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Vol. 100. Núm. 6.
(Novembro - Dezembro 2025)
Cartas ‐ Caso clínico
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Lesões cutâneas subagudas no lúpus eritematoso sistêmico: resposta significativa e bem tolerada ao anifrolumabe
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Bárbara Fernandes Estevesa,
Autor para correspondência
barbarafernesteves@gmail.com

Autor para correspondência.
, Maria Seabra Ratoa, João Carlos Almeidab, Miguel Bernardesa, Lúcia Costaa, Raquel Miriam Ferreiraa
a Departamento de Reumatologia, Unidade Local de Saúde de São João, Centro Hospitalar Universitário São João, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto, Porto, Portugal
b Departamento de Patologia, Unidade Local de Saúde de São João, Centro Hospitalar Universitário São João, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto, Porto, Portugal
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Prezado Editor,

O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é doença autoimune multissistêmica crônica com amplo espectro de manifestações clínicas.1 Lesões mucocutâneas são comuns no LES, afetando até 80% dos pacientes. Lesões cutâneas podem causar morbidade significante e potencialmente levar a danos irreversíveis. Quando exposta a noxas exógenas (como a luz ultravioleta), a pele do paciente com LES apresenta maior suscetibilidade a danos celulares. A pele com LES apresenta hiperresponsividade ao interferon (IFN) a estímulos inflamatórios, servindo como sítio‐chave de sensibilização de autoantígenos, desencadeando inflamação sistêmica.2

A heterogeneidade da apresentação clínica do LES contribui para seu desafio terapêutico.3 Este relato apresenta o resultado impressionante e bem‐sucedido do tratamento das manifestações cutâneas do LES.

Descreve‐se o caso de uma paciente de 37 anos com história de um ano de extensas lesões anulares eritematosas na parte superior do tórax, dorso, superfícies extensoras dos braços e antebraços, região glútea e parte posterior da coxa (fig. 1) e alopecia não cicatricial. O escore de atividade do Cutaneous Lupus Erythematosus Disease Area and Severity Index (CLASI‐A) foi de 25, sem danos (despigmentação ou formação de cicatrizes). A paciente também se queixava de poliartralgias inflamatórias, xeroftalmia e xerostomia. Não apresentava antecedentes pessoais ou familiares relevantes. Os exames laboratoriais revelaram positividade para anticorpos anti‐SSA e antinucleares (título de 1/1000; padrão pontilhado), com hemograma, níveis de complemento e função renal normais. A biopsia de pele revelou achados histopatológicos (fig. 2), bem como deposição de IgM ao longo da junção dermoepidérmica na imunofluorescência direta, corroborando o diagnóstico clínico de lúpus eritematoso cutâneo subagudo. O teste de Schirmer foi normal, e a biopsia de glândula salivar não revelou alterações histopatológicas.

Figura 1.

(A–B) Lúpus cutâneo subagudo mostrando placas eritematosas anulares coalescendo em placas policíclicas com bordas elevadas e descamação antes do tratamento.

Figura 2.

Características morfológicas consistentes com o diagnóstico clínico do subtipo subagudo de lúpus eritematoso cutâneo. A biopsia de pele (coloração com Hematoxilina & eosina) mostrou adelgaçamento epidérmico (A, 40×), áreas de dermatite de interface com vacuolização da camada basal (B, 100×), mucina dérmica, incontinência pigmentar e infiltrado linfocitário perivascular (C, 100×).

O diagnóstico de LES foi estabelecido com base nos critérios de classificação EULAR/ACR de 2019 para LES; iniciou‐se tratamento com hidroxicloroquina. No entanto, observou‐se apenas melhora do envolvimento articular. Assim, foram introduzidos prednisolona oral até 40mg/dia, betametasona tópica e azatioprina até 1,5mg/kg/dia, sem resposta. A azatioprina foi descontinuada em decorrência de linfopenia grave. Micofenolato de mofetil 1.500mg/dia foi tentado, mas linfopenia foi novamente observada. O efeito iatrogênico foi confirmado sistematicamente com a normalização da contagem de leucócitos após a suspensão dos medicamentos.

