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Vol. 100. Núm. 5.
(setembro - outubro 2025)
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Xeroderma pigmentoso: experiência de 12 anos em seguimento por dermatoscopia digital e microscopia confocal de reflectância em um centro de câncer no Brasil
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Joyce Gouvêa Freire, Tatiana Cristina Moraes Pinto Blumetti, Rafaela Brito de Paula, Juliana Casagrande Tavoloni Braga
AC Camargo Cancer Center, São Paulo, SP, Brasil
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Tabela 1. Diagnóstico de melanoma e perfil de mutação
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Resumo
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Xeroderma pigmentoso (XP) é doença genética autossômica recessiva caracterizada por defeito na via de reparo por excisão de nucleotídeos (REN), responsável pelo reparo de danos ao DNA induzidos por raios ultravioleta. O sintoma mais comum em pacientes afetados é o aumento da fotossensibilidade, associado ao desenvolvimento precoce de malignidades cutâneas e internas.

Objetivo

Descrever se o seguimento de pacientes com xeroderma pigmentoso por meio de mapeamento corporal total (MCT) com dermatoscopia digital (DD) e microscopia confocal de reflectância (MCR) in vivo aumenta a detecção precoce de melanoma e reduz biopsias desnecessárias de lesões melanocíticas benignas.

Métodos

Doze pacientes com XP foram acompanhados por meio de MCT e DD de fevereiro de 2008 a março de 2020. O número de lesões melanocíticas excisadas (NNE) foi contado antes e depois da avaliação com MCT, DD e MCR.

Resultados

No período de rastreamento de 12 anos, 12 pacientes com XP foram acompanhados com MCT, DD e MCR. Houve aumento de melanomas mais finos e in situ diagnosticados após a implementação de MCT e DD no seguimento desse grupo (de 66% para 82%). A associação de tecnologias causou redução na NNE de 4,02 para 2,88 e promoveu a detecção precoce do melanoma.

Limitações do estudo

Manter o seguimento regular de alguns pacientes com XP pode ser desafiador em virtude de comorbidades e questões sociais. Embora o XP seja doença rara, isso representa um número especialmente pequeno de casos.

Conclusão

Pacientes com XP são geralmente submetidos a múltiplas excisões cirúrgicas, com alta morbidade. Com base na experiência dos autores, MCT, DD e MCR melhoraram a detecção precoce do melanoma e reduziram a NNE, com impacto positivo na saúde e na qualidade de vida dos pacientes.

Palavras‐chave:
Dermatoscopia
Melanoma maligno
Microscopia confocal de reflectância
Xeroderma pigmentoso
Texto Completo
Introdução

Xeroderma pigmentoso (XP) é doença genética autossômica recessiva caracterizada por defeito na via de reparo por excisão de nucleotídeos (REN). A via REN é responsável por reparar danos ao DNA induzidos pela radiação ultravioleta (UV); portanto, o sintoma mais comum em pacientes afetados é o aumento da fotossensibilidade, associado ao desenvolvimento precoce de malignidades cutâneas e internas.1

A doença é composta por oito grupos de complementação (A–G) com defeitos em diferentes etapas da via REN, e uma variante V do XP (XP‐V), que apresenta reparo normal de fotoprodutos, mas DNA polimerase n (pol n) defeituosa.1 Múltiplos cânceres de pele são mais comuns nos grupos XP‐C, XP‐E e XP‐V.2 A incidência de XP varia entre os diferentes países do mundo: no Japão, a incidência é de 1 em 20.000 a 40.000 nascidos vivos, enquanto nos EUA e na Europa é de 1 em 250.000 a 1.000.000 de nascidos vivos.3

As manifestações clínicas do XP são predominantemente cutâneas e oculares, mas achados neurológicos são relatados em alguns casos.1 A fotossensibilidade é a primeira manifestação cutânea e ocorre em 50% dos pacientes, caracterizada por queimadura solar exagerada (com bolhas e eritema prolongado) com exposição mínima aos raios UV.4 Sardas geralmente são observadas nos primeiros 2 anos de idade.1 Máculas hiperpigmentadas e hipopigmentadas, telangiectasias e fotoenvelhecimento prematuro também são observados na infância.

