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Vol. 100. Núm. 5.
(setembro - outubro 2025)
Cartas ‐ Caso clínico
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Síndrome da encefalopatia posterior reversível em paciente tratado com ustequinumabe
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Marilda Aparecida Milanez Morgado de Abreua,
, Naíra M. de A. Guareseminb, Murilo de Oliveira Lima Carapebaa
a Departamento de Dermatologia, Hospital Regional de Presidente Prudente, Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente, SP, Brasil
b Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem, Hospital Rio Preto, São José do Rio Preto, SP, Brasil
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Tabela 1. Características dos casos de síndrome de encefalopatia posterior reversível (PRES) associada ao ustequinumabe relatados na literatura
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Prezado Editor,

O ustequinumabe, anticorpo monoclonal direcionado à subunidade p40da interleucina (IL) 12 e IL‐23, é tratamento seguro e eficaz para a psoríase.1 Embora a maioria dos pacientes não apresente efeitos adversos graves, algumas condições neurológicas foram relatadas.2–6

Relatamos um caso da síndrome de encefalopatia posterior reversível (PRES) pelo ustequinumabe. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, n° 78147224.3.0000.5515, e o paciente assinou o termo de consentimento livre e esclarecido.

Paciente do sexo masculino, de 47 anos, com psoríase vulgar havia 20 anos, apresentava placas eritematodescamativas ocupando 28% da superfície corporal, com Índice de Área e Gravidade da Psoríase (PASI) de 24,4. Antecedentes de alcoolismo, esteatose hepática grau II e hipertensão arterial controlada. Evoluiu com progressão da doença, intolerância prévia ao metotrexato e sem resposta à acitretina.

Optamos por iniciar ustequinumabe, 90mg (dose ajustada ao peso >100kg), nas semanas 0 e 4, por via subcutânea, e manutenção a cada 12 semanas. Após a segunda dose (semana 6), o paciente desenvolveu subitamente confusão mental. Foi internado, suspenso o ustequinumabe pela suspeita de ser o responsável, e tratado com risperidona, anti‐hipertensivos, prometazina e lactulona. No terceiro dia, apresentou cefaleia e tetraparesia.

Ressonância magnética (RM) encefálica revelou na substância branca periventricular e subcortical dos lobos frontal e parietal pequenos focos de hipersinal bilaterais nas imagens de recuperação da inversão atenuada por fluido (FLAIR) e nas imagens da sequência ponderada por difusão (DWI); e focos de hipersinal na reconstrução dos mapas de coeficiente de difusão aparente (ADC), caracterizando restrição à mobilidade das moléculas de água, consistente com restrição verdadeira causada por focos isquêmicos (fig. 1). Os achados foram consistentes com o diagnóstico de PRES. Investigações laboratoriais descartaram infecções e doenças metabólicas ou inflamatórias, como as autoimunes, sendo impossível descartar a ocorrência de epifenômeno.

Figura 1.

Ressonância magnética encefálica. (A) FLAIR (recuperação da inversão atenuada por fluido) mostrando pequenos focos de hipersinal localizados na substância branca periventricular e subcortical dos lobos frontal e parietal bilaterais. (B) Imagem ponderada em difusão (DWI) mostrando hipersinal dos focos puntiformes vistos em FLAIR, o que sugere edema citotóxico. (C) MAPA coeficiente de difusão aparente (ADC) confirma os achados da difusão, mostrando difusão restrita.

Os sintomas neurológicos reverteram com medidas de suporte e o paciente recebeu alta hospitalar no 10° dia com cloridrato de memantina oral.

RM encefálica três meses após revelou os mesmos focos de hipersinal em FLAIR, sem alterações nas sequências DWI e mapa ADC, correspondentes a pequenas áreas de gliose (cicatrizes).

Um ano depois, o paciente apresentava PASI zero, sem déficits neurológicos.

Os imunobiológicos representam um avanço no tratamento da psoríase e são cada vez mais utilizados.1 Foram relatados efeitos colaterais graves, principalmente com os anti‐TNF‐α. O ustequinumabe, embora seguro, também pode causar reações graves, incluindo complicações neurológicas, como PRES (tabela 1).1–6 Este é o primeiro caso documentado no Brasil e o sétimo no mundo. O desenvolvimento de PRES pode ocorrer logo após a indução,4,6 como neste caso, ou após anos de uso de ustequinumabe.2,3,5

Tabela 1.

Características dos casos de síndrome de encefalopatia posterior reversível (PRES) associada ao ustequinumabe relatados na literatura

Autores / Ano  Idade/sexo  Dose  Tempo de tratamento ao início dos sintomas  Indicação  Evolução clínica: déficit neurológico persistente  Evolução radiológica: imagens radiológicas persistentes 
Gratton et al., 20112  65/feminino  45 mg cada 12 semanas  2 1/2 anos  Psoríase  Não  Não 
Dickson, Menter, 20173  58/masculino  90 mg cada 8 semanas  6 anos  Psoríase e artrite psoriática  Não  Não 
Mishra, Seril, 20184  18/feminino  340 mg dose única de indução  12 dias seguindo a indução  Doença de Crohn  Não  Não 
Mishra, Seril, 20184  54/masculino  390 mg dose única de indução  6 dias seguindo a indução  Doença de Crohn  Não  Não 
Jordan, Kinnucan, 20225  64/feminino  90 mg cada 8 semanas  2 1/2 anos  Doença de Crohn  Dificuldade a deambulação  Sim (1 mês após) 
Sarto et al., 20226  48/masculino  390 mg seguido por 90 mg na semana 8  30 dias após a segunda dose  Doença de Crohn  Não  Sim (18 meses após) 
Este estudo  47/masculino  90 mg nas semanas 0 e 4  14 dias após a segunda dose  Psoríase  Não  Sim (3 meses após) 

