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Vol. 100. Núm. 6.
(Novembro - Dezembro 2025)
Cartas ‐ Caso clínico
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Síndrome VEXAS: manifestações cutâneas e variações do gene UBA1 no diagnóstico de síndrome autoinflamatória rara – Relato de caso
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Isabel Crivelatti
Autor para correspondência
isabel.crivelatti@gmail.com

Autor para correspondência.
, Shirley Massimo de Souza, Oscar Cardoso Dimatos, Gabriella Di Giunta Funchal, Andressa Miozzo Soares, Amanda Amaro Pereira
Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil
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Prezado Editor,

A síndrome VEXAS (SV) é doença autoinflamatória rara, descrita recentemente, que acomete principalmente homens com mais de 50 anos e é causada por mutações somáticas do gene UBA1, localizado no cromossomo X.1,2 O quadro clínico inclui sintomas constitucionais (febre, sudorese noturna, fadiga, perda ponderal) e manifestações hematológicas, musculoesqueléticas, cardiopulmonares e cutâneas (fig. 1).2–6

Figura 1.

Manifestações clínicas da síndrome VEXAS.

O envolvimento da pele ocorre em 80% a 100% dos casos e caracteriza‐se por pápulas e placas eritematosas e/ou violáceas, às vezes edematosas, predominantemente em dorso, membros superiores, pescoço e face. Nos membros inferiores, observam‐se, sobretudo, pápulas e placas eritematosas a purpúricas.7 O quadro cutâneo é frequentemente diagnosticado, inicialmente, como síndrome de Sweet ou vasculite com base nos achados histopatológicos de dermatose neutrofílica e vasculite leucocitoclástica, respectivamente.1 Embora não haja critérios diagnósticos estabelecidos na SV, a avaliação da medula óssea é essencial para identificar vacúolos citoplasmáticos em precursores mieloides e eritroides. Entretanto, para o diagnóstico definitivo, a confirmação genética de mutações no gene UBA1 é necessária.8

O tratamento é ainda incerto, e os glicocorticoides são os medicamentos mais úteis.8 O prognóstico é reservado, com mortalidade de 30% a 40% em cinco anos.7 Porém, transplante de medula óssea e terapias de edição genética parecem promissoras, segundo estudos recentes.9 O objetivo deste relato de caso foi destacar as manifestações cutâneas na SV e reforçar a importância do teste genético no prognóstico do paciente e na compreensão da SV.

Paciente do sexo masculino, de 64 anos, procurou a emergência por perda de 16kg nos últimos seis meses, sangue nas fezes há cinco meses, anemia há quatro meses, história de fadiga há um mês e febre aferida acima de 38°C há três dias. Referia ainda o surgimento de lesões cutâneas assintomáticas há uma semana. O exame físico revelou placas urticariformes no tronco, dorso, membros superiores, palmas, plantas e face e de máculas e pápulas violáceas, que não desapareciam à digitopressão, nos membros inferiores (fig. 2A–B). Os exames laboratoriais revelaram elevação sérica da proteína‐C‐reativa, com valor de 152mg/L, anemia macrocítica com hemoglobina de 6,2g/dL e volume corpuscular médio de 116,5 fL, neutrofilia de 14.400μL, dos quais 23% de bastões (3.319μL) e plaquetopenia de 53.000μL.

Figura 2.

Manifestações cutâneas. (A) Pápulas e placas eritematovioláceas, com edema em bordas, algumas com tendência a coalescer, no dorso. (B) Púrpura palpável nos membros inferiores.

Foram realizadas biopsias das lesões da pele no tronco, compatíveis com síndrome de Sweet, e no membro inferior esquerdo, compatíveis com vasculite leucocitoclástica (fig. 3). O exame de imunofluorescência direta das lesões no membro inferior não evidenciou depósitos imunes.

Figura 3.