O diagnóstico precoce e as medidas de proteção solar são cruciais para a sobrevivência dos pacientes com XP. Indivíduos com menos de 20 anos apresentam risco 10.000 vezes maior de desenvolver câncer de pele não melanoma e 2.000 vezes maior de melanoma (MM) em comparação com a população em geral. A idade mediana de início do câncer de pele não melanoma é de 9 anos e, para o primeiro melanoma, é de 22 anos.1

Foi relatado que a dermatoscopia aumenta significantemente a sensibilidade e a especificidade do diagnóstico de melanoma em comparação com o exame a olho nu.5 No entanto, em pacientes com XP com alto número de lesões actínicas (lentigos solares, lentigos e elastose solar), o reconhecimento precoce de malignidades pode ser desafiador.6

Com o objetivo de melhorar o seguimento de pacientes com XP, poucos relatos mostraram que a dermatoscopia digital (DD) poderia ser útil. Salerni et al. sugeriram que o uso de fotografias basais e de seguimento da pele (fotografia de corpo inteiro), combinadas com DD, aumenta a precisão diagnóstica do melanoma maligno em pacientes de alto risco, incluindo aqueles com genodermatose semelhante ao XP. Nessa coorte, mais de 600 pacientes foram avaliados, embora apenas três fossem XP.7 Em 2005, Malvehy et al. descreveram a dermatoscopia de lesões cutâneas em dois pacientes com XP e, em 2009, Green et al. relataram o seguimento de uma paciente de 39 anos com XP utilizando exame e fotografia de corpo inteiro e dermatoscopia.6,8

A microscopia confocal de reflectância (MCR) in vivo, técnica de imagem não invasiva com resolução celular, possibilita a detecção precoce do melanoma com menor taxa de excisões.9 Já foi comprovado que a MCR melhora a precisão diagnóstica na detecção do câncer de pele quando combinada à dermatoscopia, especialmente para lesões de difícil diagnóstico.9–12 Em 2019, Rocha et al. publicaram pela primeira vez o uso da MCR em lesões suspeitas dermatoscópicas, melhorando a precisão diagnóstica de malignidade em pacientes com XP.13

Neste estudo, os autores descrevem sua experiência no seguimento de 12 pacientes com XP no Departamento de Oncologia Cutânea do AC Camargo Cancer Center, em São Paulo, com base na fotografia de corpo inteiro associada à DD e no uso da MCR como exame complementar para evitar excisões desnecessárias.

Objetivo

Descrever se o seguimento de pacientes com XP utilizando mapeamento corporal total (MCT) com DD e MCR in vivo aumenta a detecção precoce de melanoma e reduz biopsias desnecessárias de lesões melanocíticas benignas.

Métodos

Doze pacientes com XP foram recuperados retrospectivamente do Departamento de Oncologia Cutânea do AC Camargo Cancer Center, São Paulo, SP, Brasil. Eles foram acompanhados com fotografia de corpo inteiro e DD de fevereiro de 2008 a março de 2020. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do AC Camargo Cancer Center(CEP 1524/11). Esses pacientes também foram encaminhados para uma equipe multidisciplinar de cirurgiões oncologistas, para avaliação oncogenética e oftalmológica, se necessário (fig. 1).

Figura 1.

Fluxograma de pacientes com xeroderma pigmentoso.

O seguimento foi realizado a cada seis meses em consultas regulares de dermatologia. As consultas dermatológicas incluíram exame dermatológico completo com dermatoscópio manual (DermLite® DermLite LCC, Califórnia), bem como fotografia de corpo inteiro e DD com Fotofinder® (Fotofinder Systems GmbH, Alemanha).

Em uma primeira etapa, imagens de corpo inteiro anteriores e atuais foram comparadas, e alterações na cor, forma e tamanho das lesões pigmentadas foram avaliadas, e a busca por novas lesões foi realizada. A segunda etapa consistiu na avaliação das imagens de DD; as lesões melanocíticas previamente registradas foram comparadas com as imagens atuais, e novas lesões observadas foram incluídas. Lesões preexistentes ou novas lesões que apresentaram assimetria, coloração múltipla e pelo menos uma das características suspeitas dermatoscópicas associadas ao MM pela análise de padrão dermatoscópico foram incluídas.14 Nas lesões sob rastreamento, aumento de tamanho, alterações na cor e aparência das seguintes características dermatoscópicas foram consideradas suspeitas: glóbulos salpicados ou múltiplos marrons ou escuros com forma ou distribuição irregular, rede pigmentar proeminente, manchas e áreas sem estrutura. As lesões melanocíticas incluídas nos registros de DD que apresentavam características dermatoscópicas atípicas, mas sem alterações em relação às imagens anteriores, foram encaminhadas para seguimento. Novas lesões com características atípicas e aquelas com alterações sutis foram consideradas suspeitas e encaminhadas para MCR, enquanto lesões melanocíticas com características dermatoscópicas específicas de melanoma foram excisadas (conforme descrito na Análise de Padrões).14 Todas as etapas foram realizadas por dermatologistas certificados, sem o uso do sistema Fotofinder® baseado em inteligência artificial.

