As lesões por pressão devem ser identificadas e tratadas precocemente para evitar que se tornem difíceis de curar. Nesta revisão serão destacadas as principais complicações inerentes às lesões por pressão, bem como o prognóstico esperado para pacientes com essa condição de saúde. Além disso, as medidas preventivas mais atuais são enfatizadas e apoiadas por referências robustas de revisões sistemáticas e diretrizes. Na seção de tratamento, um modelo conceitual atualizado e abrangente é apresentado para orientar dermatologistas e profissionais de saúde na avaliação de lesões em geral, bem como de lesões por pressão. O foco no desbridamento e no manejo de infecções e biofilme é enfatizado. A importância do preparo do leito da ferida e da área perilesional também será abordada, unificando conceitos com as melhores evidências científicas.
Lesões por pressão (LP), também conhecidas como “úlceras por pressão”, são consideradas crônicas e devem ser identificadas e tratadas precocemente para evitar que se tornem difíceis de curar.1 Sua alta incidência e prevalência global2 tornam a prevenção uma preocupação atual e uma necessidade nas agendas das organizações de saúde.3 As LP têm impacto econômico significante relacionado aos custos diretos e indiretos envolvidos em seu tratamento, como custos com materiais para tratamento de feridas, tempo de enfermagem, cirurgia, desbridamento, tempo adicional de hospitalização, medicamentos, exames laboratoriais e de imagem e medidas de prevenção secundária (para evitar maior deterioração, ocorrência ou recorrência de LP), tratamento de complicações e consultas médicas.4 Além disso, existem despesas não quantificáveis relacionadas ao impacto negativo das LP sobre os pacientes e suas famílias.5
Os dermatologistas podem contribuir significantemente para o cuidado de pacientes com LP, pois sua formação os torna membros valiosos da equipe de tratamento de feridas por meio do diagnóstico adequado das LP, da indicação dos exames diagnósticos necessários para a avaliação, da recomendação dos cuidados corretos para a pele circundante e da indicação de tratamentos adequados e curativos especializados. Os dermatologistas também podem orientar estratégias para a prevenção e o tratamento de complicações, economizando recursos para o sistema de saúde e melhorando a qualidade de vida dos pacientes.6
Na Parte I, os conceitos gerais, os aspectos clínicos e os achados laboratoriais das LP foram atualizados. A Parte II concentra‐se na prevenção, no tratamento e nas complicações.
Prevenção de lesões por pressãoAvaliação de risco para lesões por pressãoA avaliação de risco para o desenvolvimento de LP deve ser estruturada, incluindo uma escala de predição de risco válida e confiável, avaliação completa da pele e interpretação crítica dos resultados.7 Esta última tem sido enfatizada como elemento‐chave na identificação de potenciais fatores de risco que as escalas podem não cobrir.8
A avaliação de risco para LP auxilia na seleção de intervenções preventivas eficazes, incluindo a frequência da avaliação da pele e do reposicionamento. Algumas intervenções estão diretamente relacionadas a fatores de risco específicos (p. ex., controle da umidade, quando presente), enquanto outras são atribuídas com base no escore geral de risco estimado.9 Assim, as escalas de predição de risco destacam as áreas vulneráveis, reforçam a importância da avaliação contínua e apoiam os mecanismos preventivos.10 Além disso, as escalas podem contribuir para estudos epidemiológicos, identificando grupos de indivíduos em risco. Idealmente, escalas de predição de risco para LP devem ser usadas especificamente para a população para a qual foram desenvolvidas.7 Para pacientes adultos em geral, o padrão ouro atualmente é a Escala de Braden,11 que foi traduzida para o português do Brasil em 1999.12 Ela abrange seis domínios de risco: mobilidade (capacidade de mudar e controlar a posição do corpo); atividade (grau de atividade física); percepção sensorial (capacidade de responder adequadamente ao desconforto relacionado à pressão); umidade (grau de exposição da pele à umidade); atrito e cisalhamento (forças horizontais agindo em conjunto com a pressão vertical); e nutrição (padrão usual de ingestão alimentar). Esses domínios são pontuados de 1 a 4 (exceto o último, que é pontuado de 1 a 3). O escore varia de 6 a 23, classificando os indivíduos com base no escore total obtido de seguinte modo: sem risco (19–23 pontos), baixo risco (15–18 pontos), risco moderado (13–14 pontos), alto risco (10–12 pontos) e risco muito alto (≤ 9 pontos).12
A Escala Braden‐Q foi modificada para crianças, desenvolvida especificamente para neonatos até 18 anos.13,14 Mais recentemente, para neonatos, foi introduzida a Escala Braden QD,15 e já foi adaptada para o Brasil.16 A Escala Glamorgan,17 desenvolvida para crianças hospitalizadas e adaptada para o português, demonstrou maior acurácia do que a Braden‐Q.18 Mais recentemente, foi aplicada em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) pediátricas.19
Os pacientes apresentam alto risco para o desenvolvimento de LP durante procedimentos cirúrgicos. A primeira escala desenvolvida para avaliar esse risco foi a Escala de Munro.20,21 No entanto, além das características intrínsecas do paciente, o posicionamento cirúrgico durante o período perioperatório torna‐se o desafio mais importante na prevenção de LP. A Escala ELPO22, desenvolvida por uma enfermeira brasileira para esse fim, é amplamente utilizada e validada, além de ser utilizada em outros países.23,24 Recentemente, foi introduzida uma nova escala denominada PRASI (Proactive Risk Assessment for Skin Integrity), que avalia principalmente a integridade da pele.25
