Compartilhar
Informação da revista
Visitas
9
Vol. 100. Núm. 6.
(Novembro - Dezembro 2025)
Cartas ‐ Investigação
Acesso de texto completo
Redução da sensibilização ao cromo: análise retrospectiva de 2010 a 2024 em serviço de alergia dermatológica
Visitas
9
Mariana de Figueiredo Silva Hafnera,
Autor para correspondência
mariana@hafner.med.br

Autor para correspondência.
, Ida Alzira Gomes Duartea, Bruna Cavaleiro de Macedo Souzaa, Rosana Lazzarinib
a Clínica de Dermatologia, Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
b Faculdade de Ciências Médicas, Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
Este item recebeu
Informação do artigo
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Tabelas (6)
Tabela 1. Pacientes testados no período 2010–2024 e frequência de testes positivos ao bicromato de potássio (BP)
Tabelas
Tabela 2. Distribuição dos pacientes com teste de contato positivo ao bicromato de potássio, de acordo com gênero; período 2010–2024
Tabelas
Tabela 3. Distribuição da dermatite de contato ao bicromato de potássio de acordo com a localização; período 2010–2024
Tabelas
Tabela 4. Distribuição dos pacientes com teste de contato positivo ao bicromato de potássio, de acordo com profissão; período 2010–2024
Tabelas
Tabela 5. Número de pedreiros atendidos; período 2010–2024
Tabelas
Tabela 6. Distribuição dos pedreiros atendidos em cada grupo e a presença de testes positivos ao BP; período 2010–2024
Tabelas
Mostrar maisMostrar menos
Texto Completo
Prezado Editor,

Entre os agentes mais envolvidos na dermatite alérgica de contato (DAC) estão os metais, especialmente o cromo (Cr), presente no cimento, couro, produtos de limpeza e cosméticos.1 O bicromato de potássio (BP) é o composto utilizado como marcador da sensibilização ao Cr nos testes de contato (TC). Estudos anteriores apontaram frequências de sensibilização ao Cr variando entre 12% e 47%, com tendência de redução após regulamentações em países europeus.2 No Brasil, embora ainda sem legislação específica, observações clínicas sugerem uma diminuição progressiva dos casos.

Foi realizado estudo retrospectivo em ambulatório de alergia dermatológica, entre 2010 e 2024, incluindo 1.599 pacientes com suspeita de DAC submetidos ao TC. Utilizou‐se a bateria preconizada pelo Grupo Brasileiro de Estudos em Dermatite de Contato (GBEDC) aplicada no dorso dos pacientes. A leitura dos TC foi realizada em 48 e 96 horas, esta última considerada para análise. Os pacientes foram agrupados por quinquênios: 2010–2014 (grupo A), 2015–2019 (grupo B) e 2020–2024 (grupo C). Analisaram‐se gênero, ocupação, localização da dermatose e TC positivos ao BP, com análise estatística pelo Qui‐Quadrado (χ2).

Entre os 1.599 pacientes testados, 111 (6,9%) apresentaram positividade ao BP. A frequência foi de 11,4% no grupo A; 5,6% no grupo B e 3,6% no grupo C, com diferença estatisticamente significante entre os períodos (p <0,05), indicando redução consistente ao longo dos anos (tabela 1). Embora a maioria dos casos tenha ocorrido em homens, não se observou diferença estatisticamente significante entre os períodos quanto à proporção de gêneros, sugerindo redução uniforme entre homens e mulheres (tabela 2).

Tabela 1.

Pacientes testados no período 2010–2024 e frequência de testes positivos ao bicromato de potássio (BP)

Grupo  Pacientes testados  BP (+)  BP (–) 
A (2010–14)  544  62  482 
B (2015–19)  557  31  526 
C (2020–24)  498  18  480 
Total  1599  111  1488 

χ2=23,57/p <0,0001.

Tabela 2.

Distribuição dos pacientes com teste de contato positivo ao bicromato de potássio, de acordo com gênero; período 2010–2024

Período/gênero  Masculino  Feminino  Total 
A (2010–14)  45 (72,5%)  17 (27,5%)  62 
B (2015–19)  20 (64,5%)  11 (35,5%)  31 
C (2020–24)  11 (61%)  7 (39%)  18 
Total  76 (68,5%)  35 (31,5%)  111 

χ2=1,283/p> 0,05.