O exame de MCR foi realizado por dermatologista experiente, utilizando o microscópio confocal Vivascope 1500® (Lucid‐Tech, Rochester, Nova York, EUA). A avaliação da MCR foi baseada em características previamente descritas para lesões melanocíticas na população em geral, seguindo a terminologia de consenso em português brasileiro e traduzidas para o inglês para fins de publicação.9,10 Os critérios confocais da MCR indicativos de suspeita de melanoma incluíram a presença de padrão epidérmico desorganizado e células pagetoides na epiderme, papilas sem bordas, atipia celular na junção dermoepidérmica, ninhos atípicos e células nucleadas brilhantes na derme superior.9,10

O número necessário para excisão (NNE) foi calculado dividindo‐se o número total de lesões melanocíticas excisadas pelo número total de melanomas, independentemente de terem sido submetidos ou não à avaliação da MCR.

Resultados

Durante os 12 anos de seguimento, foram realizadas fotografias de corpo inteiro e DD, com mediana de seis exames por paciente (variação: 2 a 13). Três dos 12 pacientes realizaram apenas duas fotografias de corpo inteiro e DD durante o seguimento.

Cinco pacientes tiveram sua mutação molecular identificada: três mulheres no gene de reparo de DNA XP‐C (C.2251‐1G>C), uma mulher no XP‐C (C.2251‐1G>C e mutação nonsense c.1969G>T) e um homem no XP‐V (C.1221‐1224del; T408LfsX36) (tabela 1).

Tabela 1.

Diagnóstico de melanoma e perfil de mutação

Paciente  Idade na primeira DD  MM in situMM <1 mmMM> 1 mmTotal de melanomas  Mutação 
    Antes da DD  Apósa DD  Antes da DD  Após a DD  Antes da DD  Após a DD     
26  XP‐C (C.2251‐1G>C) 
18  23  31  XP‐C (C.2251‐1G>C e mutação nonsense c.1969G>T 
54  XP‐V (C.1221‐1224del; T408LfsX36 
41  13  NT 
13  XP‐C (C.2251‐1G>C) 
NT 
41  19  NT 
NT 
27  NT 
10  NT 
11  37  12  XP‐C (C.2251‐1G>C) 
12  39  33  14  54  NT 
Total    58  56  24  9  4  3  154   

DD, dermoscopia digital; MM, melanoma; NT, não testado.

Entre os 12 pacientes com XP, seis (50%) eram mulheres e dois eram da mesma família (irmão e irmã). A média de idade no primeiro exame com fotografia de corpo inteiro e DD foi de 27 anos (variação: 7 a 54 anos). Os pacientes mais jovens e mais velhos submetidos à DD tinham 7 e 54 anos, respectivamente.

De acordo com os dados, todos os pacientes desenvolveram câncer de pele antes dos 11 anos; a mais jovem desenvolveu um carcinoma basocelular (CBC) aos 4, enquanto seu primeiro melanoma foi diagnosticado aos 15 anos. O paciente mais jovem com melanoma diagnosticado durante o seguimento era um menino de 7 anos.

Onze pacientes tinham histórico prévio de remoção cirúrgica de carcinoma espinocelular (CEC; n=33) e/ou CBC (n=254) e oito pacientes de melanoma (n=88) antes da primeira fotografia de corpo inteiro e DD. Cinquenta e oito (66%) de todos os MM excisados eram in situ, 24 (27%) foram classificados como melanoma fino (Breslow ≤ 1mm) e quatro (5%) eram melanoma espesso (Breslow> 1mm). O subtipo histopatológico mais frequentemente encontrado foi o melanoma extensivo superficial, e a maior espessura de Breslow foi de 1,55mm. Os melanomas localizaram‐se predominantemente no tronco (n=33), seguidos pelos membros superiores (n=24), membros inferiores (n=22) e cabeça e pescoço (n=8; tabela 1).