Achados histopatológicos. Biopsia de lesão no tronco evidencia infiltrado mono e polimorfonuclear, com neutrófilos particulados e hemácias extravasadas, sem sinais de vasculite (A, Hematoxilina & eosina, 200×; B, Hematoxilina & eosina, 400×). Biopsia de lesão em membro inferior demonstra hemácias extravasadas, infiltrado inflamatório misto perivascular com leucocitoclasia e presença de trombos de fibrina na parede dos capilares (C, Hematoxilina & eosina, 100×; D, Hematoxilina & eosina, 400×).

Para manejo inicial, foi prescrito prednisona na dose de 1mg/kg/dia, com melhora significante das lesões após 48 horas do início do corticoide. Além disso, foi introduzida antibioticoterapia para o quadro de febre associada a leucocitose com desvio à esquerda no leucograma e eritropoetina para anemia.

O mielograma identificou achados sugestivos de síndrome mielodisplásica, e a biopsia de medula óssea evidenciou hipercelularidade com alterações mielodisplásicas/mieloproliferativas associada a megacariocitose e mielofibrose grau 1. Em virtude desses achados, foi levantada a hipótese de SV. O sequenciamento genético de espécimes de medula óssea do paciente evidenciou a presença da mutação c.1741+15G>A no gene UBA1 (fig. 4).

Figura 4.

Teste genético do gene UBA1 com sequenciamento do DNA pelo método de Sanger dos éxons 3, 14, 15 e 16. Identificada mutação entre os éxons 15 e 16, com troca da base nitrogenada G por A.

As alterações cutâneas, presentes na maioria dos pacientes com SV, são geralmente a primeira manifestação da síndrome, reforçando o papel essencial do dermatologista no reconhecimento precoce da doença. Diante de um caso de síndrome de Sweet, associado ao achado de vasculite nos membros inferiores e a sintomas constitucionais, além de acometimento de outros sistemas, principalmente hematológico, em homens com mais de 50 anos, deve ser aventada SV como diagnóstico diferencial.

O reconhecimento oportuno e precoce de casos suspeitos acarreta assertividade na solicitação do teste genético. A identificação de novas variantes somáticas patogênicas no gene UBA1 possibilita direcionar a avaliação genética, tornando‐a mais rápida e eficaz. Possivelmente ainda há inúmeras variantes patogênicas ainda não descritas relacionadas à SV. O sequenciamento genético desse paciente identificou uma variante de significado incerto, visto que não se encontra entre as já descritas até o momento (fig. 4).10 Por isso, presume‐se que se trata de mais uma variante relacionada à SV ainda não reconhecida.

A conscientização sobre a SV pelo dermatologista é fundamental para facilitar o diagnóstico precoce. Novas variantes patogênicas no gene UBA1 identificadas na SV devem ser documentadas para melhor entendimento da doença e para avaliação genética mais eficiente, objetivando mitigar a alta morbimortalidade.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Isabel Crivelatti: Concepção e o desenho do estudo; redação do artigo ou revisão crítica do conteúdo intelectual importante.

Shirley Massimo de Souza: Obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa.

Oscar Cardoso Dimatos: Redação do artigo ou revisão crítica do conteúdo intelectual importante; participação efetiva na orientação da pesquisa.

Gabriella Di Giunta Funchal: Levantamento dos dados, ou análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura.

Andressa Miozzo Soares: Redação do artigo ou revisão crítica do conteúdo intelectual importante; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Amanda Amaro Pereira: Levantamento dos dados, ou análise e interpretação dos dados; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Disponibilidade de dados de pesquisa

Não se aplica.

Conflito de interesses

Nenhum.

Editor

Ana Maria Roselino.

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Como citar este artigo: Crivelatti I, Souza SM, Dimatos OC, Funchal GG, Soares AM, Pereira AA. VEXAS syndrome: cutaneous manifestations and UBA1 gene variants in the diagnosis of a rare autoinflammatory syndrome – A case report. An Bras Dermatol. 2025;100:501233.

Trabalho realizado no Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago, Florianópolis, SC, Brasil.

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