Para pacientes críticos em UTI, as escalas mais estudadas atualmente, já adaptadas para o português, são: EVARUCI,26,27 CALCULATE28,29 e Cubbin & Jackson.30,31 Estudos demonstraram que essas escalas apresentam predição de risco superior à Escala de Braden.32,33 Em concordância, uma revisão sistemática de 202434 destacou que o uso da Escala de Braden em UTI não é recomendado em virtude da inconsistência de suas propriedades psicométricas, uma vez que não aborda completamente os fatores de risco para esse perfil de paciente.34
Medidas preventivasAlém das escalas e do julgamento clínico, os pacotes de prevenção tornaram‐se mais difundidos. Trata‐se de um conjunto de intervenções baseadas em evidências que, quando implementadas em conjunto, visam impactar os resultados dos pacientes,35,36 incluindo avaliação de risco, controle de umidade, mobilidade do paciente, nutrição, superfícies de apoio7 e treinamento da equipe.37 No entanto, em uma revisão sistemática, estudos sobre pacotes demonstraram viés, particularmente na avaliação pós‐intervenção da aplicação dessas medidas, indicando que mais pesquisas são necessárias para avaliar sua eficácia.38
Conscientização clínica e alocação adequada de recursos são necessárias para prevenir LPs.39 Minimizar as forças de compressão (pressão) e cisalhamento na interface entre o corpo e a superfície de apoio ou entre o corpo e um dispositivo médico são intervenções clínicas válidas para reduzir o risco de desenvolvimento de LP.7
A tabela 1 lista as principais medidas preventivas recomendadas para pacientes com risco de desenvolver LP,7,36,37,40–53 incluindo evidências relacionadas à avaliação e aos cuidados com a pele7 e curativos preventivos (fig. 1), reposicionamento,7,37,44,45 cabeceira da cama,7,40,46 superfícies (cama e colchões),7,40,47,52 e nutrição.7,40,48–51,53
Principais medidas preventivas para pacientes com risco de desenvolver lesões por pressão e suas respectivas recomendações7,36,37,40–53
| Medidas preventivas | Recomendações |
|---|---|
| Avaliação e cuidados com a pele | • Avaliação diária da pele em áreas de proeminências ósseas e dispositivos médicos, prestando atenção às áreas de eritema, edema ou alterações na temperatura ou textura da pele. |
| • Manter a pele limpa e hidratada, evitando o uso de sabonetes alcalinos. | |
| • Evitar esfregar e massagear vigorosamente a pele sob risco de lesões por pressão, especialmente sobre proeminências ósseas.7 | |
| • Usar creme ou spray de barreira, especialmente em áreas com exposição persistente à umidade, como a área das fraldas em pacientes incontinentes. | |
| Curativos preventivosa | • Recomendado para todos os pacientes com risco de LP, especialmente aqueles em unidades de terapia intensiva, em áreas de proeminências ósseas. |
| • Usar curativos de silicone e espuma multicamadas, especialmente na região sacral e calcanhares. | |
| Reposicionamento | • O intervalo exato para reposicionamento não é conhecido e é feito empiricamente. |
| • Ao reposicionar, considere fatores individuais, como tolerância da pele, condição médica geral, objetivos do tratamento, conforto e dor. | |
| • O reposicionamento a cada duas horas foi relatado em alguns estudos como contribuindo para redução de até 25% na incidência de LP;37,44 ter uma equipe específica (equipe de rotação) para realizar o reposicionamento demonstrou reduzir esse risco em 51%.44 | |
| • Nos calcanhares, deve‐se usar travesseiro ou almofada de espuma para distribuir o peso da perna ao longo da panturrilha sem aplicar pressão no tendão de Aquiles e na veia poplítea. | |
| • Técnicas e equipamentos manuais, como colchões rotativos e lençóis deslizantes, auxiliam no reposicionamento adequado, reduzindo o atrito durante o movimento e ajudando no conforto. | |
| • Ao reposicionar, considere fatores individuais, como tolerância da pele, condição médica geral, objetivos do tratamento, conforto e dor. | |
| Cabeceira da camab | • O ideal é que a cabeceira da cama seja mantida na menor elevação possível, de acordo com as condições clínicas e outras restrições. |
| • Quando for necessária a elevação da cabeceira da cama, devem ser tomadas precauções para evitar deslizamento ou migração do paciente. | |
| Superfícies (cama e colchão) | • Ao escolher a melhor superfície, as características individuais do paciente devem ser consideradas, incluindo o risco de LP.40 |
| • Escolher colchões que permitam espessura mínima de 2,5cm entre o corpo do paciente e a superfície rígida da cama. | |
| • Avaliar a densidade do colchão para garantir que o paciente não “afunde” no colchão. | |
| • Colchões recomendados: colchões pneumáticos (com alternância de ar) oferecem melhor custo‐benefício em comparação aos colchões de espuma (tipo pirâmide ou “caixa de ovo”).52 | |
| Nutrição | • O estado nutricional é fator significante na prevenção de LP, pois tanto pacientes magros desnutridos quanto obesos enfrentam risco maior de desenvolvê‐las em virtude da integridade comprometida do tecido e da capacidade de cicatrização reduzida.53 |
| • Avaliar todos os pacientes quanto ao risco nutricional usando ferramenta validada, como a Malnutrition Universal Screening Tool (MUST).49 | |
| • Avaliação de nutricionista para desenvolver plano adequado para pacientes em risco. | |
| • Para neonatos e crianças com ou em risco de LP que tenham ingestão oral inadequada, considere alimentos enriquecidos, suplementos nutricionais apropriados para a idade ou suporte nutricional enteral ou parenteral. | |
| • Os suplementos, em geral, ainda apresentam baixa evidência na prevenção e necessitam de estudos sobre dietas especiais (p. ex., ricas em proteínas, vegetarianas).51 |
De acordo com uma revisão sistemática,37 foi demonstrado que curativos de espuma reduzem a incidência de lesões por pressão em 30%.
Elevar a cabeceira da cama cria pressões de interface mais altas entre a pele e a superfície da cama na região sacrococcígea. Pacientes sob ventilação mecânica, quando a uma elevação de 45°, apresentam risco quase 50% maior de lesões por pressão em comparação com uma elevação de 30°.46.
