Compartilhar
Informação da revista
Vol. 94. Núm. 5.
Páginas 590-593 (1 setembro 2019)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
16056
Vol. 94. Núm. 5.
Páginas 590-593 (1 setembro 2019)
Dermatopatologia
Open Access
Sebaceoma do couro cabeludo que simula neoplasia maligna pigmentada
Visitas
16056
Bárbara Catojo Poggia,
Autor para correspondência
baby_poggi@hotmail.com

Autor para correspondência.
, Daniel Fernandes Melob, Juliana Marques da Costac, Maria Auxiliadora Jeunon Sousad
a Departamento de Dermatologia, Hospital Naval Marcílio Dias, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
b Programa de Pós‐Graduação em Ciências Médicas, Hospital Universitário Pedro Ernesto, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
c Setor de Dermatologia Oncológica e Dermatoscopia, Departamento de Dermatologia, Hospital Naval Marcílio Dias, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
d ID – Investigação em Dermatologia, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Resume
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (5)
Mostrar maisMostrar menos
Resumo

A correta identificação das lesões nodulares pigmentadas do couro cabeludo muitas vezes representa um verdadeiro desafio. Embora os padrões clínicos sejam relevantes e a dermatoscopia seja uma importante ferramenta auxiliar, por vezes sua interpretação é difícil e não conclusiva. Este trabalho discute um caso de sebaceoma que simula uma neoplasia maligna pigmentada com histopatologia conclusiva.

Palavras‐chave:
Adenoma
Dermoscopia
Glândulas sebáceas
Histologia
Melanoma
Neoplasias
Neoplasias cutâneas
Neoplasias das glândulas sebáceas
Texto Completo
Introdução

O diagnóstico das lesões nodulares pigmentadas do couro cabeludo pode representar um desafio. A clínica e a dermatoscopia são importantes na suspeição de lesões melanocíticas malignas, mas a histopatologia mantém seu papel fundamental na conclusão diagnóstica, uma vez que lesões de outra natureza podem simulá‐las.

Relato do caso

Paciente do sexo feminino, 80 anos, fototipo II de Fitzpatrick, com antecedente de câncer de endométrio, desenvolveu lesão assintomática nodular e enegrecida com base eritematosa e crosta central no vértice do couro cabeludo (fig. 1). À dermatoscopia, observa‐se área eritematoamarelada, glóbulos amarelados, crosta hemática, área vermelho‐leitosa e vasos polimorfos, que sugere ceratose seborreica, tumor de anexo ou nevo melanocítico traumatizado (fig. 2). A presença de véu azul‐esbranquiçado, área branca brilhante, aberturas foliculares assimétricas e estruturas romboidais não possibilitou exclusão da possibilidade de melanoma cutâneo (fig. 2). Foi feita biópsia excisional e o exame histopatológico evidenciou proliferação constituída por grandes massas de células basaloides e células sebáceas, dispostas de forma circunscrita, com a conclusão diagnóstica de sebaceoma.

Figura 1.

Nódulo enegrecido com base eritematosa e crosta central no vértice do couro cabeludo.

(0.13MB).
Figura 2.

À dermatoscopia, observa‐se crosta hemática e zona periférica eritematosa com glóbulos mal definidos.

(0.13MB).
Discussão

O sebaceoma já foi chamado de sebomatrixoma ou epitelioma sebáceo, e o termo epitelioma sugere malignidade. Classificado por Troy e Ackerman em 1984 como neoplasia benigna com diferenciação sebácea, acomete mais frequentemente mulheres, com predomínio na oitava década de vida.1

Clinicamente, manifesta‐se como tumoração exofítica hemisférica amarelada ou alaranjada, solitária ou raramente múltipla, localizada nas áreas seborreicas do corpo, sobretudo no couro cabeludo.1,2

A dermatoscopia do sebaceoma pode apresentar área amorfa eritematoamarelada com ou sem ulcerações, vasos arboriformes que se ramificam de forma centrípeta. A área amorfa eritematoamarelada pode ser um achado importante que sugere a natureza sebácea da lesão.3,4

Diversos tumores benignos de anexos apresentam‐se como lesão única inespecífica e, por isso, necessitam do exame histopatológico para o diagnóstico definitivo. Há tumores para os quais não se suspeita de malignidade, por se situarem mais profundamente na derme, podendo assemelhar‐se a cistos. Por outro lado, os tumores benignos conectam‐se à epiderme ou a rechaçam, facilitam as ulcerações traumáticas e, com isso, simulam malignidade.5,6

Tumores benignos e malignos são identificados pelo tipo de diferenciação que exibem, remanescentes de suas células de origem, embora nos tumores malignos não exista a riqueza de achados que as variantes benignas mostram. Em relação aos tumores sebáceos, os sinais de diferenciação são células sebáceas e ductos sebáceos (fig. 3).5

Figura 3.