A principal localização da dermatite foi nas mãos (81% dos casos), seguida por membros superiores (42%), tronco e cabeça (16% cada), membros inferiores (14%) e pés (10%) (tabela 3). Entre os casos com acometimento plantar, oito estavam associados ao uso de calçados de couro, material que pode conter Cr em sua fabricação. A ocupação mais frequentemente associada à positividade do Cr foi a de pedreiro (46%), seguida por “do lar” (30,5%), trabalhadores de escritório (11%), mecânicos e aposentados (4,5% cada) (tabela 4).

Tabela 3.

Distribuição da dermatite de contato ao bicromato de potássio de acordo com a localização; período 2010–2024

Localização/período  MMSSa  Mãos  MMIIb  Pés  Tronco  Segmento cefálico 
A (2010–2014)  23  48  13 
B (2015–2019)  12  24 
C (2020–2024)  11  18 
Totalc  46 (42%)  90 (81%)  15 (14%)  11 (10%)  18 (16%)  18 (16%) 
a

Membros superiores.

b

Membros inferiores.

c

Valor maior que o número de pacientes com testes positivo ao BP, já que alguns pacientes tinham mais de uma localização.

Tabela 4.

Distribuição dos pacientes com teste de contato positivo ao bicromato de potássio, de acordo com profissão; período 2010–2024

Profissão/período  Pedreiro  Do lar  Mecânico  Escritório  Aposentado  Outra  Total 
A (2010–14)  36  16  62 
B (2015–19)  12  12  31 
C (2020–24)  18 
Total  51  34  12  111 

Durante o período analisado, foram atendidos 78 pedreiros, com distribuição decrescente ao longo dos anos (p <0,001; tabela 5). A frequência de testes positivos ao BP entre os pedreiros também apresentou redução significante (p <0,006). Do total de pedreiros, 27 apresentaram testes negativos ao BP (tabela 6).

Tabela 5.

Número de pedreiros atendidos; período 2010–2024

Período  Pedreiro  Não pedreiro  Total 
A (2010–14)  49  495  544 
B (2015–19)  19  538  557 
C (2020–24)  10  488  498 
Total  78  1521  1599 

χ2=30,89/p <0,001.

Tabela 6.

Distribuição dos pedreiros atendidos em cada grupo e a presença de testes positivos ao BP; período 2010–2024

Período  Pedreiro BPPedreiro BP–  Total 
A (2010–14)  36  13  49 
B (2015–19)  12  19 
C (2020–24)  10 
Total  51  27  78 

χ2=14,76/p <0,006.

Esses achados indicam redução progressiva na sensibilização ao Cr em nossa população ao longo dos últimos 15 anos. Essa tendência acompanha o que já foi observado em países europeus após a implementação de restrições ao teor de Cr em cimento e couro, como estabelecido pela Diretiva Europeia 2003/53/EC, que limita o Cr hexavalente a 2ppm no cimento.3,4 No Brasil, embora tal regulamentação ainda não exista, um estudo de 2009 detectou níveis acima do limite europeu em amostras nacionais de cimento.5 Apesar disso, nossos dados sugerem queda real na sensibilização, possivelmente influenciada por fatores como melhoria nas condições de trabalho, maior uso de equipamentos de proteção individual (EPIs), substituição de materiais contaminantes (p.ex., tijolos refratários que compõem os fornos utilizados na manufatura do cimento)6,7 e retirada do Cr de produtos de limpeza, detergentes e cosméticos.8

A predominância de pedreiros e donas de casa entre os sensibilizados reflete a exposição direta ao Cr presente no cimento e em produtos domésticos, respectivamente. A redução de atendimentos entre pedreiros e da positividade nessa população sugere que medidas preventivas podem estar sendo mais efetivamente aplicadas, ainda que informalmente, no setor da construção civil. A distribuição anatômica das lesões, principalmente nas mãos, é compatível com o padrão de exposição ocupacional.9,10