O primeiro passo no tratamento da LP é aliviar a pressão nas áreas afetadas e prevenir o desenvolvimento de lesões em novas áreas. O tratamento de uma LP deve ocorrer o mais precocemente possível para evitar o desenvolvimento de feridas crônicas ou de difícil cicatrização, que não diminuem de 40% a 50% em quatro semanas54 quando tratadas com bons padrões de cuidado.55 Além disso, o tratamento das LP deve se concentrar na causa subjacente, que já foi explicada anteriormente e está diretamente relacionada aos fatores que levaram à lesão; o mais importante geralmente é a pressão. Idealmente, toda a pressão sobre a lesão deve ser removida. Em muitos casos, isso pode ser impossível e, portanto, a otimização do ambiente do paciente é necessária. Uma intervenção essencial é o alívio da pressão e a redistribuição da carga por meio de reposicionamento frequente.7 Assim, medidas físicas são necessárias para remover cargas mecânicas e redistribuir a pressão, a fim de prevenir riscos adicionais e danos aos tecidos e promover a cicatrização.56 Alguns pacientes, em virtude de condições graves, podem ter o reposicionamento comprometido. Portanto, o curativo de uma LP, além de promover a cicatrização, também deve interferir no estado de carga nos tecidos moles na e ao redor da ferida. Um curativo adequado com efeito biomecânico protetor deve absorver a energia de compressão e deformação por cisalhamento dos tecidos circundantes e da própria ferida, aliviando as cargas transferidas.56 Exemplos de curativos de desempenho biomecânico são os anisotrópicos multicamadas, que visam diferentes resistências à compressão ou tensão, dependendo da direção em que a força é aplicada. Esse tipo de curativo tem se mostrado eficaz na profilaxia de LP sacral57–59 e também demonstrou eficiência com foco no tratamento – ou seja, quando uma LP já existe e é submetida a forças de peso corporal.56
A melhora da mobilidade do paciente, ensinada por fisioterapeutas, ajuda a reduzir a incontinência e a imobilidade, diminuindo assim o risco de desenvolvimento de LP.60 Um exemplo é o tratamento de LP com estimulação elétrica, em que ensaios clínicos têm fornecido ampla evidência de sua eficácia,61 conforme já recomendado por diretrizes internacionais.7
A otimização da nutrição não se mostrou definitiva, mas pesquisas demonstraram que a suplementação nutricional especializada, além do tratamento padrão de feridas, pode efetivamente melhorar a cicatrização de LP.62,63 A nutrição terapêutica pode auxiliar na cicatrização de feridas, aumentando a produção de colágeno e ajudando a repor os nutrientes essenciais necessários para a cicatrização.64 Pacientes com LP geralmente são desnutridos e apresentam deficiência proteica, mesmo aqueles com sobrepeso ou obesidade, como evidenciado por baixos níveis de biomarcadores nutricionais. A cicatrização bem‐sucedida depende da síntese/deposição de colágeno e da renovação epitelial, ambos altamente dependentes de reservas e suporte adequados de nutrientes.40
Uma vez que as causas que originaram ou perpetuaram as LP tenham sido abordadas e corrigidas ou melhoradas, o próximo passo é a preparação do leito da ferida ou a abordagem local das LP.65,66
Ao escolher a abordagem local e o curativo mais adequado (primário e secundário), é essencial considerar os objetivos do tratamento, que podem incluir: proteger o leito da ferida durante a cicatrização, promover a formação de tecido de granulação, auxiliar a autólise para auxiliar no desbridamento do tecido desvitalizado, controlar a infecção local e sistêmica, controlar o excesso de exsudato e o odor desagradável, controlar a hipergranulação e avaliar a região perilesional.67 Nesse sentido, é essencial considerar o tamanho e a profundidade da ferida, sua classificação e duração, e aspectos relacionados ao paciente, como fatores emocionais e sociais, acesso a cuidados de saúde, ambiente e adesão ao plano de tratamento.1 Além disso, é essencial considerar a saúde geral e os objetivos da família e dos pacientes. Cuidados paliativos para LP referem‐se ao alívio dos sintomas e do sofrimento relacionados às feridas no contexto de uma doença grave. Além disso, é essencial considerar a saúde geral e os objetivos da família e dos pacientes.40 As lesões que ocorrem no fim da vida devem se concentrar em intervenções para o controle dos sintomas, conforto do paciente e bem‐estar, em vez de curar a ferida.68 Os tratamentos tópicos para dor incluem gel viscoso de lidocaína e curativos que liberam ibuprofeno e opioides locais. O odor da ferida pode ser reduzido com curativos de carvão, antissépticos, curativos de prata ionizada ou gel de metronidazol. Alginatos, fibras gelificantes e curativos de espuma absorvente podem controlar o excesso de drenagem e proteger a pele ao redor de danos relacionados à umidade.69
Todos esses aspectos foram incorporados à sigla TIMERS (fig. 2), essencial para facilitar o tratamento eficiente da ferida, com foco na avaliação rigorosa e na implementação de intervenções para otimizar o processo de cicatrização.7,55
TIMERS adaptado adicionando a abordagem perilesional (PW).1,55,67,70.
A avaliação da viabilidade tecidual no leito da lesão envolve a identificação de tecido desvitalizado ou não viável, o que dificulta o processo de cicatrização e facilita infecções.1 A remoção de tecido desvitalizado (desbridamento) é essencial, incluindo esfacelo, tecido necrótico, detritos, toxinas, microrganismos e biofilme, tanto no leito da úlcera quanto na área perilesional, bem como hiperceratose.70
A limpeza ou higiene é a primeira etapa do processo. Seu objetivo é minimizar a carga microbiana e remover contaminantes superficiais, detritos e microrganismos da ferida, visando estabelecer um ambiente limpo que reduza o risco de infecção e promova a formação de tecido de granulação saudável.65,70 A limpeza também garante melhor visualização do leito da ferida e acesso a tecidos não viáveis.7,70 A higiene adequada deve ser realizada no leito da ferida e na pele perilesional.1,55 Recomenda‐se principalmente o uso de solução de cloreto de sódio a 0,9% ou água limpa (potável) para irrigação.71
Portanto, em casos de LP de difícil cicatrização, é necessário limpar tanto a ferida quanto a área perilesional com produtos antissépticos adequados para a pele (Ph 4‐6), como a poli‐hexametileno biguanida (PHMB).71
O desbridamento, por outro lado, é uma etapa crítica na preparação do leito da ferida, visando remover as barreiras que impedem o processo de cicatrização.65 Seu objetivo é remover tecido necrótico e descamativo, reduzir a carga bacteriana e eliminar o biofilme.1 O desbridamento contribui para a remoção de fibroblastos e queratinócitos que sofrem alterações fenotípicas (senescência), levando à inflamação crônica, fibrose e retardo na cicatrização.72 Assim, ele converte feridas crônicas estagnadas na fase inflamatória em um ambiente mais semelhante ao de feridas agudas, promovendo a cicatrização.1,73 Os seguintes tecidos inviáveis requerem tratamento com desbridamento (fig. 2):
- •
Tecido necrótico: resultante da morte tecidual localizada decorrente de infecção ou isquemia. Pode apresentar coloração preta, marrom ou acinzentada, podendo ser seco (geralmente não infectado) ou úmido (frequentemente infectado) e geralmente aderido ao leito da ferida.