PRES é uma desordem neurológica grave incomum frequentemente reversível, com sintomas agudos, incluindo cefaleia, alterações visuais, paresia, náusea, alteração da consciência e convulsões.7,8

Parece resultar da perda da autorregulação dos vasos cerebrais ou disfunção endotelial, mais associada à hipertensão maligna, eclâmpsia e agentes imunossupressores, como corticoides, micofenolato, ciclosporina, ciclofosfamida e metotrexato.6–8 O nome é impreciso, pois não se trata de alteração exclusiva das regiões cerebrais posteriores e não cursa sempre com reversão completa.6–8

A RM garante o diagnóstico e prevê o prognóstico, avaliando a reversibilidade ou não das lesões. Os achados clássicos são hipersinal difuso ou focal simétrico bilateral nas imagens FLAIR, predominantemente na substância branca, envolvendo as regiões posteriores, principalmente lobos occipital e parietal. Imagens atípicas, incluindo envolvimento do lobo frontal, gânglios da base, junção têmporo‐occipital e cerebelo, não rejeitam o diagnóstico.7

A maioria dos casos leva à neurotoxicidade relacionada ao edema vasogênico, sem restrição na sequência DWI e é reversível. Entretanto, são descritos cerca de 11% a 26% dos casos de infarto ou lesão tecidual com edema citotóxico, que é visto como difusão restrita, evoluindo com sequelas,7 como neste paciente, que evoluiu para lesões permanentes de imagem, talvez por atraso no diagnóstico.2–4

O tratamento da PRES não é consenso, mas direciona‐se à causa precipitante, além do manejo com antiepilépticos. Os sintomas geralmente desaparecem em uma ou duas semanas.9

A despeito da segurança do ustequinumabe e de outras drogas de uso crescente na prática dermatológica, nosso caso enfatiza sua associação com a ocorrência de eventos neurológicos potencialmente graves. O reconhecimento precoce e a condução adequada permitiriam prevenir ou reduzir possíveis sequelas neurológicas e o desfecho fatal.

Editor

Sílvio Alencar Marques.

Disponibilidade de dados de pesquisa

Não se aplica.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Marilda Aparecida Milanez Morgado de Abreu: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Naíra M. de A. Guaresemin: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Murilo de Oliveira Lima Carapeba: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
D.L.F.D. Silva, E.N. Secamilli, M.V. Beleli, J.Y. Massuda, A.F.E.C. Franca, R.F. Magalhães.
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An Bras Dermatol., 97 (2022), pp. 275-283
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D. Gratton, P. Szapary, K. Goyal, S. Fakharzadeh, V. Germain, P. Saltiel.
Reversible posterior leukoencephalopathy syndrome in a patient treated with ustekinumab: case report and review of the literature.
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L. Dickson, A. Menter.
Reversible posterior leukoencephalopathy syndrome (RPLS) in a psoriasis patient treated with ustekinumab.
J Drugs Dermatol., 16 (2017), pp. 177-179
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A. Mishra, D.N. Seril.
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Ustekinumab‐associated posterior reversible encephalopathy syndrome in a patient with Crohn's disease.
ACG Case Rep J., 9 (2022), pp. e00867
[6]
J. Sarto, B. Caballol, J. Berenguer, I. Aldecoa, Á. Carbayo, D. Santana, et al.
Clinically reversible ustekinumab‐induced encephalopathy: case report and review of the literature.
Ther Adv Neurol Disord., 15 (2022),
[7]
Silva CJ, Rocha AJ. Encefalopatias tóxicas, nutricionais e neurometabólicas adquiridas. In: Rocha AJ, Vedolin L, Mendonça RA (eds.). Encéfalo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. p. 247‐88.
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J.P. Pirola, D.F. Baenas, M.J. Haye Salinas, N.R. Benzaquén, M. Colazo, M.V. Borghi, et al.
Posterior reversible leukoencephalopathy syndrome: case series and review of the literature.
Reumatol Clin (Engl Ed)., 16 (2020), pp. 169-173
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E.V. Hobson, I. Craven, S.C. Blank.
Posterior reversible encephalopathy syndrome: a truly treatable neurologic illness.
Perit Dial Int., 32 (2012), pp. 590-594

Como citar este artigo: Morgado de Abreu MAM, Guaresemin NMA, Carapeba MOL. Posterior reversible encephalopathy syndrome in a patient treated with Ustekinumab. An Bras Dermatol. 2025;100:501177.

Trabalho realizado no Hospital Regional de Presidente Prudente, Universidade do Oeste Paulista, Departamento de Dermatologia, Presidente Prudente, SP, Brasil.

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