Sebaceoma. Neoplasia epitelial assimétrica disposta em “v”, cujo vértice aponta para a profundidade. Há área de acantose à esquerda e predomínio de massas dérmicas à direita, que conferem assimetria intrínseca ao conjunto, característica pouco usual para esse tipo de proliferação. As massas têm formas e tamanhos regulares, predominantemente arredondadas ou ovais, e estão imersas em estroma colagenizado. Nesse aumento panorâmico já são percebidos grupamentos de células epiteliais de citoplasma pálido que permeiam as massas, representativas de sebócitos maduros (hematoxilina & eosina, 20×).

(0.06MB).

A glândula sebácea é composta por vários lóbulos que desembocam em um ducto conectado ao folículo piloso. Há uma única fileira de células indiferenciadas na periferia e células com graus crescentes de diferenciação por síntese de gordura até constituírem o sebócito com o núcleo chanfrado pelas várias depressões causadas pelos grandes vacúolos gordurosos. Na proximidade do ducto, as células sebáceas perdem o núcleo e é eliminada a secreção sebácea dita, por isso, holócrina.

Os sebaceomas são constituídos por maciços celulares localizados na derme, conectados ou não à epiderme, com arquitetura histológica que sugere benignidade: contornos arredondados, maior eixo vertical e simetria, diferente dos carcinomas sebáceos, apesar da eventual presença de mitoses (fig. 3). São compostos por células indiferenciadas e por células com diferentes graus de diferenciação sebácea. A ausência de paliçada periférica e de fendas entre os agregados e o estroma possibilita distingui‐los dos carcinomas basocelulares com diferenciação sebácea.5,6

O que diferencia o adenoma sebáceo do sebaceoma é o arranjo celular e a proporção entre as células indiferenciadas, mais numerosas nos sebaceomas. No adenoma sebáceo, a disposição dessas últimas na periferia dos agregados e as com algum grau de diferenciação na porção central remetem à glândula sebácea normal, o que facilita sua identificação. Diferentemente da glândula normal, são várias as camadas de células indiferenciadas periféricas. A proliferação substitui a epiderme e secreta para a superfície, em vez de drenar para o canal folicular através do ducto sebáceo, por onde o sebo da glândula normal atinge a superfície.

No sebaceoma, com os dois tipos de células dispostos de maneira desordenada, é necessária a busca dos sebócitos – e eles podem ser esparsos – com diferenciação mais avançada. Em contrapartida, os ductos sebáceos, ausentes nos adenomas, estão presentes nos sebaceomas e servem como pista para a busca ativa do sebócito.

Mesmo que o adenoma sebáceo tenha as características arquiteturais e citológicas mais próximas da glândula normal, ele foi considerado por alguns autores como um segundo tipo de carcinoma sebáceo, pela presença de empilhamento celular e figuras de mitose nas células periféricas indiferenciadas.6,7

Na distinção entre as neoplasias benignas e malignas, o grau de diferenciação celular é considerado critério muito importante; as malignas são menos diferenciadas, já que a divisão celular é maior nas células indiferenciadas. Diferenciação avançada e malignidade são conceitos opostos. Nos tumores sebáceos, os sinais de diferenciação são as células sebáceas e os ductos sebáceos (fig. 4).6

Figura 4.

Sebaceoma. Detalhe de massas epiteliais dispostas em meio à derme. Nota‐se predomínio de células de núcleos redondos vesiculosos e de citoplasma escasso (sebócitos imaturos), permeadas, em menor número, por células de citoplasma pálido que contêm múltiplos vacúolos lipídicos, algumas com núcleos chanfrados (sebócitos maduros), dispostas aleatoriamente e associadas a esboço de ductos. Ausência de paliçada na periferia das massas (hematoxilina & eosina, 200×).

(0.16MB).

É possível supor que a secreção dos adenomas sebáceos, livremente eliminada na superfície, não sofra o efeito de uma compressão retrógrada, como deve ocorrer com o passar do sebo por um ducto estreito na glândula normal. É uma especulação julgar que a secreção retida até sua eliminação seja fator que iniba a divisão celular e sua ausência nos adenomas sebáceos favoreça a proliferação celular. É bom lembrar que, nos bulbos pilosos de folículos anagênicos que produzem uma haste de pelo continuamente a um ritmo razoável, também ocorre empilhamento celular e mitoses.

A imuno‐histoquímica evidencia no sebaceoma positividade multifocal das células neoplásicas nas reações com os anticorpos anti‐CK7 e anti‐EMA e negatividade nas reações com os anticorpos anti‐CK20 e anti‐BerEp4 (fig. 5).