- •
Esfacelo: mistura complexa de proteínas do exsudato, proteínas da matriz extracelular degradadas, leucócitos e vários microrganismos com fenótipo planctônico e de biofilme.70
Os diferentes tipos de desbridamento são descritos na figura 2. O desbridamento integrado envolve a combinação de métodos de desbridamento de acordo com as necessidades individuais do paciente, preferências e ambiente, bem como os recursos disponíveis e as habilidades dos profissionais de saúde.70 Além disso, os profissionais precisam estar cientes das contraindicações para cada procedimento. O desbridamento cirúrgico, por exemplo, deve ser cuidadosamente avaliado em pacientes que usam anticoagulantes, aqueles com alto risco cirúrgico ou que tenham sofrido isquemia, especialmente se as feridas forem extensas.1 Outros métodos de desbridamento, como o desbridamento autolítico ou mecânico, são menos invasivos e requerem menos treinamento, tornando‐os mais amplamente utilizados.70 No entanto, o desbridamento autolítico (p. ex., com hidrogéis e hidrocoloides) não é o método de escolha em casos de infecção ativa com grandes quantidades de tecido desvitalizado (p. ex., tecido gangrenoso). Nesses casos, o desbridamento cirúrgico deve ser considerado.”
I (infecção/inflamação)Infecção e inflamação impedem a cicatrização e são fatores cruciais a serem monitorados.74
A infecção local é caracterizada pela presença e proliferação de microrganismos dentro da ferida, desencadeando uma resposta do hospedeiro que frequentemente causa atraso na cicatrização.75 A infecção local limita‐se à ferida e à área perilesional imediata (menos de 2cm) e frequentemente se apresenta com sinais e sintomas sutis que podem não ser imediatamente reconhecidos, como tecido de granulação hipertrófico, sangramento, granulação friável, pontes epiteliais, formação de bolsas no tecido de granulação e aumento da exsudação.75
Quase todas as feridas crônicas contêm biofilmes, estruturas comunitárias complexas cercadas por uma substância polimérica extracelular secretada por várias bactérias patogênicas para escapar das defesas do hospedeiro e aumentar a resistência aos medicamentos antimicrobianos.76,77 Combinado com estudos laboratoriais e clínicos, o biofilme na ferida pode se manifestar como uma fina camada de material amarelado, gelatinoso e translúcido, visível a olho nu.78 Além disso, pode estar presente tanto na superfície quanto em tecidos profundos, estimulando a inflamação crônica e retardando o processo de cicatrização.77 O desbridamento cirúrgico é o padrão ouro para a remoção de biofilme, tornando a ferida limpa e propícia ao reparo, rompendo temporariamente o biofilme maduro.77 Além disso, existe o tratamento com nanotecnologia, em que curativos contendo íons de prata ou zinco competem com a matriz polimérica extracelular dos biofilmes por sítios de ligação, reduzindo a adesão intercelular de bactérias patogênicas.77
Em geral, antibióticos tópicos isoladamente não são mais recomendados para feridas, pois podem promover o desenvolvimento de resistência bacteriana.1 Antissépticos raramente induzem resistência antimicrobiana.1 Uma ampla gama de antissépticos está disponível, como iodopovidona, iodo cadexômero, clorexidina, PHMB, prata (nanocristalina ou iônica), octenidina, oxigênio reativo e ácido hipocloroso. No entanto, de acordo com uma revisão sistemática, os efeitos dos tratamentos antimicrobianos tópicos sobre LP não são claros, e a qualidade das evidências varia de moderada a muito baixa.79
Sinais de infecção profunda, como aumento de eritema, odor fétido, calor, aumento de exsudato, febre, dor nova ou crescente e contagem elevada de leucócitos, devem ser tratados com antibióticos sistêmicos; o cuidado com a ferida deve ser feito com tratamentos tópicos semelhantes aos usados para infecções locais.75 Outros indicadores, como cicatrização lenta após duas semanas de tratamento padrão, descoloração do tecido de granulação para tons claros ou escuros em vez de vermelho saudável e tecido friável, indicam possível infecção em feridas.40
Na infecção disseminada, como a celulite, os microrganismos invadem o tecido circundante, espalhando‐se a partir de uma lesão, e os sinais e sintomas se estendem além das bordas da ferida. A infecção disseminada pode envolver tecidos profundos, músculos, fáscias, órgãos ou cavidades corporais, com possíveis sinais de aumento de endurecimento, linfangite, crepitação, deiscência da ferida com ou sem lesões satélites e inflamação generalizada ou eritema a mais de 2cm da borda da ferida.75 A infecção sistêmica é a fase em que os microrganismos se espalham por todo o corpo por meio dos sistemas vascular ou linfático, desencadeando uma resposta do hospedeiro. Uma infecção local de ferida também pode desencadear a resposta inflamatória sistêmica por outras vias, como liberação de toxinas ou sistema imunológico desregulado. Os sintomas podem incluir mal‐estar, letargia ou deterioração geral inespecífica, febre/pirexia, sepse grave, choque séptico, falência de órgãos e morte.75
A cultura de rotina da ferida não é recomendada quando não há suspeita de infecção. No entanto, quando se faz um diagnóstico clínico de infecção disseminada e sistêmica, recomenda‐se o método de cultura da úlcera para confirmar o diagnóstico inicial, identificar espécies de microrganismos residentes e determinar antibióticos eficazes para tratar a ferida. A literatura atual fornece três técnicas laboratoriais para o diagnóstico de infecções de feridas: biopsia de tecido profundo, aspiração por agulha e cultura de swab. Uma hemocultura também deve ser realizada em caso de infecção sistêmica.75