Em síntese, este estudo evidencia redução consistente na sensibilização ao Cr ao longo dos últimos 15 anos, mesmo na ausência de regulamentações nacionais específicas. A tendência observada pode ser resultado de um conjunto de fatores, incluindo mudanças nos processos industriais, substituição de materiais e maior conscientização de empregadores e trabalhadores sobre os riscos da DAC. Tais dados reforçam a importância de ações preventivas e regulamentações que limitem a presença de alérgenos em materiais de uso profissional e doméstico.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Mariana de Figueiredo Silva Hafner: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Ida Duarte: Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Bruna Cavaleiro de Macedo Souza: Obtenção, análise e interpretação dos dados; aprovação da versão final do manuscrito.

Rosana Lazzarini: Revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito; aprovação da versão final do manuscrito.

Disponibilidade de dados de pesquisa

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

Conflito de interesses

Nenhum.

Editor

Sílvio Alencar Marques

Referências
[1]
I. Duarte, R.F. Mendonça, K.L. Korkes, R. Lazzarini, M.F.S. Hafner.
Nickel, chromium and cobalt: the relevant allergens in allergic contact dermatitis. Comparative study between two periods: 1995‐2002 and 2003‐2015.
An Bras Dermatol., 93 (2018), pp. 59-62
[2]
M.J. Reeder, A. Idrogo-Lam, S.R. Aravamuthan, E.M. Warshaw, J.G. DeKoven, J.I. Silverberg, et al.
Occupational contact dermatitis in construction workers: a retrospective analysis of the north american contact dermatitis group data, 2001‐2020.
Dermatitis., 35 (2024), pp. 467-475
[3]
N.M. Bonefeld, T. Menné, U. Ahrensbøll-Friis, Gadsbøll AØ, C.W. Wang, T.G. Theander, et al.
High content of hexavalent chromium in cement samples from three African countries.
Contact Dermatitis., 91 (2024), pp. 436-438
[4]
L. Bensefa-Colas, S.J. Stocks, R. McNamee, S. Faye, F. Pontin, R.M. Agius, RNV3P members, et al.
Effectiveness of the European chromium(vi) directive for cement implementation on occupational allergic contact dermatitis occurrence: assessment in France and the U.K..
Br J Dermatol., 177 (2017), pp. 873-876
[5]
W. Matos, J. Nóbrega.
Especiação de cromo em cimentos e derivados de cimento brasileiros.
Quimica Nova, (2009),
[6]
A. Friedman, G. Amit.
Chromium in refractories: properties applications.
J Mater Sci., 45 (2010), pp. 897-907
[7]
F. Perez- Cabalero, F. Cortes.
Sustainability in refractory manufacturing: chromium‐free solutions.
J Cleaner Prod., 258 (2020), pp. 120-130
[8]
K. Kridin, R. Bergman, M. Khamaisi, S. Weltfriend.
Chromate allergy in northern Israel in relation to exposure to cement and detergents.
Dermatitis., 27 (2016), pp. 131-136
[9]
I. Duarte, A. Rotter, R. Lazzarini.
Frequency of occupational contact dermatitis in an ambulatory of dermatologic allergy.
An Bras Dermatol., 85 (2010), pp. 455-459
[10]
R. Lazzarini, M.F.S. Hafner, N.M. Suzuki, I.M. Pasotti, M.R.P.L. Kraft.
Occupational contact dermatitis: analysis of cases observed in a service not specialized in occupational dermatosis between 2004 and 2017.
An Bras Dermatol., 97 (2022), pp. 105-107

Como citar este artigo: Hafner MFS, Duarte IAG, Souza BCM, Lazzarini R. Reduction in chromium sensitization: a retrospective analysis from 2010 to 2024 in a dermatology allergy service. An Bras Dermatol. 2025;100:501227.

Trabalho realizado na Clínica de Dermatologia, Santa Casa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

Copyright © 2025. Sociedade Brasileira de Dermatologia
Baixar PDF
Idiomas
Anais Brasileiros de Dermatologia (Portuguese)
Opções de artigo
Ferramentas