Durante o seguimento, com base em fotografia de corpo inteiro e DD, 187 CBC, 51 CEC e 68 MM foram excisados. Entre os melanomas excisados, 56 (82%) eram in situ, nove (13%) com Breslow<1mm, um com Breslow 1,8mm, um com Breslow 8mm (subtipo desmoplásico) e o outro era um melanoma dérmico primário. Não foram observadas metástases de melanoma. Antes do período de seguimento, 66% (n=58) de todos os melanomas excisados eram in situ e, após o período de seguimento, esse valor aumentou para 82% (n=56).

As características dermatoscópicas encontradas nos melanomas invasivos foram: rede pigmentar atípica (90%), manchas (40%), glóbulos irregulares (30%), véu azul‐esbranquiçado (30%), vasos pontilhados (30%), vasos polimórficos (20%), áreas sem estrutura (10%), estrias branco‐brilhantes (10%) e áreas vermelho‐leitosas (10%; tabela 1; figs. 2‐6).

Figura 2.

Padrões de dermatoscopia de lesões melanocíticas benignas e malignas observadas em paciente com xeroderma pigmentoso. (A) Aspecto clínico de tronco cutâneo mostrando múltiplas sardas e lesões pigmentadas. (B–C) Dermatoscopia de lesões pigmentadas com padrão reticular homogêneo lentiginoso. (D) Dermatoscopia de melanoma in situ mostrando rede pigmentada atípica, área sem estrutura (seta), área excêntrica hiperpigmentada (mancha) com granularidade (quadrado).

Figura 3.

Melanoma em paciente com xeroderma pigmentoso. (A–B) Melanoma in situ: dermatoscopia mostrando áreas hiperpigmentadas sem estrutura na periferia das lesões e estrias branco‐brilhantes no centro (setas). (C) Melanoma in situ: lesão hipopigmentada sem estrutura mostrando vasos atípicos e pontilhados em área vermelho‐leitosa (retângulo). (D) Melanoma extensivo superficial, Breslow 0,4mm, mostrando estruturas branco‐brilhantes (seta) e vasos pontilhados (retângulo).

Figura 4.

Melanoma in situ em paciente com xeroderma pigmentoso: dermatoscopia mostrando rede atípica (quadrado) e véu azul‐esbranquiçado (círculos).

Figura 5.

Melanoma in situ. (A) Dermatoscopia mostrando rede atípica (quadrado) e área excêntrica hiperpigmentada (mancha; círculo). (B) Melanoma desmoplásico: ulceração (retângulo), hiperceratose (estrela), estrutura romboidal (círculo) e linhas anguladas (triângulo).

Figura 6.

(A) Melanoma na perna direita em paciente do sexo feminino, de 15 anos. (B) Melanoma in situ: dermatoscopia mostrando listras brancas brilhantes (seta) e mancha (estrela).

Durante o rastreamento do paciente XP, lesões com pequenas alterações na dermatoscopia e as novas mostrando padrão atípico sem características de melanoma foram avaliadas sob MCR. As características descritas para melanoma na população geral foram aplicadas. Padrão desarranjado e presença de células nucleadas dendríticas na camada espinhosa‐granular, áreas com papilas sem bordas e derme com malha atípica foram as características mais comuns em lesões malignas nos pacientes (fig. 7). No total, 48 lesões foram avaliadas sob MCR. Dessas, 23 foram excisadas, enquanto as lesões restantes foram mantidas sob vigilância. Entre as lesões excisadas, 16 (69%) eram malignas, incluindo 14 melanomas, um CBC e um CEC. A análise histológica das sete lesões benignas revelou cinco casos de hiperplasia melanocítica intradérmica atípica e dois nevos juncionais displásicos.

Figura 7.

Melanoma in situ no dorso de paciente do sexo masculino, 40 anos. (A) Imagem clínica: lesão pigmentada em pele fotodanificada (seta branca). (B) Dermatoscopia: pontos e glóbulos atípicos (quadrado), salpicados (estrela), área sem estrutura (seta). C, Microscopia confocal de reflectância (MCR); imagem individual (0,5×0,5mm) da camada espinosa‐granular. Padrão desarranjado, presença de células nucleadas dendríticas (seta). (D) Imagem individual de MCR (0,5×0,5mm) da área da junção dermoepidérmica (JDE) mostrando padrão anelar (centro). (E) Imagem individual de MCR na JDE (0,5×0,5mm) na derme mostrando malha atípica e papilas sem bordas. (F) Histopatologia: melanócitos atípicos aninhados crescendo ao longo da JDE com disseminação pagetoide, envolvimento de estruturas anexiais e ausência de invasão dérmica. Essas características microscópicas permitem confirmar o diagnóstico de melanoma in situ (Hematoxilina & eosina, 200×).