Feridas profundas ou com exposição óssea são suscetíveis à osteomielite, que é mais bem detectada por ressonância magnética ou biopsia óssea, e requer antibioticoterapia intravenosa,1 com base nos resultados da cultura.40 No entanto, diagnósticos clínicos relacionados a LP têm sido discutidos. Uma revisão sistemática constatou que nenhum método diagnóstico alternativo (clínico, microbiológico ou radiológico) é confiável para o diagnóstico de osteomielite associada a LP pélvicas.80 Outra revisão sistemática81 descreve a osteomielite na região sacral, que é a área mais afetada por LP, de acordo com estudos de incidência.2 Nessa revisão, a biopsia óssea continua sendo o único método diagnóstico preciso, mas a osteomielite é relativamente rara em pacientes com LP sacrais em estágio 4.81 Além disso, indica que antibióticos de curto prazo podem tratar infecções agudas de tecidos moles, com duração de duas a seis semanas, dependendo da profundidade da infecção; não há evidências que sustentem a extensão do tratamento além de seis semanas.81 Mais recentemente, uma revisão explica que as evidências permanecem inconclusivas para diagnósticos microbiológicos e histológicos, sugerindo que a biopsia óssea permanece limitada para o manejo do paciente.82 Isso destaca a importância de compreender a fragilidade do paciente e as evidências subjacentes à biopsia óssea, a fim de considerar mudanças no manejo clínico e na relação risco‐benefício.
M (umidade): avaliação do grau de exsudaçãoUm dos pontos‐chave para o cuidado de feridas é manter o ambiente úmido ideal, visando criar um ambiente equilibrado que facilite a cicatrização.83 No entanto, quando uma ferida apresenta produção excessiva ou insuficiente de exsudato, isso pode dificultar o processo de cicatrização e causar danos à pele circundante.1
As considerações incluem as características do exsudato em relação à sua quantidade, cor, odor, viscosidade, potenciais constituintes e aparência.84 Exsudato purulento, hemorrágico‐purulento ou seropurulento pode indicar infecção. Além disso, a cor e o odor podem indicar influência microbiana na ferida, incluindo biofilme e infecção.1
Os curativos são considerados como tendo potencial único para abordar problemas relacionados ao exsudato.83 Deve‐se selecionar um curativo que controle o exsudato de LP e proteja a pele perilesional, pois a maceração e o contato contínuo com o exsudato dificultam o processo de cicatrização.40 O exsudato viscoso requer tratamento diferente do exsudato aquoso fino, pois os produtos projetados para lidar com exsudato fino podem ficar bloqueados pelo exsudato viscoso, reduzindo a absorção e causando acúmulo no curativo.1 O exsudato de baixa viscosidade pode ser tratado com uma variedade de curativos absorventes, incluindo espumas, alginatos de cálcio, fibras gelificantes, curativos superabsorventes, curativos multicamadas, compressas de polímero e terapia de pressão negativa para feridas.1
Baixos níveis de umidade podem ser tratados com produtos que doam fluido para a ferida, como hidrogéis e curativos hidrocoloides.1
E (borda): avaliação da borda da feridaO monitoramento da margem epitelial orienta a abordagem de manejo para otimizar as condições necessárias. A qualidade do leito da ferida é crucial para facilitar o avanço epitelial a partir das bordas.1
A borda precisa ser avaliada para verificar se apresenta tecido hiperceratótico, epíbolo (borda enrolada) ou se não está avançando. As bordas devem estar limpas e niveladas, pois isso facilita a migração epitelial.70
R (reparo/regeneração): reparo/regeneraçãoA implementação de terapias avançadas para reparo deve ocorrer somente após o tratamento dos fatores de risco em feridas de difícil cicatrização. Alguns especialistas limitam o uso de terapias avançadas a feridas que responderam ao tratamento padrão em menos de 40% a 50% em quatro semanas.1
Diferentes tecnologias podem ser selecionadas com base em sua adequação à ferida e às características do paciente. Essas tecnologias incluem intervenções tópicas e sistêmicas (fig. 2).1 Quando o avanço epitelial é lento, diversas alternativas podem acelerar o processo. No campo da medicina regenerativa, baseada, por exemplo, na engenharia de tecidos, pode ser opção interessante em pacientes com úlceras de difícil tratamento, como pacientes com lesões na medula espinal.85 Os resultados da revisão sistemática sugerem que as terapias baseadas em células apresentam abordagem promissora para melhorar os resultados de LP; no entanto, pesquisas mais extensas são necessárias nesse tópico.86
As tecnologias mais recentes para regeneração incluem células‐tronco mesenquimais e epidérmicas, que podem ser aplicadas para promover a regeneração tecidual; tecnologias de bioimpressão 3D para criar estruturas biomiméticas que facilitam a cicatrização; terapia genética e edição genética para modificar comportamentos celulares; nanotecnologia com nanomateriais usados como carreadores de fármacos ou para promover a cicatrização de feridas por meio da liberação controlada de substâncias bioativas, e arcabouços biomiméticos que desenvolvem arcabouços acelulares que imitam a matriz extracelular para guiar a regeneração tecidual.87
Outra terapia que vem ganhando destaque é o plasma rico em plaquetas (PRP). No entanto, deve‐se observar que ele ainda está em estágios iniciais de uso, e possíveis variações precisam ser analisadas. Uma revisão sistemática recente concluiu que o PRP se destaca como abordagem terapêutica promissora e segura para lesões, mas para melhorar a qualidade das evidências são necessários novos ensaios clínicos randomizados de alta qualidade.88
S (social): avaliação de fatores sociais e relacionados ao pacienteAbrange a saúde e o bem‐estar geral, incluindo fatores físicos e psicológicos, e o impacto no estilo de vida do paciente.1 Ouvir e compreender o paciente é fundamental para o tratamento; envolvê‐lo em seus cuidados e na tomada de decisões pode melhorar os resultados e a adesão.89 O impacto mais negativo na qualidade de vida de indivíduos com LP ocorre na dimensão social. As LP afetam tanto os pacientes quanto seus cuidadores, limitando sua capacidade de realizar atividades diárias e tornando‐os mais dependentes de serviços de saúde e ambientes de apoio.90
