma e Pfizer‐Wyeth. Os demais autores declaram não haver conflito de interesses.
EditorLuciana P. Fernandes Abbade.
Como citar este artigo: Olivares‐Guerrero M, Jiménez‐Sánchez A, Aparicio‐Domínguez M, Chicharro P. Effectiveness and safety of tralokinumab in a patient with severe atopic dermatitis and hepatitis B virus. An Bras Dermatol. 2025;100:501239.
Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Hospital Universitario de La Princesa, Madri, Espanha.