Dada a atividade significante da doença da paciente, apesar da terapia multimodal, a infusão de 300mg de anifrolumabe foi iniciada a cada quatro semanas. Um mês depois, a paciente apresentou melhora drástica das lesões cutâneas (fig. 3) e da alopecia não cicatricial, com redução do escore CLASI‐A para 7. A dose de prednisolona foi reduzida progressivamente para 5mg/dia em três meses. Nenhum efeito adverso foi observado durante a terapia biológica.

Figura 3.

(A–B) Melhora após duas infusões de anifrolumabe, com resolução total das lesões.

A ativação da via do IFN tipo I é reconhecida como tendo papel crítico na patogênese do LES, promovendo a formação de células dendríticas, a ativação de células T e a produção de autoanticorpos por células B.1,4,5 O anifrolumabe, anticorpo monoclonal totalmente humano que se liga seletivamente à subunidade 1 do receptor de IFN, inibe a sinalização por todos os interferons tipo I.3,5,6 Esse bloqueio pode reverter a desregulação imunológica e prevenir danos teciduais adicionais no LES.4

O anifrolumabe foi recentemente aprovado para o tratamento de LES moderado a grave, além do tratamento padrão para pacientes sem envolvimento renal ou do sistema nervoso central.4,5,7 Os três principais ensaios clínicos com anifrolumabe (MUSE,5TULIP‐1[8] e TULIP‐2[3]) avaliaram a resposta das manifestações cutâneas usando o escore CLASI. Todos os ensaios clínicos demonstraram redução rápida e significante na atividade CLASI com anifrolumabe. A redução gradual sustentada da prednisolona oral até a dosagem ≤ 7,5mg/dia também foi alcançada.3,5,7,8 Outra observação importante foi a rápida resposta cutânea, que pode impactar a vida diária, visto que as áreas mais comumente envolvidas são expostas e visíveis.2,6

Este caso destaca o valor do anifrolumabe no tratamento do lúpus cutâneo após a falha de múltiplas terapias, em virtude da ineficácia ou de efeito adverso.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Bárbara Fernandes Esteves: Obtenção de dados, ou análise e interpretação dos dados; elaboração e redação do manuscrito ou revisão crítica de conteúdo intelectual relevante; revisão crítica da literatura; aprovação da versão final do manuscrito.

Maria Seabra Rato: Obtenção de dados, ou análise e interpretação dos dados; elaboração e redação do manuscrito ou revisão crítica de conteúdo intelectual relevante.

João Carlos Almeida: Obtenção, análise e interpretação dos dados.

Miguel Bernardes: Aprovação da versão final do manuscrito.

Lúcia Costa: Aprovação da versão final do manuscrito.

Raquel Miriam Ferreira: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito ou revisão crítica de conteúdo intelectual relevante; aprovação da versão final do manuscrito.

Disponibilidade de dados da pesquisa

Não aplicável.

Conflito de interesses

Miguel Bernardes: Conselho consultivo: Lilly, Biogen, Abbvie, Pfizer, Novartis, Boehringer Ingelheim BMS, AstraZeneca, Janssen‐Cilag. Palestrante: Lilly, Abbvie, Pfizer, Boehringer Ingelheim, AstraZeneca, Janssen‐Cilag. Compensação honorária: Lilly, Biogen, Abbvie, Pfizer, Novartis, Boehringer Ingelheim BMS, AstraZeneca, Janssen‐Cilag.

Nenhum potencial conflito de interesses foi relatado pelos outros autores.

Editor

Sílvio Alencar Marques

Referências
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Como citar este artigo: Esteves BF, Rato MS, Almeida JC, Bernardes M, Costa L, Ferreira RM. Subacute skin lesions in systemic lupus erythematosus: an impressive and well‐tolerated response to anifrolumab. An Bras Dermatol. 2025;100:501220.

Trabalho realizado na Unidade Local de Saúde de São João, Centro Hospitalar Universitário São João, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto, Porto, Portugal.

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