O paciente deve ser avaliado holisticamente, incluindo sono, atividade física e fatores extrínsecos, como apoio familiar e da unidade de saúde. Ações interdisciplinares são essenciais para aliviar potenciais problemas e riscos, particularmente relacionados ao manejo adequado do odor e da dor, que contribuem para baixa autoestima, depressão e estigma social.55,91
O tratamento paliativo de feridas é uma disciplina complexa que difere significantemente do tratamento convencional de feridas, tendo como objetivo o alívio dos sintomas e a prestação de cuidados empáticos por profissionais de saúde.92 Os fatores que classificam uma ferida como paliativa incluem fatores de risco não modificáveis ou condições médicas, como desnutrição com sarcopenia, perfusão inadequada, falência de múltiplos órgãos, estados imunocomprometidos, anasarca, câncer metastático e prognóstico terminal que dificulte os processos normais de cicatrização.69 Uma abordagem paliativa pode aliviar o sofrimento, melhorar a qualidade de vida e reduzir os custos com saúde, evitando procedimentos inúteis e/ou dolorosos e despesas desnecessárias.69
A educação do paciente, da família e dos profissionais de saúde é essencial para promover a compreensão e definir os objetivos de cuidado desejados.93
PW (perilesional): avaliação da pele perilesionalOutro conceito atual definiu a importância da área perilesional, incluindo‐a inclusive ao final do TIMERS como PW (perilesional).55 Essa área merece atenção, pois pode apresentar hiperceratose, eritema, maceração, eczema, xerose, dermatite de contato (alérgica ou irritante) ou infecção.67,94 A figura 2 mostra as principais medidas direcionadas a cada condição nessa área.
Abordagem cirúrgicaO tratamento cirúrgico geralmente é reservado para feridas recalcitrantes ou feridas com perda total da pele e exposição de estruturas mais profundas, como fáscia muscular ou osso (estágios 3 e 4 – tabela 2).55,95,96 A cirurgia reconstrutiva geralmente inclui o desbridamento da ferida seguido pelo preenchimento da ferida com novo tecido. A abordagem cirúrgica envolve uma equipe multidisciplinar, incluindo a expertise de um cirurgião plástico. Uma revisão sistemática para avaliar os efeitos de diferentes tipos de cirurgia reconstrutiva no tratamento de LP, em comparação com a ausência de cirurgia ou abordagens cirúrgicas reconstrutivas alternativas, incluiu apenas um ensaio clínico randomizado.97 Este ensaio incluiu 20 participantes com LP isquiática ou sacral em estágio 4. O estudo comparou duas técnicas reconstrutivas: cirurgia de retalho convencional e cirurgia de retalho de cone de pressão, na qual uma grande porção da ponta do retalho é desepitelizada e profundamente inserida para obliterar o espaço morto. Os desfechos sobre cicatrização completa da ferida, deiscência da ferida, recorrência de LP e infecção da ferida foram coletados. As evidências para esses desfechos apresentaram certeza muito baixa. Os autores concluíram que há muito pouca evidência randomizada sobre o papel da cirurgia reconstrutiva no tratamento de LP, embora seja considerada uma área prioritária. Pesquisas mais rigorosas e robustas são necessárias para explorar essa intervenção.
| Resumo – classificação de LP | Nível de exsudato | Recomendações de tratamento (remover e tratar a causa) | Curativos, produtos e medidas recomendadas |
|---|---|---|---|
| Estágio 1 LP | |||
| Eritema que não embranquece, pele intacta | Ausente | Evitar atrito na área ao aplicar cremes hidratantes e durante o banho. Concentrar‐se no alívio da pressão na área e na reavaliação diária | • Película/creme de barreira quando necessário |
| • Curativos de espuma de cinco camadas com ou sem adesivo de silicone | |||
| Estágio 2 LP | |||
| Perda superficial de pele envolvendo a epiderme/derme superior | Bolha intacta | Manter intacta, protegendo a área com curativo adequadoDependendo da localização, tamanho e características da bolha, pode ser realizada aspiração com técnica asséptica para evitar ruptura e exposição à infecção | • Curativos de espuma com ou sem adesivo de silicone• Curativos de colágeno ou acrílico |
| Pele lesionada com exsudato mínimo | Promover o tratamento com ambiente úmido, porém equilibradoAtentar para sinais de infecção e coloração do exsudato | • Curativos de espuma com ou sem adesivo de silicone• Curativo hidrocoloide, acrílico, colágeno/composto | |
| Estágio 3 LP | |||
| Danos em toda a espessura do tecido subcutâneo, mas não atingindo a fáscia muscular | Exsudato baixo/moderado | Manter o tratamento úmidoAvaliar a presença de tecido necrótico que necessite de desbridamento e estabilizar os tecidos viáveisManejo do equilíbrio bacteriano/biofilme | • Hidrogela se for necessário desbridamento autolítico• Géis antimicrobianos, como poli‐hexametileno biguanida, se houver infecção local• Curativos absorventes para exsudação moderada, como curativos de espuma e fibras gelificantesb |
| Alto exsudato | O aumento do exsudato pode ser indicativo de infecçãoAvaliar se há tecido necrótico que necessite de desbridamento e estabilizar os tecidos viáveisControlar o equilíbrio bacteriano/biofilmeProteger as bordas com cremes de barreira | • Curativos superabsorventes, como espumas de polímero, curativos de prata (p. ex., curativos de fibra gelificante ou de espuma com pratab)• Curativos de alginatob• Curativos de colágenob• Terapia de feridas por pressão negativa | |
| Estágio 4 LP | |||
| Perda total da espessura da pele afetando músculos e/ou ossos | Exsudato baixo/moderado | Manter o tecido de granulaçãoAvaliar se há tecido necrótico que necessite de desbridamentoManter o equilíbrio bacteriano/biofilmeEstar atento à osteomielite (osso exposto ou palpável) | •Curativos absorventes para exsudação moderada, como curativos de espuma, fibras gelificantesb• Curativos absorventes para infecção: curativos de espuma com prata,b curativos de fibras gelificantes com prata,b gel de PHMB,a iodo cadexômeroa |