Ao longo do período de seguimento de 12 anos, 503 lesões foram excisadas, 197 das quais eram benignas. Dentre essas lesões benignas, 128 eram melanocíticas, enquanto 69 eram não melanocíticas, incluindo ceratose seborreica e ceratose actínica. No presente estudo, o NNE encontrado foi de 2,88. No entanto, quando os pacientes foram avaliados por MCR, observou‐se melhora significante, reduzindo o NNE para 1,64.

Discussão

O XP é doença genética hereditária rara causada por defeito no reparo de DNA induzido por UV (REN ou síntese de translesão).15 Mutações em oito genes diferentes já foram identificadas em pacientes com XP, das quais sete (XPA‐XPG) estão associadas a defeito no REN e uma (XP‐V) que codifica uma DNA pol n defeituosa.16,17 Portanto, a fotoproteção é a única e imperativa medida para evitar o desenvolvimento de queimaduras solares e cânceres de pele.

Os grupos XP‐C, XP‐E e XP‐V são caracterizados por reações normais à queimadura solar. Em pacientes XP‐C, os primeiros sintomas são lentigos fotodistribuídos por volta dos 2 anos. Em virtude da ausência de queimaduras solares exacerbadas, eles geralmente têm diagnóstico mais tardio e, portanto, acumulam mais danos causados pela luz solar, levando a um primeiro câncer de pele mais precoce.18,25 Entre os quatro pacientes XP‐C no presente estudo, o câncer de pele mais precocemente diagnosticado foi aos 4anos.

Pacientes XP‐V tendem a ser diagnosticados muito mais tarde, vivendo duas décadas ou mais sem sintomas. Consequentemente, eles acumulam mais mutações induzidas por radiação UV e podem desenvolver centenas de tumores de pele mais tarde na vida.2 O paciente XP‐V neste estudo desenvolveu seu primeiro carcinoma e melanoma aos 24 e 43 anos de idade, respectivamente. Este é o paciente mais idoso, com 60 anos, que já havia removido cinco melanomas e 93 carcinomas. Esses dados são semelhantes à literatura sobre XP‐V, em que os sintomas ocorrem mais tardiamente e os pacientes têm expectativa de vida maior do que os outros grupos.19

A pele dos pacientes foi caracterizada pela presença de grande número de lentigos solares e poiquilodermia em áreas expostas ao sol. Esse fenótipo adiciona desafios ao diagnóstico precoce de cânceres de pele, mesmo para o dermatologista experiente, seja pela presença de extenso número de lesões com delicada rede pigmentar de lentigos, seja pela telangiectasia decorrente da poiquilodermia, que pode mimetizar os vasos arborescentes descritos no CBC.6

Em relação às lesões melanocíticas, a maioria dos pacientes apresentou lesões lentiginosas e ausência de nevos adquiridos (juncionais, compostos, dérmicos) e congênitos comuns. Esses achados foram semelhantes ao estudo de Malvehy, que descreveu aspectos fenotípicos de dois irmãos com XP.6 Massaki et al. compararam lesões melanocíticas de pacientes com XP e sem XP e mostraram diferenças histológicas: os nevos XP são caracterizados por proliferação lentiginosa de unidades únicas ou pequenos ninhos de melanócitos ao longo da junção dermoepidérmica e frequentemente mostram atenuação das cristas da rede, em contraste com os nevos juncionais vistos na população em geral, que mostram cristas da rede alongadas com pequenos ninhos de melanócitos ao longo das pontas e laterais das cristas da rede.18 Isso explica o padrão de dermatoscopia encontrado no seguimento durante esses anos.

A característica dermatoscópica mais comum observada em melanomas invasivos foi uma rede pigmentar atípica, observada em 90% dos casos. Véu branco‐azulado foi observado em 30% dos casos, e linhas branco‐brilhantes, descritas como associadas ao melanoma invasivo por Lallas et al. e Silva et al., foram observadas em 10% dos melanomas invasivos.26,27 Mais recentemente, Polesie et al. observaram que linhas branco‐brilhantes e estruturas branco‐azuladas atípicas estavam ambas associadas a espessura de Breslow ≥ 1mm.28 Nos achados do presente estudo, diferentemente do relatado na literatura, linhas branco‐brilhantes foram frequentemente observadas em melanoma in situ, enquanto estruturas branco‐azuladas foram associadas apenas a Breslow> 1mm.