Figura 5.

Positividade na reação imuno‐histoquímica com o anticorpo anti‐EMA em padrão reticular citoplasmático ao redor dos vacúolos lipídicos (aumento original de 400×).

(0.1MB).

A presença de neoplasias com diferenciação sebácea ou de múltiplos ceratoacantomas pode ser reveladora da síndrome de Muir Torre, constituída por adenocarcinomas viscerais localizados principalmente no trato gastrintestinal, genitourinário, endométrio e laringe. Acomete predominantemente homens na quinta década de vida. O rastreio clínico é obrigatório, como no caso da paciente em questão.8,9

Considerações finais

O diagnóstico das lesões nodulares pigmentadas do couro cabeludo é desafiador. A dermatoscopia é uma excelente ferramenta para a definição desses casos, pois apresenta padrões bem estabelecidos para o diagnóstico das lesões tumorais, pigmentadas ou não. Entretanto, não substitui o exame histopatológico, que foi fundamental para a caracterização da natureza sebácea dessa neoplasia.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Bárbara Catojo Poggi: elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados.

Daniel Fernandes Melo: aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Juliana Marques da Costa: aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Maria Auxiliadora Jeunon Sousa: aprovação da versão final do manuscrito; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Agradecimentos

À contribuição de grande valor da Dra. Thais Roberta Ura Garcia e do Dr. Thiago Jeunon de Sousa Vargas, cujas participações foram fundamentais para a conclusão do artigo.

Referências
[1]
C.E.F. Murcia, A. Sehtman, J. Martinez, V. Gonzalez, M.A. Juarez, M. Allevato, et al.
Sebaceoma‐epitelioma sebáceo.
Arch Argent Dermatol., 60 (2010), pp. 233-237
[2]
K. Flux.
Sebaceous Neoplasms.
Surg Pathol Clin, 10 (2017), pp. 367-382
[3]
R. Coppola, M. Carbotti, S. Zanframundo, M.V. Rinati, A. Graziano, V. Panasiti.
Use of dermoscopy in the diagnosis of sebaceoma.
J Am Acad Dermatol., 72 (2015), pp. e143-e145
[4]
A. Laureano, C. Fernandes, J. Cardoso.
Morfologia e Padrões Vasculares em Dermatoscopia – Parte II. Prática Clínica.
Revista da Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia., 72 (2014), pp. 307-324
[5]
N. Misago, I. Mihara, S. Ansai, Y. Narisawa.
Sebaceoma and related neoplasms with sebaceous differentiation: a clinicopathologic study of 30 cases.
Am J Dermatopathol., 24 (2002), pp. 294-304
[6]
A.B. Ackerman, S. Nussen-Lee, M.A. Tan.
Histopathologic Diagnosis of Neoplasms with Sebáceos Differentation: Atlas and text.
2nd ed., Ardor Scribend, (2009), pp. 156-169
[7]
A.B. Ackerman, Lee. Nussen.
Neoplasms in all organs of Muir‐Torre syndrome are carcinomas. Sebaceous carcinomas and squamous‐cell carcinomas (keratoacanthomas) in the skin and adenocarcinomas, squamous‐cell carcinomas, and transitional‐cell carcinomas in internal organs.
Dermatopathol Pract Concept., 5 (1999), pp. 312-318
[8]
B.M. Rodrigues dos Santos, S.A. da Conceição, D. Fontes, J.C.C.G. de Andrade Júnior, D.C. de Andrade, A. Lacerda Filho.
Síndrome de Muir‐Torre: relato de caso.
Rev Bras Colo‐Proctol., 22 (2002), pp. 260-263
[9]
R.A. Schwartz, D.P. Torre.
The Muir‐Torre syndrome: a 25‐year retrospect.
J Am Acad Dermatol., 33 (1995), pp. 90-104

Como citar este artigo: Poggi BC, Melo DF, Costa JM, Sousa MAJ. Sebaceoma on the scalp simulating a malignant pigmented neoplasia. An Bras Dermatol. 2019;94:590–3.

Trabalho realizado no Hospital Naval Marcílio Dias, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Baixar PDF
Idiomas
Anais Brasileiros de Dermatologia (Portuguese)
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Cookies policy Política de cookies
To improve our services and products, we use "cookies" (own or third parties authorized) to show advertising related to client preferences through the analyses of navigation customer behavior. Continuing navigation will be considered as acceptance of this use. You can change the settings or obtain more information by clicking here. Utilizamos cookies próprios e de terceiros para melhorar nossos serviços e mostrar publicidade relacionada às suas preferências, analisando seus hábitos de navegação. Se continuar a navegar, consideramos que aceita o seu uso. Você pode alterar a configuração ou obter mais informações aqui.