| Alto exsudato | Aumento do exsudato pode indicar infecção – ficar atento à osteomielite (osso exposto ou palpável)Avalir se há tecido necrótico que necessite de desbridamento e estabilizar os tecidos viáveisControlar o equilíbrio bacteriano/biofilmeProteger as bordas com cremes de barreira | • Curativos de alta absorção, como espumas e curativos de íons de pratab• Terapia de feridas por pressão negativa | |
| LP não classificável | |||
| Qualquer ferida completamente coberta por tecido necrótico sem visualização do leito da ferida | Ausente | Facilitar o desbridamento (se a ferida tiver capacidade de cicatrizar) ou proteger (manter o tecido necrótico seco se a cicatrização não for o objetivo do tratamento da ferida isquêmica (DIP estágios C)Desbridamento instrumental se houver circulação sanguínea adequada e o paciente não estiver anticoaguladoCombinar os métodos de desbridamentoPrestar atenção à dor do paciente | • Abaixo do joelho ‐ procurar manter a ferida seca até que a avaliação vascular seja determinada. Aplicar iodopovidona 10%a no leito da ferida. Manter a ferida seca até que a avaliação vascular seja determinada (descartar lesão isquêmica); após isso, é possível realizar o desbridamento cirúrgico• Acima do joelho – considerar gel antimicrobiano (poli‐hexametileno biguanida)a para auxiliar no desbridamento autolítico• Em caso de sangramento leve, usar curativo de alginato de cálcio e sódioa para hemostasia ou produto hemostático. Em caso de sangramento intenso, procurar ajuda de um cirurgião treinado |
| LP de tecido profundo | |||
| Lesão bolhosa arroxeada, com hematoma ou cheia de sangue em área de proeminência óssea | Ausente | Evitar atrito na área ao aplicar hidratantes e durante o banhoConcentrar‐se em aliviar a pressão na área e fazer reavaliação diária | • Protetores de pele• Creme de barreira/película• Curativos de espuma de silicone |
| Ruptura superficial com exsudato (pode ocorrer dias após o início da lesão por pressão) | Manter o tratamento úmidoAvaliar o tecido necrótico e proceder com cautela ao desbridamento. Em casos de isquemia profunda, evitar desbridamento em áreas com circulação comprometidaSe necessário, fazê‐lo de maneira suave e superficial, preservando o tecido viável | Dependendo do exsudato:• Espumas de silicone para cobertura atraumática, ou• Curativos absorventes para exsudação moderada, como curativos de fibras gelificantes e espumas | |
| Bolha de sangue | Inspecionar a lesão para verificar melhora ou piora e monitorar o retorno capilarA aspiração com técnica asséptica pode ser realizada para prevenir ruptura e exposição à infecção | • Curativo de espuma de silicone com cinco camadas• Curativo absorvente se houver exsudato abundante | |
| LP relacionada a dispositivos médicos | |||
| Tem o formato do aparelho e segue a mesma classificação acima, e o mesmo tratamento de acordo com a profundidade e localização | O exsudato varia de acordo com o estágio de envolvimento e a fase de cicatrização | Controlar umidadeConcentrar‐se na facilidade de aplicação e remoção do curativoPermitir a avaliação da condição da peleAvaliar a presença de infecção/biofilme | • Tratamento de acordo com a localização e estágio da lesão por pressão• Combinar a cobertura da ferida com a proteção do dispositivo médico• Incluir o uso de almofadas, coberturas ou materiais de proteção que não apenas evitem pressão adicional na área, mas também permitam acesso fácil e seguro ao dispositivo, minimizando o risco de contaminação e infecção |
| LP em membranas mucosas | |||
| Geralmente causada por dispositivos médicos em membranas mucosas em áreas como as cavidades vaginal, retal, uretral e oral | Ausente ou exsudativo | Eritema não branqueável não é visível nas membranas mucosasVerificar se há acúmulo de líquidoReposicionar e ajustar os dispositivos médicos regularmente para evitar pressão prolongada em um único pontoRemover o dispositivo assim que clinicamente possívelAvaliar se há infecção por fungos/leveduras | Mucosa:• Limpar cuidadosamente a lesão com água ou soro fisiológico e soluções apropriadas para mucosas, evitando irritantes• Aplicar soluções apropriadas para a área• Usar antimicrobianos tópicos/sistêmicos conforme necessárioPele:• Área superficial da narina: manter a área protegida e considerar o uso de parafina branca suave• Se houver perda de tecido mais profundo e o exsudato precisar ser controlado, considerar o uso de curativo de espuma de silicone• Tecido necrótico: manter intacto e proteger com curativo de barreira |
É importante enfatizar que a escolha de qualquer curativo ou produto deve considerar TIMERS, a localização e o tamanho da lesão, principalmente em terapias avançadas. Outra consideração é a relação custo‐efetividade e a escolha de opções adequadas e consistentes com a condição social do paciente e os objetivos do tratamento, com abordagem focada sempre que relevante para infecção/biofilme, visto que muitos produtos são incompatíveis e não devem ser usados em feridas infectadas.1
Com base em diretrizes,7,55 as indicações mais utilizadas de acordo com a classificação de LP foram resumidas na tabela 2. Um algoritmo com base na classificação de profundidade, infecção e perfusão (DIP) também é útil para o clínico na avaliação inicial, classificação e tratamento de LP.95,96
Prognóstico e complicações de lesões por pressãoEm geral, a ocorrência de LP está relacionada a período prolongado de hospitalização, e os pacientes que as desenvolvem têm maior probabilidade (22,5%) de não sobreviver.39 Além disso, as LP estão associadas a diversas complicações de curto e longo prazo, incluindo infecção, transformação maligna (úlcera de Marjolin – fig. 3), fístulas para estruturas e órgãos próximos, ossificação heterotópica, amiloidose sistêmica decorrente de estado inflamatório crônico (causando sintomas como fadiga, perda ponderal, inchaço, problemas cardíacos, disfunção renal, neuropatia e problemas gastrintestinais), rabdomiólise decorrente de pressão e isquemia prolongadas, bem como recorrência das próprias LP98 e até mesmo morte.