A fotografia de corpo inteiro e a DD demonstraram melhorar a vigilância de grupos de alto risco, proporcionando o benefício de não negligenciar melanomas sem características e reduzindo a excisão desnecessária de lesões benignas.5 Além disso, em pacientes com XP, pele danificada pelo sol e alta densidade de lesões pigmentadas de marrom claro a marrom escuro, a dermatoscopia possibilita a discriminação entre a delicada rede pigmentar do lentigo actínico múltiplo e a verdadeira rede pigmentar característica das lesões melanocíticas. O seguimento digital em 3, 6 ou 12 meses já havia se mostrado eficaz para outros grupos de alto risco e, na opinião dos autores, também é eficaz em pacientes com XP. Descrições anteriores sobre o seguimento de pacientes com XP usando DD já foram publicadas, embora todas com pequeno número de pacientes estudados.6–8,13,22

Na tentativa de melhorar a precisão diagnóstica na detecção do câncer de pele, mesmo para lesões de difícil diagnóstico, e para evitar excisões desnecessárias, a MCR foi realizada em associação com a DD. Durante a vigilância de pacientes com XP, lesões com pequenas alterações na dermatoscopia e as novas apresentando padrões atípicos sem características de melanoma foram avaliadas pela MCR. As características descritas para o melanoma na população em geral foram aplicadas.9,10,29

O presente estudo demonstrou melhora no diagnóstico de melanoma em estágios iniciais após a implementação do MCT, DD e MC em pacientes com XP (de 66% para 82% dos melanomas in situ). A associação dessa tecnologia de resolução celular como exame complementar em lesões duvidosas possibilitou o diagnóstico mais precoce do melanoma e evitou excisões desnecessárias. Recentemente, Rocha et al. demonstraram sensibilidade de 85,7% e especificidade de 46,8% para o diagnóstico de melanoma em pacientes com XP utilizando MCR.12 Este resultado valida a necessidade de seguimento próximo e especializado desses pacientes de alto risco por um centro especializado, com o objetivo de reduzir o risco de doença avançada e mortalidade.

O NNE é um método eficaz para medir a precisão na detecção de melanoma e diminuiu significantemente ao longo do tempo em clínicas especializadas dedicadas ao câncer de pele em virtude do uso rotineiro de técnicas de diagnóstico como DD e MCR.20,21 Argenziano et al mostraram, em uma pesquisa multicêntrica de 10 anos, melhora de 12,8 para 6,8 no NNE com o uso de DD na avaliação de lesões melanocíticas.19 Mais recentemente, a MCR demonstrou ser capaz de reduzir o número de lesões a serem excisadas, atingindo números próximos a 3–6.23,24 Apesar dos desafios do seguimento em pacientes com XP, este estudo encontrou um NNE de 2,88, semelhante aos 2,87 publicados por Alarcon et al. usando MCR e dermatoscopia em pacientes gerais e XP.12 Antes da adoção da DD e da MCR, o NNE era 4,02, indicando melhora de 28%.

Pacientes com XP geralmente são submetidos a múltiplas excisões cirúrgicas desde tenra idade, com alta morbidade. O uso combinado de fotografia de corpo inteiro, DD e MCR tem grande potencial para promover o diagnóstico precoce de neoplasias cutâneas e evitar excisões desnecessárias, na tentativa de melhorar o prognóstico e a qualidade de vida dos pacientes com XP.

Suporte financeiro

Nenhum

Contribuição dos autores

Joyce Gouvea Freire: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Tatiana Cristina Moraes Pinto Blumetti: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Rafaela Brito de Paula: Elaboração e redação do manuscrito.

Juliana Casagrande Tavoloni Braga: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Disponibilidade de dados de pesquisa

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

Editor

Sílvio Alencar Marques.

Conflito de interesses

Nenhum.

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Como citar este artigo: Freire JG, Blumetti TC, Paula RB, Braga JC. Xeroderma Pigmentosum: a 12‐year experience in digital dermoscopy and reflectance confocal microscopy follow‐up at a Cancer Center in Brazil. An Bras Dermatol. 2025;100:501182.

Trabalho realizado no AC Camargo Cancer Center, São Paulo, SP, Brasil.

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