A complicação mais comum e grave das LP é a infecção, que pode incluir celulite, abscesso, osteomielite, bursite, artrite séptica, fasciíte necrosante, sepse e morte. Frequentemente, é causada por múltiplos microrganismos e apresenta resistência a diversos medicamentos e antimicrobianos, formando biofilme, o que dificulta a cicatrização, impedindo a migração dos queratinócitos.77
Equipe multidisciplinarEm virtude do amplo impacto, as LP requerem abordagem multidisciplinar. Conforme discutido, as LP são um evento adverso que pode ocorrer por diversos fatores. O conhecimento baseado em evidências desses fatores de risco é essencial para todos os profissionais de saúde, visto que a prevenção e o tratamento ideais só podem ser garantidos por meio de colaboração próxima e confiável.99 A comunicação entre a equipe médica e a equipe de enfermagem é crucial para garantir a conscientização sobre condições ou sintomas relevantes para o desenvolvimento de LP, como diabetes, hipoalbuminemia, anemia e hipotensão.99 Além das equipes médica e de enfermagem, os fisioterapeutas são essenciais no tratamento de LP, utilizando técnicas para melhorar a mobilidade, reduzir a pressão em áreas vulneráveis com leitos especiais e suportes de mobilização, e auxiliar no autocuidado.7 Nutricionistas e outros membros da equipe multidisciplinar são importantes para o cuidado e a atenção holísticos aos pacientes com LP.7 A expertise de um cirurgião plástico é necessária para abordagens cirúrgicas reconstrutivas, como retalhos locais para LP recalcitrantes ou em estágios 3 e 4. Dermatologistas são essenciais para realizar diagnósticos diferenciais e biopsias, recomendar cuidados adequados para a pele circundante e indicar tratamentos adequados e curativos especializados.100
Considerações finaisEsta revisão expandiu o conhecimento e as práticas baseadas em evidências para o manejo adequado de pacientes em risco e com LP, detalhando as terapias atuais e inovadoras, bem como as convencionais.
Alguns pontos‐chave desta revisão incluem: 1) a avaliação de risco para o desenvolvimento de LP deve ser estruturada, incluindo escala de predição de risco válida e confiável, avaliação completa da pele e interpretação crítica dos resultados; 2) os pacotes de prevenção (avaliação de risco, controle de umidade, mobilidade do paciente, nutrição e superfícies de suporte) devem ser implementados em conjunto para impactar os resultados do paciente melhor do que intervenções individuais; 3) o primeiro passo no caminho do cuidado para LP é aliviar a pressão nas áreas afetadas e prevenir o desenvolvimento de lesões em novas áreas; 4) a sigla TIMERS é essencial para facilitar o tratamento eficiente de úlceras, com foco na avaliação rigorosa do leito da ferida e na implementação de intervenções para otimizar o processo de cicatrização; 5) as LP estão associadas a diversas complicações de curto e longo prazo, incluindo infecção, transformação maligna (úlcera de Marjolin), fístulas e rabdomiólise, bem como recorrência das próprias LP e até mesmo morte.
Espera‐se que esta revisão sirva como ferramenta de apoio à decisão para profissionais de saúde e como um guia prático para qualificações e estudos nessa área crítica e altamente prevalente.
Suporte financeiroNenhum.
Contribuição dos autoresBruna Cristina Velozo: Concepção e planejamento do estudo; Levantamento bibliográfico, Redação do artigo; Revisão crítica de literatura; Revisão crítica do manuscrito; Aprovação da versão final do manuscrito.
Michelle Venâncio Hong: Concepção e planejamento do estudo; Levantamento bibliográfico, redação do artigo; Revisão crítica de literatura; Revisão crítica do manuscrito; Aprovação da versão final do manuscrito.
Larissa Cassiano Bernardo: Concepção e planejamento do estudo; Levantamento bibliográfico, redação do artigo; Revisão crítica de literatura; Revisão crítica do manuscrito; Aprovação da versão final do manuscrito.
Meire Cristina Novelli e Castro: Concepção e planejamento do estudo; Levantamento bibliográfico, redação do artigo; Revisão crítica de literatura; Revisão crítica do manuscrito; Aprovação da versão final do manuscrito.
Luciana Patrícia Fernandes Abbade: Concepção e planejamento do estudo; Levantamento bibliográfico, redação do artigo; Revisão crítica de literatura; Revisão crítica do manuscrito; Aprovação da versão final do manuscrito.
Disponibilidade de dados de pesquisaNão se aplica.
Conflito de interessesNenhum.
EditorHiram Larangeira de Almeida Jr.
Como citar este artigo: Velozo BC, Hong MV, Bernardo LC, Novelli e Castro MC, Contreras‐Ruiz J, Abbade LPF. Pressure Injuries: prevention, treatment, and complications – Part II. An Bras Dermatol. 2025;100:501215.
Trabalho realizado no Departamento de Doenças Infecciosas, Dermatologia, Diagnóstico por Imagem e Radioterapia, Faculdade Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil.






